Toca Táime....
Nos idos de 1989, havia naquela cidadezinha um jovem descendente nipônico conhecido como Roberto Toca Táime.
Roberto era um sujeito tímido, baixinho, tinha o aspecto peculiar de possuir uma orelha maior que a outra (a orelha esquerda) e conseguir move-las ao mesmo tempo ou uma de cada vez, causando espanto ao seleto grupo de espectadores e em algumas vezes, medo, se na platéia estivessem presentes crianças muito novas.
A essa altura você leitor deve estar me perguntando: por que Toca Táime?
Deixo para responder a essa pergunta mais adiante, justo pelo fato de que a história nasceu do apelido ou do apelido nasceu a história, de qualquer forma seria como antecipar o final do filme.
O fato é que o Roberto gostava demais de uma mocinha chamada Gisele que somente sabia de sua existência por um simples capricho desses da vida: tinha ele derramado meio copo de refrigerante no colo de sua amada em uma trombada dessas ocasionadas pelas correrias típicas da “hora do recreio”.
Antes de prosseguir, apenas para situarmos nossa prosa destaco, até deveria tê-lo feito antes, que nossas personagens vivem em uma pequena cidade do interior, estudam a sétima série do ensino médio e têm entre 13 e 15 anos.
O fato é que o Roberto era tudo, mas tudo mesmo o que uma adolescente de 13/15 anos não desejaria para seu primeiro namorado: era baixinho, tímido, repetente, tinha bafo e cheirava mal e por isso suas investidas românticas foram inexpressivas e sem resultados, tais como mandar flores, pedir a melhor amiga dele que falasse com a melhor amiga dela que era a melhor amiga da melhor amiga da Gisele que ele era completamente apaixonado por ela, etc.
Depois de resolver tomar banhos diários e escovar os dentes antes de ir às aulas matutinas e ver que, mesmo assim, não conseguiu atingir o coração de sua amada Roberto deu a cartada decisiva.
Imaginava ele que somente com um feito heróico e inigualável conseguiria ele quebrar a barreira gelada que separava seus corações.
Dentro desse novo objetivo, Roberto escolheu suas armas e partiu para a guerra.
Seu armamento era composto por uma guitarra Giannini vermelha “sonic” 1985, um amplificador, sua coleção do Pink Floyd e muita dedicação.
Iniciou as aulas, estudava com afinco, sabia que seu esforço haveria de ser recompensado.
Escolheu entre as suas músicas preferidas aquela cujo solo e harmonia expressaria toda beleza do rock progressivo de sua banda favorita: a música Time do Pink Floyd, cuja pronúncia em português soaria como táime.
Tirou nota por nota do solo de guitarra do David Guilmour, decorou o clássico e executou com perfeição milimétrica a canção que levaria a sua linda Gisele toda harmonia que seu coração carregava por ela.
Faltava agora uma banda, ele sabia que tocando sozinho não teria o mesmo impacto que acompanhado por outros instrumentos e por um vocalista que levasse aos ouvidos de sua amada toda a beleza da canção.
Assim, convidou seus amigos Cachaço, Marreco, João e Kléber para, com eles, executar o seu ato heróico, sair das sombras da timidez e insignificância colegial e atingir o ápice adolescente de possuir sua própria banda de rock and roll.
Porém, para a tristeza do nosso protagonista, a banda só conseguiu se apresentar uma única vez, Gisele não estava na platéia e a música não era Time do Pink Floyd...
Como toda história de carreiras meteóricas com lendas vivas do Rock and Roll a banda acabou muito rápido e Roberto não conseguiu atingir o seu principal objetivo, até hoje não se sabe se a banda durou somente durante as férias de dezembro, o fato é que Gisele nunca presenciou toda evolução e dedicação que o amor sentido por ela propiciou.
Ao nosso amigo Roberto sobrou tristeza e frustração, a carreira musical acabou, ele passou a perambular pela cidade a assistir ensaios de bandas amadoras, e em todos esses ensaios pedia ele, com o coração partido: “ei... toca táime”, como se aquela canção pudesse chegar onde ele desejou com toda alma...
Dizem que até hoje se pode ouvir um velho senhor japonês tocando sua guitarra nos fundos de sua casa naquela pequena cidade, mas em público, ficaram somente seu olhar perdido e as orelhas que balançavam, juntas ou separadas, como a platéia solicitasse....
Se possível... toca táime....
Eder Fabrilo