DESCULPA DE UM BÊBEDO

Concluído a empreitada às margens do Velho Chico após ter viajado quinze quilômetros, montando no lombo de peixe, no leito rio, Divino voltou para casa. Morador à margem direita do rio Picão, tinha como vizinho seu sogro. Moravam porta a porta. O sogro tentava conviver com suas patacoadas após suas bebedeiras.

Muito correto e conservador estava sempre apoiando a filha, e de certa forma era tolerante com o vicio do genro, que apesar de tudo era um bom sujeito. Mas vez por outra enterrava a cara na bebida desaparecendo por dois ou três dias. Quando aparecia era socorrido pelos cuidados da esposa, com seus chás e mingaus de fubá, e esculachado com um sermão, o inevitável corretivo do sogro. Baixava a cabeça ouvia calado e por vários meses trabalhava como um touro cuidando do dever para com a família.

Sempre ao voltar de uma aventura dava as mais esfarrapadas desculpas. Certo fim de semana, após receber sua féria apanhou as capangas em casa, dirigiu-se para o armazém no centro do Engenho onde fazia sua feira semanal.

Fez suas compras ajeitou os bens de consumo, separados, um em cada bornal, colocaram todos num saco; apenas um bornal ficou fora, com uma garrafa de gasolina, esta, para molhar sua binga, nome que se dava ao isqueiro. Tudo pronto pediu mais um litro de pinga. O vendeiro muito seu amigo, tentou convencê-lo a desistir da pinga, mas ele afirmou que receberia uma visita de foliões que estavam cantando reis pela vizinhança. E assim teria que agrada-los com um aperitivo. Apanhou suas coisas mais o litro de pinga e pé na estrada. Seis quilômetros até sua casa, que ficava a meio quilometro afastado da margem direita da estrada, sentido Engenho Bom Despacho.

Sua esposa aguardou toda à noite sem pregar o olho e nada do marido. E assim foram dois dias, três dias, quatro dias, nenhuma noticia suas. Foram ao armazém, lá tomaram conhecimento de sua compra. Preocupados voltaram, chegaram juntos a ele a casa; ele, vindo do lado oposto. Aliviada a mulher pergunta... - Homem de Deus por onde você andou? Onde está a compra que fizeste!- Mulher nem te conto! Tudo culpa destas malditas alpercatas, bem que eu não queria essas danadas de pneu, mas seu pai teimou e me fez aceitar! Eu fiz minhas compras na venda do Cicí, quando fui ajeitar a garrafa de gasolina na capanga, ela tombou como estava mal tampada, derramou um pouco em minhas alpercatas, quando sai na rodovia, elas dispararam comigo, nada me segurava, passei o rumo de nossa casa quando acabou a gasolina eu estava entrando à cidade, Bom Despacho... Derramei o resto da gasolina nas maiditas, pensando em voltar, mas esqueci de virar para o lado de cá e comecei a correr em alta velocidade pelas ruas. O povo imaginando que eu estava louco, me meteram no chelindró. Como o delagado estava viajando, fiquei preso quatro dias. De volta hoje, ele mandou me soltar. Ainda passou um sabão no cabo que me prendeu. Diz que não é pra prender empregado dos Marques Gontíjo em hipótese nenhuma. Parece que as danadas das alpercatas deu saudade do tempo que corriam debaixo do caminhão. Passaram-me o maior aperto. - Aperto você vai ver é mais tarde seu cara de pau!

-Vamos pra dentro vou arrumar seu banho, e lave bem os ouvidos! O pai está uma arara, e é pra ele que você contar essa sua aventura; seu desavergonhado...!

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 06/02/2010
Reeditado em 01/06/2014
Código do texto: T2072973
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.