O MILAGRE DO FANTASMA

O MILAGRE DO FANTASMA

Irmãos de criação amavam-se por demais, como se tivessem o mesmo sangue. Ele, filho do padrasto de Sonia, ela, filha de sua madrastra. Por ocasião do casamento dos pais, ambos, estavam com menos de um ano de idade. Os pais nunca esconderam aquela situação. Sempre juntos. Sabiam que não eram irmãos. Comemoravam na mesma data o aniversário sendo ele, poucos dias mais velho que ela. Ao matricular na escola os pais fizeram questão em colocá-los na mesma sala, afimando que ele como filho, homem, iria protegê-la. Ledo engano, em pouco tempo percebeu-se ocorria justamente ao contrário.

Os objetos, que costumeiramente ele roubava dos colegas, ela o convencia a devolvê-los. Ameaçando levar ao conhecimento dos pais. Ele prometia que aquele seria o ultimo, mas logo aprontava de novo. E novamente, outro bate boca. Sônia o convencia a devolvê-lo. E o pior teria que ser ela, a colocá-lo em seu lugar sem que ninguém percebesse. O que ela não sabia é havia uma doença de nome cleptomania, e ele era portador da mesma.

Foram crescendo sempre juntos e em cada fase da vida maior era afinidade entre eles. Ela tentando de todas as formas, convencê-lo, a não cometer aqueles delitos. Certa vez ao ler um recorte de jornal ela descobriu que o que ocorria com o irmão Jorge, era um distúrbio mental que se manifesta no ser humano de diversas formas. Sendo no caso dele, os pequenos furtos.

Decorrido certo tempo ela já convencida de sua cura, convidou-o a visitaram juntos seu tio, fazendeiro abastado, criador de ovelhas. Ao regressarem da visita, ele empolgando com a beleza do plantel do tio, queria porque queria roubar um cordeirinho. Ela preocupada propôs comprá-lo, mas aquilo não! Jamais iria satisfazê-lo. Após muito relutar ela concordou com ele, impondo uma condição no dia seguinte, ele voltaria e pagaria pelo burrego roubado.

Era noite de luar o céu coberto por densas nuvens e uma garoa fina e continua caia sem muita intensidade. Havia nas proximidades um cruzeiro, muito comum nas grandes fazendas, perto uma gameleira, com a fama de ser assombrada. No patamar da encosta um pequeno núcleo de casebres perto de meia duzia. Ali funcionava também um pequeno boteco comercializando pinga, fumo, querosene, e outros bens de primeira necessidade. A estrada ao longo da encosta dava acesso a diversas fazendas a margem do rio que banhava a região.

Enquanto Jorge tentava realizar seu desejo Sonia permanecia de pé ao pé do cruzeiro aguardando o irmão. Alta e esbelta, por sinal uma bela figura. Com uma toalha branca sobre a cabeça se protegendo da chuva, dava-se a impressão de ser ainda mais alta.

Passando pelo local o primeiro transeunte rumo à venda, deu logo a noticia, havia uma assombração no cruzeiro da fazenda próximo a gameleira. Passou um segundo, um terceiro e a mesma noticiam. No final a mulher era tão alta, já ultrapassando a gameleira. O pânico tomou de assalto a todos, que nesta altura já não sabiam como voltar. Jorge estava La, corre aqui corre ali e nada de cordeiro. Vizinho do vendeiro, um aleijadinho que nascera com as pernas pregadas por uma membrana, não saia do seu comercio, vivia lá metendo a colher pau em tudo que era assunto. Embora deficiente ninguém o suportava. Desde o primeiro que chegou levando a notícia do fantasma ele não calou um segundo, dizendo que eram todos uns medrosos se não fosse deficiente iria requerer o fantasma.

Sentado sobre o balcão enrolando um pito de palha, um mulato forte que viera do lado oposto ao fantasma, observava a garganta do aleijadinho olhando abaixo da aba do chapéu. E ele arrotando bagaço, afimando sentir não ter alguém por ali capaz levá-lo nas nas costas, pra desvendar o miistério da assombração.

De repente o mulato deu umas duas ou três baforadas no seu pito, e exclamou:- pois olha seu pirralho eu sou muito macho! Levar-te-ei agora!

Dobrou o moleque nas costas e se mandou. Chegando ao local, a moça que estava posicionada no alto a espera do irmão, inclinando o corpo perguntou

- Está bem gordinho? O mulato muito decidido respondeu: - não sei se ta gordo, nem se ta magro! Toma conta disso aí! Atirou o aleijadinho a seus pés, e se mandou! Entrou numa porta do boteco, o aleijadinho entrou na outra! O mulato assustado perguntou: Como que tu vieste seu pirralho? – Sei não! Sei só que tô curadim... Curadim!

O fantasma curou o pentêlho. Na hora do aperto ele rasgou as membranas que obstruía as pernas e correu mais que o mulato.

Quanto ao casal não sei dizer nada, me esqueci de perguntar ao meu avô. Agora terá que ficar por aqui, pois ele faleceu em 1980.

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 19/10/2009
Reeditado em 27/12/2009
Código do texto: T1875631
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