É NEIN?

È NEIN???

Paloma desistira desde o início desta maratona louca. Não estudava. Simplesmente gostava de “ficar”. Era mais simples, não tinha trabalho sequer de saber o nome do sujeito. E o verbo, dar, passou a ser conjugado no sentido amplo da palavra.

Enquanto sua mãe afundava-se na vistoria das obras, observando cada detalhe dos prédios em construção, a filha descobria o prazer de ser adolescente. Fazia algum tempo que ficava com o Ge, ele era maluco por surf, mas gostava de variar. Paloma vivia sempre nas nuvens. Acordava sempre meio deprê após o meio-dia. Tinha fotofobia e só conseguia ficar legal depois que falava com Ge e combinavam o que ia ser para aquela tarde. Podia rolar de tudo, ela gostava de se sair bem nas paradas que experimentava.

A governanta há muito tinha advertido a mãe de Paloma, quanto às saídas, os amigos estranhos que ela trazia para casa. A mãe sempre ocupada em ganhar e juntar dinheiro economizava, em tudo, desde o ferro, a areia, e o cimento. Comprando sempre material de menor valor, e contratando a empreiteira que fizesse o serviço rápido para ter uma fatura magra. O lucro seria maior. A desculpa que usava para anestesiar sua consciência, se é que ainda restava alguma, era que os prédios construídos, e todos os apartamentos vendidos seria a garantia de que o futuro de Paloma não precisaria ser de tanto trabalho.

Coisa bizarra, o mundo vai acabar em 2012. Não vou mais estudar. Vou viver a vida. Do jeito que eu tenho feito. Não era muito diferente de suas amiguinhas que freqüentavam as mesmas baladas e de vez em quando subiam o morros do Macaco e iam até outros lugares badalados.

O Ge, gato bom, muito irado, tava dando um trabalhão, e saindo muito caro. Ela sabia a combinação do cofre que tinha no quarto de sua mãe e só baixava lá quando tava sem nenhum...

Aconteceu numa tarde. Paloma disse para a governanta que o ar condicionado de seu quarto estava quebrado e que iria ficar com Ge no quarto da mãe. A governanta continuou andando pela casa, sem saber se avisava ou não a patroa. Ficou feito barata tonta. Paloma saiu com Ge, antes do escurecer. Ela foi até o quarto da patroa e viu tudo direitinho.

A patroa chegou e depois de alguns minutos gritou assustada: - O que houve aqui?

A governanta correu para o quarto. A patroa dizia:- Não pode ser! Levaram tudo, minhas jóias, documentos, tudo o que eu tinha de valor em casa. Como pode ter acontecido isto?

Correu para o quarto da filha na busca de consolo e não a encontrou, Olhou desconfiada para a governanta. E foi logo apontando o dedo e gritando, - Fala, fala logo. A governanta nada disse, começou a chorar. A patroa enfurecida já partia para cima dela, quando a porta da sala foi aberta e Paloma entrou cambaleante.

A mãe correu para ela a fim de contar-lhe sua descoberta, não teve tempo. Paloma caiu no meio da sala. A governanta ajudou a pobre mãe a colocá-la no sofá. Depois do medico chegar e a mente da mãe entender alguns fatos que a cercavam ela se aproximou da filha deitada no sofá e dizia chorando baixinho:

- É nein, não tive tempo para você. E nem que pudesse voltar atrás o tempo, não tinha outra opção.

Daqui a alguns dias serão aplicadas as provas do ENEM. Paloma está se recuperando

E nem, se sabe quando voltará a entrar em uma sala de aula. Pobre mãe da Paloma que vive chorando pelos cantos. E a governanta fala para a cozinheira, repetindo as palavras da patroa: - È Nein, dar é a única alternativa para os que vivem se sentindo abandonados, Paloma deu tudo de si e da mãe também. Gê nunca mais apareceu. Também bandido morto não fala. E o remorso e a culpa se vestiram de carrasco e perseguem a consciência da pobre mãe, que na ânsia de angariar fundos para o futuro da filha, empurrou-a para o abismo do vício, ao deixá-la adolescente, carente, dependente, sem nenhuma atenção. Como se o afeto pudesse ser trocado por dinheiro, que ela tudo o que ela sabia fazer. Ganhar, acumular, enriquecer. Pagando baixos salários, demitindo, cortando a verba.

´Muitos pais e mães, ficam no meio do caminho, quanto se trata de manter as pontes que os guiarão até o mundo de seus filhos. Deixando-os órfãos na adolescência, quando mais precisam de carinho, atenção, amor, respeito, amizade, compreensão e muitas vezes humildade, em descobrir que não está no caminho certo e tentar encontrar o caminho de volta, muitas vezes levando a luz nos pedaços escuros e cheio de emboscadas nas difíceis vias da adolescência. Como na vida de Paloma que vivia um tremendo “apagão”.

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 26/11/2009
Código do texto: T1944646
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