Alface conhece Phósforo

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O encontro de Alface com Pablo não ocorreu , como convém aos rebeldes dentro de um contexto , por assim dizer , de normalidade . Os dois estavam no átrio da escola – na parte de fora – para variar suspensos e só esperando cumprir o expediente, aguardando pacientemente o passar das horas para chegar em casa e, por óbvio , não contar nada aos pais que, inocentemente, pensavam que os bons moços freqüentavam a sala de aula.

Pablo, tanto quanto Alface , primava por chamar a atenção , mas ao contrário de seu parceiro da “cara redonda” e da pele minada pelas sardas e “espinhas” , Pablo ostentava um corpo magro – esguio – e um corte de cabelo no estilo “zero” numa época em que a moda era a utilização dos cabelos longos, na melhor inspiração dos Beatles . Além disso, ele utilizava as calças retas e apertadas à altura do tornozelo, contrariando a onda das “bocas de sino” .

Os dois rebeldes se juntaram dentro daquela máxima de que “Deus cria – o diabo espalha , e eles por si só se encontram” ; e Alface utilizando toda a força de sua irreverência deliberou de pronto que havia a necessidade urgente de fazer algumas alterações na personalidade pública de Pablo e, quase instintivamente , gestou uma nova designação para o parceiro : - ele passaria a ser conhecido como “Fósforo”, pois seu estilo de vestir e sua complexidade física lembravam a figura de um palito de fósforo.

Pablo, a verdade é essa , gostou muito da idéia , mas ponderou a Alface que para dar um significado mais nobre e sofisticado , deveriam grafar o nome no muro da escola com grafite vermelho e da seguinte forma : - “Phósforo” , e foi assim que eles formaram a dupla “Alface e Fósforo” ...

Logo encontraram um aluno que era notável em rabiscar caricaturas e trataram de comprar camisetas brancas – das mais baratas da Hering – e pintaram-nas com seus respectivos apelidos . Alface e Phósforo passaram a andar dia e noite juntos , sendo que durante o dia vagavam pela área que lhes era mais familiar - o perímetro da escola - e à noite eram o centro das atenções nos bares e nas “discotecas” , onde ambos sempre estavam envolvidos com a sonorização dos eventos.

Phósforo havia desmanchado um velho móvel chamado “eletrola” – que se tratava de uma “relíquia” de sua mãe - e desmontado o toca-discos para confeccionar um “prato” e ligá-lo a um amplificador “Gradiente”, tudo acoplado a um “gravador” marca “Aiko” que Alface havia ganho de presente de seus pais , mais duas caixas de som montadas em madeira reciclada , confeccionadas pela dupla.

Feito o serviço, fecharam o móvel e colocaram um vaso de flores , não sem antes cortar o fio que ligava o aparelho à tomada da luz . De posse do “miolo” da eletrola e dos demais equipamentos improvisados , eles se intitularam “empresários” de sonorização e então cobravam pequenas taxas para animar as festas de fim de semana e até mesmo os aniversários dos colegas , que pagavam com muito prazer, pois acima de tudo eles emprestavam alegria e irreverência aos eventos.

Dizem que o negócio foi tão bem sucedido que logo foi possível comprar novos equipamentos e incrementar os negócios , deixando a dupla numa felicidade imensa . Os dois eram só sorrisos , porém um dia caminhavam juntos em direção ao saguão da escola e chamou a atenção que estavam muito sérios , ostentando o Phósforo uma ferida vermelha à altura da testa . . .

Quando se aproximaram ao aglomerado de estudantes , alguém da turma perguntou : - “Ora o que houve na sua testa Phósforo” ? , ao que ele respondeu – “ Não foi nada de mais , é que minha mãe inventou de mandar consertar o fio da eletrola e ao tentar colocar um Long Play do Julio Iglesias ficou meio nervosa ao ver que estava tudo oco e como ela estava com a vassoura . . . ”