DORA A MULHER DO JECA
DORA A MULHER DO JECA
A trouxa de roupas sobre a tordilha na cabeça de Dora servia para abrandar o sol que ardia. Pés descalços acostumados aos maltratos da trilha que a levava até o riacho onde lavava os trapos dos pequenos. Os passos eram curtos e firmes. Na boca uma canção antiga que a impelia a prosseguir. O calor escaldante do sol do meio dia não assustava a mulher valente que era. A vegetação cansada caía desfalecida sob os pés grosseiros da mulher, e ela não se deixava abater. Caminhava, e cantarolava.
- Pisa na fulô. Pisa na fulô. Pisa na fulô e não maltrata meu amô.
Os pensamentos da mulher vagavam entre os moleques e Jipa, sua cabrita leiteira. A bichinha amamentou mais as crianças que a própria Dora.
- Tomara que a Jipa viva um tanto! – pensava.
Dora arriscou uma olhadela pro céu e quase cegou:
- Vixe, tá de arder o coro – pensou, fechando os olhos rapidamente.
Jeca nunca ia até o rio. Ela mesma roçava o matagal para manter a trilha.
Aproveitava a lavação das roupas para se banhar e lavar os cabelos. Esse momento tinha um quê de lazer para Dora. À beira do rio as roupas ficavam abertas e ensaboadas ao sol. Esfregava com cuidado uma a uma, e depois as batia na pedra. Sovava com força. Só depois de tudo isso é que a roupa ia quarar. A trouxa grande ia aos poucos minando, e Dora cantarolando cada vez mais alto:
- Pisa na fulô, pisa na fulô...
Depois de quarar cada peça, ela as mergulhava na água fria e esfregava mais um tiquinho. Agora sim elas poderiam ser chacoalhadas e torcidas. Às vezes Dora as deixava secando nas pedras enquanto se banhava.
Primeiro afundava os pés descalços até os joelhos. Para isso erguia a saia e a prendi no cós. Depois soltava os cabelos pretos que pendiam pelas costas e num gesto rápido jogava a cabeça para frente e os cabelos iam junto fazendo um enorme leque sobre sua cabeça. Dora então se curvava e mergulhava toda a cabeça na água corrente.
Assim, Dora permanecia alguns segundos desfrutando desse momento. Depois rodopiava o sabão de pedra pela cabeça ensaboando todo o cabelo. Massageava devagar o couro cabeludo:
- Pisa na fulô, pisa na fulô...
Seu momento de prazer!
Finalmente juntava as roupas num enorme trouxa, se ajeitava e voltava para casa. Os pensamentos voavam longe do sitio e iam pela novela da televisão que viu um dia na casa do delegado quando foi visitar a mulher parida.
Seguia com um leve e honesto sorriso nos lábios. Agora só volta na semana vem pro rio...