O Andarilho

Quem me contou este causo jurou de pés juntos que ele realmente aconteceu, numa de suas viagens por este mundo de Deus. Confesso que, a princípio, coloquei em dúvida a minha inteligência, mas com tanta insistência preferi acreditar a perder o amigo. Como ele me pediu para não divulgar o seu verdadeiro nome, usaremos um nome fantasia, mas que a vontade era outra, lá isso era...
Paulo César sempre foi um sujeito alegre, cheio de histórias e, para qualquer assunto, lá vinha ele com algum acontecimento em que fora um dos personagens. Estávamos lá pelas bandas do PTC, apreciando a garotada numa descontraída partida de tênis, quando ele me veio com essa:
– Cara! Você não imagina o sufoco que eu passei a semana passada, quando me aproximava de Borborema. Pensei que ia me dar um colapso.
Com essa introdução cheia de suspense, lá veio Paulo César:
– Eu vinha tranquilo, retornando de Araraquara e, para fugir do pedágio, que é uma fortuna, mudei o trajeto, pegando outra estrada. Era curva atrás de curva e, numa delas, eu cruzei com um andarilho que caminhava pelo acostamento, no sentido contrário e ele, na maior cara dura, me pediu carona. Achei aquilo uma tremenda duma gozação: onde já se viu um andarilho pedir carona e ainda por cima, para o sentido contrário em que eu ia?
É claro que o Paulo César, ótimo contador de histórias, procurava a cada palavra me convencer de que tudo que contava era a mais “pura” verdade.
– E você? Parou para dar a corona? – perguntei, zombeteiro.
– Rapaz, você está pensando que é brincadeira? Escute só o desfecho desse meu pesadelo.
Quando eu entrava num posto de gasolina, perto de Borborema, isso depois de andar uns cinquenta quilômetros depois de cruzar com o andarilho, tive outra surpresa: sabe quem estava na entrada do posto?
– Quem? – perguntei, curioso.
– O andarilho! Juro pelo que há de mais sagrado que era o mesmo sujeito, porque o saco que ele carregava nas costas era de plástico e tinha uma faixa vermelha, inconfundível. E o pior de tudo é que me pediu carona novamente e, outra vez, para o sentido contrário.
Fiquei na minha, dei corda e deixei que ele prosseguisse na sua mirabolante história.
– E daí, o que é que você fez? – perguntei, debochando.
– Não fiz nada. Nem entrei no posto, prossegui viagem e, com o tempo, fui esquecendo aquela miragem, mas uma hora depois desse incidente, quando chegava ao trevo de Cafelândia, lá estava ele novamente, me pedindo carona para o sentido contrário.
Paulo César contava com tanta veracidade aquela história que eu quase acreditava. E ele prosseguia narrando como se estivesse acontecendo.
– Como cautela e caldo de galinha não fazem mal para ninguém, procurei me afastar daquela miragem o mais depressa possível. Seria alguma mensagem do além? – perguntou.
– Tudo não passou de imaginação sua – respondi.
– Acontece que eu parei no posto de Guarantã e o frentista, após ouvir minha história, disse que o andarilho também se transformava numa loira, alta, bonita, e que muita gente havia se estrepado, pois não passava de alma penada que atormentava a vida dos motoristas nas estradas.
– E você, certamente, não acreditou. Não é verdade?
– A princípio, não, mas quando saía do posto e vi aquele louraço pedindo carona, quase desmaiei. Fugi dali que nem diabo foge da cruz!
Escritor Paulista
Enviado por Escritor Paulista em 27/11/2009
Reeditado em 30/11/2009
Código do texto: T1947332