Caçada de onças III

Zé Rufino é sempre curioso e quer aprender como se faz as coisas nessas ermas paragens. Então vou contar, como se pega desses bichos em armadilha do mato.

Pouco depois do descobrimento do Brasil, já na época do plantio da cana de açúcar, passando pela mineração e monocultura do café até a Crise de 1.929, entre os anos de 1.700 e 1930, (séculos XXVI e XIX), eram trazidos para cá os escravos africanos, pelos portugueses, para tornar rentável a colônia.

Na busca dos negros, os portugueses também ajudaram na miscigenação, que contribuiu na base de nosso povo.

Podemos imaginar nessa época, quão comum eram os casos de pessoas que perderam a vida na boca dos felinos destas paragens, tanto negros escravos quanto portugueses brancos que não haviam ainda desenvolvido essa convivência, da forma que os índios sabiam e conviviam. E isto ocorre às vezes até mais recentemente, nos rincões deste imenso Brasil.

Lembrei-me até do causo do Zé Arvilino “Masca Páia”, lá das bandas do Tibagí e do Jataizinho, quando no Paraná ainda tinha araucária e peroba. Coisa passada já mais recentemente, que assim foi contada pelo cumpadre do falecido:

Quem? O Masca Páia morreu na boca da onça? Nossa Senhora nos proteja! Como foi qui aconteceu isso cumadre?

Zé Arvilino, vulgo Masca Paia, é aquele tar que a muié mandô ele buscá água na mina, prá morde de fazê café e lavá os pé. A tar mina ficava há umas 100 braças ribancera abaixo da casinha de pau-a-pique. Ele garrô a demorá vortá, garrô contá ela,... que fumus vê o que tava si assucedeno. Bão, num percisô dizê, que só incontraro o pote di barro e a moringa quebrada, sangue por toda vorta, ropas rasgada e os pés dele, ainda dentro das butina, com o dedo de calo prá fora, como ele fazia cortando a bota ainda nova, prá morde de suportá andá. No trechinho de capão de mato até a mina, além dos sinais da onça mardita, num incontraro mais nada apois o resto as onça já tinha cumido o interrado prá comê dispois... a muié ainda comentô, qui os pé ficaro, tarveiz fosse prá morde du tremendo chulé que o falecido tinha, qui prá morde di durmí, nem muriçoca na cama tinha... e ainda completou: “nem as onça aguentaro... i ói que morde delas rejeitá carniça quando ta cum fome a coisa era memo braba... só eu memo prá agüentá tar pinitência, mais agora, Deus ou a onça o véio Arvilino levô, mas pelo menos do mardito chulé Êle mi livrô... coitado do véio!”

Mas voltando ao causo… o fato é, que quando o Zé Rufino, meu companheiro de caçada, perguntou como se fazia uma armadilha para caçar onças, lhe disse que era muito simples.

Bastaria fazer um buraco bem fundo, cobre-se com armação de galhos secos e palhas, coisa tradicional, só que depois se coloca uma crioula que acabou de chegar da lavoura de café, ainda sem banho, amarrada em um pau, que a onça vai sentir cheiro de longe…

Quando a onça chega, os galhos secos cedem e a pintada cai no buraco para ser abatida ou presa em jaula no dia seguinte.

E expliquei também, que, uma vez fizeram isso e só em uma noite, pegaram oito…

“OITO, já imaginou!”, falei pro Zé Rufino.

O Zé Rufino foi logo perguntando curioso e impaciente: Oito Onças????

Ao que respondi: “ Não Zé Rufino… não pegamos oito onças… para nossa surpresa o que pegamos foram OITO PORTUGUESES…” – esquecemos que, para esse tipo de negaceio, ambos tem o mesmo faro e gosto, e ainda bem que não caiu nenhuma onça junto…

MARCO ANTONIO PEREIRA
Enviado por MARCO ANTONIO PEREIRA em 20/02/2010
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