A Onça do Lombo Preto

Uma boa prosa num boteco é sempre louvável e quando é acompanhada de pessoas alegres, ela fica ainda mais arrumada.

Domingo pela manhã, os produtores rurais das comunidades que ficam nas proximidades da pacata Lelivéldia, no Vale do Jequitinhonha, chegam com suas mercadorias, até à feirinha e ali é feita a venda e às vezes até a troca de mantimentos.

Carne, farinha, requeijão, queijo, frutas e outros são expostos para que todos possam comprar.

Em frente à Feira, o boteco do Salim.

Um comerciante alegre, que atende sempre com rapidez e gosta muito de contar causos e a prosa dele vai costurando o dia e as doses de cachaça e a cerveja vão sendo consumidas.

Um chega daqui...outro chega dali...

Um chega e oferece uma coisa...

Outro chega com um assunto e assim vai passando o dia.

O Salim é assim:

Já passou por situações adversas ou não e sempre tem uma estória pra contar.

Chega o Calixto e pede uma cachaça:

- Ô Salim! Bota uma cachaça pra mim! Hoje eu vô tomar umas pra mode vê se isfria! Num chove mesmo!

Os que estavam presentes riram!

O Salim rapidamente o serviu e os assuntos foram se desenrolando, e de repente chega um Oficial da Justiça com algumas intimações que decerto eram de moradores das comunidades ou mesmo de Lelivéldia.

Como o Salim conhece a todos da região é sempre procurado para dar informações.

Ele chega:

- Bom dia!

E todos!

- Bom dia!

E o Salim logo o apresentou aos presentes:

- Este é o Oficial de justiça da região!

Nisso eu o indaguei:

- Deve ser muito trabalhoso pra você encontrar pessoas pelas comunidades já que são dispersas!

E ele:

- É sim! Tenho muitas dificuldades! Por isso venho até ao Salim, pois, conhece a todos!

O Salim dá aquele sorriso de satisfação.

E eu prossegui:

- Deve ter até onça por estas redondezas, hein?

E o Salim interrompe:

- Moço, moço! Tem e não é pouca! Óia! certa vez ,fui buscá a criação no campo e já era tardinha. Eu já tinha feito as ôtras coisa e pricisava arreuni o gado. Cheguei numa mata fechada e ouvi um rosnado deferente. Aí moço, eu nunca tinha iscuitado aquilo ,fiquei discunfiado e os meu cachorro cumeçô lati, mais, curria era pra cima de mim e ficava entre as minhas perna. Tava tudo cum medo! Eu pensei: que diacho é isso gente! Fui adentrano na mata e logo dei de cara com a danada. Era uma onça do lombo preto, enorme de grande! Óia me deu vontade de inté de corrê, pois, inté os cachorro correu e eu que era fracote? A marvada andava na minha frente pra lá, andava pra cá e me oiava cum aqueles zóio vremêio feitio fogo e eu pensei tô frito! E os cachorro já tava lá na fazenda de medo.

Eu carregava uma porveira que o meu pai me deu pra mode ispantá lobo e ela tava carregada inté na tampa.

O salim dava uma pausa e tomava uma cachacinha!

E prosseguiu:

- Tirei ela da cacunda, mirei na bicha e rastei o burraio!

Mais do que depressa o perguntei:

E ela morreu salim?

Ele foi incisivo:

- Nun morreu!

E eu continuei:

- Por quê?

E ele categoricamente me respondeu:

- A espingarda, tava carregada era de sal grosso!

E eu quis saber o porquê:

- Ora sal grosso!

E ele continuou:

-A carga era para atirá nas bunda das éguas pra mode andar dipressa! Êta bichinhas pirracenta!

E eu fui além:

- E a onça não te atacou?

E ele:

- Não! Ela saiu de mansinho...mansinho e foi-se embora! Acho qui batizei a fera! Os cachorro iscutô o tiro e vortô e inté ficou perto dela!

É assim nas andanças! Os causos vão desenhando as prosas e a gente segue trilhos e nos caminhos fazemos a história!

Êta salim danado!

A onça do lombo preto!

Pedi mais uma cachaça e fui embora!

Inté...

Mestre Tinga das Gerais
Enviado por Mestre Tinga das Gerais em 24/10/2009
Reeditado em 14/02/2021
Código do texto: T1884255
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