Desbundando o Excelência - História Verídica

Nosso “herói” sempre foi ingênuo e simplório. Honesto e de uma sinceridade infantil que chega a irritar. Começou como músico num conjunto fuleiro da periferia de Belford Roxo. Mas tocava bem e era muito esforçado, acabou numa banda em programas de tv. De família pobre e precisando de muitas coisas e ganhando só uns trocados, resolveu abandonar a “profissão” e procurar um emprego de verdade. Não foi fácil, pouco instrução, cabeludo e de calça “boca de sino”, nunca era aceito em lugar algum e também não sabia fazer nada. Todos gostavam do jovem bonitão e simpático, mas pra trabalhar ali, caiam na risada. E nosso jovem coitado, já não tinha nem para as passagens, andava muito à pé. Finalmente um ex-namorado de uma tia lhe conseguiu o tal sonhado emprego. Era ridículo o nosso jovem como Fiscal de Supermercado com aquelas roupas diferentes, parecendo que tinha vindo de um baile. A cabeleira já tinha sido cortada, mas dinheiro pra roupa normal só quando viesse pelo menos um adiantamento do salário. Aos poucos foi se enquadrando e não parou mais. Voltou a estudar e foi trocando de emprego. Comprou uma Kombi nova e foi contratado pela Prefeitura para transportar funcionários. Um dia na hora do almoço foi dar uns mergulhos na Praia do Galeão, próxima ao trabalho e teve sua camisa e sapatos furtados enquanto nadava. Mesmo assim não foi pra casa, voltou e se apresentou a Diretora da Repartição, descalço e sem camisa. Ela dependia muito dos seus serviços, não o dispensou e lhe deu a incumbência de mais uma entrega em outra Repartição próximo dali e dai então ele estaria dispensado, poderia ir embora pra casa. E lá foi ele, cuca fresca e sempre bem humorado. Na região praiana da Ilha do Governador, onde trabalhava, ninguém estranhou ele dirigindo sem camisa. Chegando ao posto do MEC cumpriu a tarefa e foi informado que o Coordenador-Geral do MEC estava presente fazendo uma inspeção e dependia de ser levado de volta ao centro da cidade, pois o carro que o trouxera estava enguiçado e ele não podia esperar por outro, pois tinha uma reunião urgente com altas autoridades. Nessa época, o local tinha pouquíssimo transporte e não havia radio-taxi. Nosso jovem explicou sua situação, mas foi praticamente obrigado a aceitar a tarefa extra. Sentou-se ao volante e recebeu o ilustre passageiro acompanhado do seu motorista. O sujeito era mal encarado e arrogante, entrou no carro e nem cumprimentou, fez pouco do assento e fez uma pergunta agressiva ao nosso pobre herói:

_ O senhor esta sem camisa ? .

_ E sem sapato. Respondeu o jovem.

_ Isto é um absurdo.

_ Mas não estou ligando não, eram velhos.

_ O senhor sabe quem sou eu?

_ Sei.

_ O senhor sabe que um telefonema meu, o senhor tá no olho da rua?

_ Isso é impossível.

_ O senhor não tem medo de perder o emprego?

_ Não.

_ E se o senhor for demitido, vai fazer o que?

_ Estou trabalhando apenas pra não deixar o pessoal “na mão” enquanto não chega um substituto. Eu me demiti tem mais de um mês.

_ Já vi que o senhor é metido a engraçado, trabalha por brincadeira. Respondeu com ironia.

_ Só se eu fosse moleque e o senhor esta tendo uma prova do contrário. Tive a camisa furtada, mesmo assim continuei trabalhando e estou tentando lhe servir. Estou lhe dando uma carona, sei que o senhor é muito importante, mas não tenho obrigação de lhe transportar, não é minha função, e eu já “larguei” por hoje. O senhor me tratando mal, eu não tenho que aturar suas grosserias, este carro é meu. Mais uma abobrinha eu paro e lhe boto pra fora.

_ Cuidado, você não pode falar assim. Exclamou o motorista dele.

_ Isso é um abuso, um absurdo, o senhor é louco. Completou o Excelência.

Bem, aí o nosso jovem não aguentou mais a pressão, encostou a Kombi e desceu pegando um pedaço de cano que usava pra trocar pneu. Abriu a porta e dando uma porrada com o cano no assoalho do carro, foi breve:

_"Desce os dois senão o pau vai cumê". E esse foi o último dia de trabalho para a Prefeitura. No dia seguinte foi só para agradecimentos e despedida dos bons colegas e procurar em segredo o advogado que tratava da herança recebida de 32 imóveis e alguns negócios deixados pela madrinha falecida.-

Alberto Santos
Enviado por Alberto Santos em 01/01/2010
Reeditado em 16/05/2011
Código do texto: T2005502
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