NÉLIO DA FILOMENA

Nélio estava no curral curando a burrada de ano e meio, quando o Tonhão Cigano lá da fazenda do Trajano Moreira entregou para ele um bilhetinho muito dos mal criados. Naquele pedaço de papel amarelado pelo tempo estava escrito mais ou menos assim: aqui tem um burro ligeiro acostumado a derrubar nego macho no cutiano, estamos perdendo nosso tempo com você mas se quiser desmentir nosso descredito vamos deixar o burro fechado no curral no domingo que vem. Aqui é o Neca da Dorva, diz prá Tia Filomena que eu tô pedindo abenção. -Se o burrão deixar alguma coisa inteira nois vamos mandar tudo de volta em um bisaco!

Nélio leu o bilhete; curando a burrada estava, curando a burrada continuou. No arremate do serviço, foi direto para a dispensa das tralhas, olhou bem o estado do seu lombilho, cortou correias novas para os seus látegos e contra látegos ( ou na linguagem lideira; lático e contra lático) trocou as duas barrigueiras. Botou mexicanas novas em seu par de sete bicos.

Dalí foi prá cozinha se entender com a Filomena sua mãe.

- Mãe, sábado de noite eu preciso que a senhora faça uma lata de farofa de carne sêca, que tenho que ir lá na fazenda do Trajano Moreira ter uma prosa com o Neca da tia Dorva. Filomena não era de negar as poucas coisas que seu filho Nélio lhe pedia. O dia já começava escurecer e o bom filho sabia que estava ficando pouca algumas coisinhas na despensa. Pediu a lista prá sua mãe, arreou a mula e foi buscar a encomenda lá na venda do João da Gonça.

Até que Nélio gostava de uma boa prosa misturada com uma ou duas doses de cachaça. O que lhe faltava era tempo para isto. Então lá na venda do Nélio só teve tempo prá chegar, amarrar a mula no pau da cerca, fazer a compra e voltar de galope, entregar a compra para mãe e dormir um sono pesado.

De resto aquela semana foi um tal de dormir cedo, acordar de madrugada, até o Domingo da montaria. Chegado o dia em que Nélio iria medir forças com aquele burro que já estava pegando uma certa fama.

Naquele Domingo quando Nélio acordou Filomena já estava com a farofa pronta, aí foi só meter o lombilho em sua mansa mula, montar e ir ao encontro do seu destino. Na verdade todo mundo já sabia quem seria o vitorioso naquela briga.

Não deu outra, Nélio tirou a bufa do burrão.

Verdade verdade mesmo aquilo havia sido uma coisa arranjada pelo Neca da Dorva, porque por alí todo mundo já estava como muita saudade do primo Nélio.