Azeda
A doctor fala dos passeios dela e tem me deixado de fora. Eu estou em todos esses lugares e tenho minha história paralela e particular que agora to a fim de comentar...
Sabem o nosso passeio em Búzios? Quem foi que fez a comida, heim? Eu! Quem é que acordava a turma dorminhoca? Eu! Se não fosse eu não haveria fotografia pra PPS, não haveria aventuras...
Mas, olha, gente, Búzios é caro demais! Po, tudo lá vale mais de dez reais! Se você estaciona, são dez reais e tanto; se você pede uma água de côco, dez reais e qualquer coisa... Água mineral? Dez reais e o cacete! Uma dose de cachaça num bar-meio-pousada, sabe quanto custa? 45 reais! Não a garrafa, mas a dose! Cachaça, turma! Aguardente!
Por isso, quando fomos pra lá, a doctor com amigos etc e tal, mais eu e Josualdo, fizemos comida em casa mesmo, que, por sinal era A CASA! Que casa!!! UAU! Um presente perfumado de uma amiga...
Um dia lá comemos camarão na praia, além de casquinha de siri e coisa e tal... A caipirinha era misturada com água e cheia de bagaço e gelo, o que fazia com que a gente tivesse plena sensação de um coito interrompido: assim que começava a ficar bom, acabava drasticamente...
Pior foi quando fomos jantar não sei o quê num complexo gastronômico super elegante. No banheiro havia aquele cartaz idiota que diz: “Sorria. Você está sendo filmado”. Sacanagem ou não, eu fiquei muito puta, pois eu saí do box mijatório com a calça comprida aberta e me deparei com o aviso ao lado do espelho... Daí decidi fazer bolhinhas de cuspe na frente da filmadora..
Não pude passear de barco, pois a secreta da doctor tinha (tinha, porque agora não tem mais) medo de barco. Até porque por 50 paus por pessoa eu prefiro curtir só praia e desvendar os lugares por terra.
Olhem, aquela terra é linda... Continua linda e cada vez mais linda... Que mar, que céu, que ares... Meu Deus, aquilo lá é o paraíso depois que os turistas se vão... Enquanto eles estão na cidade é um inferno. Não há estacionamento, não há limpeza, não há ordem, o caos. Um tumulto, uma muvuca, um horror!
Búzios mudou muito na última década. Está mais feio na área do comércio e na night. A Rua das Pedras já não exalta mais as pedras do chão e está sendo tomada por lojinhas muito feinhas. Um shopping perdeu sua característica de antes e é apenas um shopping merreca, sem o tcham que eu já curti outrora.
Eu não ia a Búzios há mais de dez anos e até me enrolei com o trajeto para os lugares, que antes eram desertos e agora cheios de casas, pousadas, lojas, bares, restaurantes e desmatamento... Pelo menos não senti cheiro de fossa nas ruas, coisa que acontecia quando a península estava super populada, mas vi praias sujas que antes eram muito limpas na areia, na água e ao redor.
Muita coisa bonita na Orla de Bardot, a orla da Armação de Búzios. Que lugar gostoso! Os barcos chegam da mesma forma. Vi os pescadores lindos, que mais pareciam figurantes de uma telenovela, e que são apenas os caiçaras que sobrevivem com a pesca, como acontece desde o descobrimento do Brasil.
A vida do mar misturada ao turismo desenfreado, a perda da identidade de um lugar tão exaltado por Brigitte e tão marcado desde a época do tráfico negreiro, um reduto histórico que precisa ser visto pelo lado da sua natureza. E foi isso que a doctor tentou fazer em seus PPS publicados no final de 2009.
Agora vou contar sobre o momento mais lindo que lá vivi:
Lembram do livro publicado na década de 70, de Richard Bach, chamado Jonathan Livingston Seagull (no Brasil traduzido para Fernão Capelo Gaivota), uma fábula que virou um filme depois, com fundo musical de Neil Diamond (música “Be”)?
Fernão era uma gaivota fadada à exclusão de seu grupo por ter ideais que ultrapassavam o lugar comum. Ele queria voar mais alto, o mais alto possível, enquanto as outras gaivotas achavam que ele estava querendo demais.
Ele ficou até meio paranOoico com tal ideia, até que consegiu o que queria, mas a duras penas. Ele foi além (como eu) e viu lugares que jamais os outros viram antes (como eu), apesar de querer estar junto de sua família e de seus semelhantes (como eu).
Pois é... Eu vi Fernão Capelo Gaivota voando por cima de mim enquanto eu boiava no mar translúcido da praia da Azedinha. Somente barcos de pesca e centenas de gaivotas estavam por perto, e eu dentro do mar...
Eu olhava para o céu e sentia a força da natureza ao sentir o voo rasante das gaivotas, quase que encostando em meu corpo, que flutuava, deixado à mercê da maré. Foi mais ou menos a sensação de receber um bebê pra amamentar.
As gaivotas eram silenciosas e só estavam ali por causa dos barcos que traziam os peixes. Elas estavam acostumadas a seguir o alimento fácil e doado pelos pescadores, não por bondade, mas como uma parte do ciclo da vida e do meio-ambiente comungado na mais perfeita ordem e paz.
De repente ouvi um barulho, que não era de motor de barco, não era piado de gaivota nem nada, mas os pezinhos de Josualdo, meu namorado, que vinha à toda velocidade, numa boinha inflável, uma vez que ele não sabe nadar... O idiota saiu lá da areia e foi me perturbar:
- “Amor, você sabia que estas gaivotas vão cagar na tua cabeça?”.
Eu abri os olhos e levantei a cabeça, respondendo: “E daí? Deixe que elas caguem!”.
- “Menô - ele insistia -, fezes de gaivotas são que nem de pombo: podem passar toxoplasmose...”.
Eu não acreditava no que ouvia... Eu lá, toda enfeitiçada pelo momento idílico, num mundo muito poucas vezes tocado por pessoas, enquanto Josualdo falando de doenças. Não deixei por menos:
- “Eu não vou abrir a boca - te prometo. Vou ficar com a boca fechada enquanto elas cagam, certo?”.
Ele não estava querendo brincadeira. Realmente estava preocupado comigo. Então veio com esta:
- “Você já viu o filme “Os Pássaros”. Sabia que estas gaivotas podem ficar violentas e te matar?...”.
Eu novamente abri um olho, pois o outro insistia em manter o meu momento surreal. Eu disse pra ele que as gaivotas só queriam peixinhos inocentes do mar, e ali, naquele lugar onde eu estava, só existia um peixe-boi e uma orca, a baleia assassina - o que para elas não era atraente...
Josualdo estava saindo do "meu" sério, pois não tinha nada que intervir na minhas experiências marítimo-espirituais. O jeito foi avisar pra ele que as gaivotas estavam se afastando cada vez mais, não por causa dos barcos e dos peixes, mas por causa das águas-vivas que me circundavam...
Josualdo na Urca, pq em Búzios não pude fotografar...
- “Quê?! Água viva! To fora!”, ele gritou. E lá se foi Josualdo se balançando que nem um bote de bêbados, usando as patinhas pra fazer marola...
Voltei a boiar e olhar minhas gaivotas, mas loguinho algo melado caiu na minha testa...
Veja o vídeo abaixo:
http://www.youtube.com/watch?v=mgkk0Hdwmo8
Leila Marinho Lage
17 de janeiro de 2010
http://www.clubedadonameno.com
Fotos da autora do texto.
A doctor fala dos passeios dela e tem me deixado de fora. Eu estou em todos esses lugares e tenho minha história paralela e particular que agora to a fim de comentar...
Sabem o nosso passeio em Búzios? Quem foi que fez a comida, heim? Eu! Quem é que acordava a turma dorminhoca? Eu! Se não fosse eu não haveria fotografia pra PPS, não haveria aventuras...
Mas, olha, gente, Búzios é caro demais! Po, tudo lá vale mais de dez reais! Se você estaciona, são dez reais e tanto; se você pede uma água de côco, dez reais e qualquer coisa... Água mineral? Dez reais e o cacete! Uma dose de cachaça num bar-meio-pousada, sabe quanto custa? 45 reais! Não a garrafa, mas a dose! Cachaça, turma! Aguardente!
Por isso, quando fomos pra lá, a doctor com amigos etc e tal, mais eu e Josualdo, fizemos comida em casa mesmo, que, por sinal era A CASA! Que casa!!! UAU! Um presente perfumado de uma amiga...
Um dia lá comemos camarão na praia, além de casquinha de siri e coisa e tal... A caipirinha era misturada com água e cheia de bagaço e gelo, o que fazia com que a gente tivesse plena sensação de um coito interrompido: assim que começava a ficar bom, acabava drasticamente...
Pior foi quando fomos jantar não sei o quê num complexo gastronômico super elegante. No banheiro havia aquele cartaz idiota que diz: “Sorria. Você está sendo filmado”. Sacanagem ou não, eu fiquei muito puta, pois eu saí do box mijatório com a calça comprida aberta e me deparei com o aviso ao lado do espelho... Daí decidi fazer bolhinhas de cuspe na frente da filmadora..
Não pude passear de barco, pois a secreta da doctor tinha (tinha, porque agora não tem mais) medo de barco. Até porque por 50 paus por pessoa eu prefiro curtir só praia e desvendar os lugares por terra.
Olhem, aquela terra é linda... Continua linda e cada vez mais linda... Que mar, que céu, que ares... Meu Deus, aquilo lá é o paraíso depois que os turistas se vão... Enquanto eles estão na cidade é um inferno. Não há estacionamento, não há limpeza, não há ordem, o caos. Um tumulto, uma muvuca, um horror!
Búzios mudou muito na última década. Está mais feio na área do comércio e na night. A Rua das Pedras já não exalta mais as pedras do chão e está sendo tomada por lojinhas muito feinhas. Um shopping perdeu sua característica de antes e é apenas um shopping merreca, sem o tcham que eu já curti outrora.
Eu não ia a Búzios há mais de dez anos e até me enrolei com o trajeto para os lugares, que antes eram desertos e agora cheios de casas, pousadas, lojas, bares, restaurantes e desmatamento... Pelo menos não senti cheiro de fossa nas ruas, coisa que acontecia quando a península estava super populada, mas vi praias sujas que antes eram muito limpas na areia, na água e ao redor.
Muita coisa bonita na Orla de Bardot, a orla da Armação de Búzios. Que lugar gostoso! Os barcos chegam da mesma forma. Vi os pescadores lindos, que mais pareciam figurantes de uma telenovela, e que são apenas os caiçaras que sobrevivem com a pesca, como acontece desde o descobrimento do Brasil.
A vida do mar misturada ao turismo desenfreado, a perda da identidade de um lugar tão exaltado por Brigitte e tão marcado desde a época do tráfico negreiro, um reduto histórico que precisa ser visto pelo lado da sua natureza. E foi isso que a doctor tentou fazer em seus PPS publicados no final de 2009.
Agora vou contar sobre o momento mais lindo que lá vivi:
Lembram do livro publicado na década de 70, de Richard Bach, chamado Jonathan Livingston Seagull (no Brasil traduzido para Fernão Capelo Gaivota), uma fábula que virou um filme depois, com fundo musical de Neil Diamond (música “Be”)?
Fernão era uma gaivota fadada à exclusão de seu grupo por ter ideais que ultrapassavam o lugar comum. Ele queria voar mais alto, o mais alto possível, enquanto as outras gaivotas achavam que ele estava querendo demais.
Ele ficou até meio paranOoico com tal ideia, até que consegiu o que queria, mas a duras penas. Ele foi além (como eu) e viu lugares que jamais os outros viram antes (como eu), apesar de querer estar junto de sua família e de seus semelhantes (como eu).
Pois é... Eu vi Fernão Capelo Gaivota voando por cima de mim enquanto eu boiava no mar translúcido da praia da Azedinha. Somente barcos de pesca e centenas de gaivotas estavam por perto, e eu dentro do mar...
Eu olhava para o céu e sentia a força da natureza ao sentir o voo rasante das gaivotas, quase que encostando em meu corpo, que flutuava, deixado à mercê da maré. Foi mais ou menos a sensação de receber um bebê pra amamentar.
As gaivotas eram silenciosas e só estavam ali por causa dos barcos que traziam os peixes. Elas estavam acostumadas a seguir o alimento fácil e doado pelos pescadores, não por bondade, mas como uma parte do ciclo da vida e do meio-ambiente comungado na mais perfeita ordem e paz.
De repente ouvi um barulho, que não era de motor de barco, não era piado de gaivota nem nada, mas os pezinhos de Josualdo, meu namorado, que vinha à toda velocidade, numa boinha inflável, uma vez que ele não sabe nadar... O idiota saiu lá da areia e foi me perturbar:
- “Amor, você sabia que estas gaivotas vão cagar na tua cabeça?”.
Eu abri os olhos e levantei a cabeça, respondendo: “E daí? Deixe que elas caguem!”.
- “Menô - ele insistia -, fezes de gaivotas são que nem de pombo: podem passar toxoplasmose...”.
Eu não acreditava no que ouvia... Eu lá, toda enfeitiçada pelo momento idílico, num mundo muito poucas vezes tocado por pessoas, enquanto Josualdo falando de doenças. Não deixei por menos:
- “Eu não vou abrir a boca - te prometo. Vou ficar com a boca fechada enquanto elas cagam, certo?”.
Ele não estava querendo brincadeira. Realmente estava preocupado comigo. Então veio com esta:
- “Você já viu o filme “Os Pássaros”. Sabia que estas gaivotas podem ficar violentas e te matar?...”.
Eu novamente abri um olho, pois o outro insistia em manter o meu momento surreal. Eu disse pra ele que as gaivotas só queriam peixinhos inocentes do mar, e ali, naquele lugar onde eu estava, só existia um peixe-boi e uma orca, a baleia assassina - o que para elas não era atraente...
Josualdo estava saindo do "meu" sério, pois não tinha nada que intervir na minhas experiências marítimo-espirituais. O jeito foi avisar pra ele que as gaivotas estavam se afastando cada vez mais, não por causa dos barcos e dos peixes, mas por causa das águas-vivas que me circundavam...
Josualdo na Urca, pq em Búzios não pude fotografar...
- “Quê?! Água viva! To fora!”, ele gritou. E lá se foi Josualdo se balançando que nem um bote de bêbados, usando as patinhas pra fazer marola...
Voltei a boiar e olhar minhas gaivotas, mas loguinho algo melado caiu na minha testa...
Veja o vídeo abaixo:
http://www.youtube.com/watch?v=mgkk0Hdwmo8
Leila Marinho Lage
17 de janeiro de 2010
http://www.clubedadonameno.com
Fotos da autora do texto.