VENTO SUL
Conta-se que, quando o vento sul anuncia-se por aqui,é hora de recolher as roupas do varal.
Colocar as crianças para dentro de casa e cuidar do que está pra fora para que não suma.
Pois bem, há muitos ventos atrás,morava num bairro rural daqui do litoral uma família de pescadores.
O patriarca, seu Pedro,como de costume,arrumou suas tralhas de pesca e partiu para o mar,deixando a Maricota em
casa,as crianças já estavam na cidade, na escola.
Sentia ele, pelas nuvens que o tempo estava revirando no céu.
Mesmo assim,decidiu sair ao mar.E junto com sua batera (tipo de embarcação,comum nesse litoral),atravessava
as ondas.Olhava para as nuvens sem parar,notando que mudavam a cada minuto.Resolveu então chegar até a ilha mais
próxima,a Ilha do Bom Abrigo e como diz o nome um lugar perfeito para embarcações em dias de tempestades.Ajeitou-se como pôde no
pequeno casebre da ilha e aguardou.Casebre esse ,construído em meio a pedras para assegurar-se de que não iria pelos ares com o tal vento sul.
Pedro então lembrou-se da pobre Maricota sua mulherzinha, pequenina e muito magra e que morria de medo de vento e chuva e estava só em casa.Rezou e pediu proteção.
O vento anunciava-se majestoso e o dia virou noite num piscar de olhos.E Pedro ali permaneceu calado,observando o vento lá fora.
Maricota em casa,resolveu correr até a vizinha mais próxima antes da ventania.
Adepta de uma religião a qual as mulheres só podem usar saias,era crente fervorosa.E asim com sua saia longa e seus cabelos em trança,atravessou a matinha da ilha em busca de consolo e companhia.
Passado alguns minutos,cerca de vinte ou trinta,o sol voltou.Pedro arrumou tudo e partiu de volta
para sua ilha.
No caminho ,quebrando as ondas pensava em sua Maricota,pois as crianças estavam bem guardadas na cidade e lá o vento não era tão severo,como nas ilhas.
Aportou sua embarcação na praia e correu pelo trecho da matinha em busca da Maricota.Chegando em casa,viu que estava tudo fechadinho,e gritou por ela.
Nada.
Maricota não respondia.Empurrou a porta que com mínimo esforço abriu-se.
Vagou pelos cômodos,procurou e procurou.
Foi ao quintal,caçou aqui e ali.Revirou possíveis esconderijos e não a encontrou.Então lembrou-se dos vizinhos.
Em disparada,correu até lá.
Já na beira da porta avistou seu Justino o vizinho que vinha a seu encontro.Indagando sobre Maricota,Justino negou que havia estado ali.
Pedro então sentiu o sangue esvair-se.Onde estaria Maricota?
Seguiu então para casa ,resolveu aguardar por lá.Quem sabe ela não voltasse.
Sentou-se na varanda e ficou.
As crianças chegaram da escola e comentaram que até na cidade o vendaval tinha sido feio.
Perguntaram sobre a mãe e ante a negativa do pai,puseram-se a percorrer a matinha.Voltaram desolados,pois a noite já chegava e nada de Maricota.
Passaram-se dois dias sem notícias da pobre.Na manhã do terceiro dia,Pedro tecia umas redes quando notou que,alguém vinha pela estradinha .Firmou os olhos e viu que se tratava de sua Maricota e mais dois homens fardados.
Correu até eles gritandoe indagando onde Maricota havia estado.
O soldado então respondeu que haviam encontrado a Maricota presa a uns galhos em uma árvore a alguns quilômetros dali.
Pedro,estupefato questionava como isso teria acontecido. A coitada da Maricota respondeu que não sabia dizer direito o que ocorreu. Apenas mencionou que, quando procurava companhia por medo da tempestade, sentiu o vento sul a resfriar suas pernas e a inflar sua saia. Disse ainda que, por alguns instantes, sonhou sobrevoar a ilha, tendo as suas saias por asas.
Texto inspirado em causo de pescador,contado pelo seu Pedro,também pescador,pai da Marcinha,minha grande amiga...