A sorte vem a cavalo

A casa era distante, mas o compadre tinha lhe pedido para que lá fosse ter com ele. No caminho pensava com seus botões que o Manoel, seu compadre, era um cara de sorte. Em tudo que botava a mão dava certo. Nas plantações, com os animais, quando ia caçar sempre abatia algum animal e nas festas, então, a moça mais bonita ia dançar com ele, isso era certo. O sortudo teve que ir um dia à cidade e lá foi convencido a jogar numa tal de loteria esportiva, acho que nem existe mais, passado uns dez dias, chega um rapazote da casa lotérica no sítio para avisar ao compadre ir receber o seu dinheiro, não tinha sido o prêmio máximo, mas era uma boa bolada. Isso é que era ter nascido pra lua!

De outra vez, foi à feira comprar mantimentos, para o mês, chegando lá, encontrou amigos que de muito não os via. Entusiasmado embalou na conversa e dali para a bebedeira. A prosa estava mesmo boa, um pouco de alegria a mais não faria mal a ninguém. Já no adiantado da hora, os ânimos exaltados, uma discussão acalorada iniciou-se, tudo por causa de uma bobeira. Maximiniano, filho de Juca da farinha, falador por demais, que mangava de todo mundo, foi meter-se com Manoel, que não soube agüentar a brincadeira, também pudera, Maximiniano disse em alto e bom som que se Manoel era realmente de sorte então por que não tinha conquistado uma mulher mais bonita. Isso para todos os presentes ouvirem. A esposa de Manoel realmente não era bonita, isso era verdade, tinha lá alguns traços que chamavam à atenção até dos menos despercebidos. Os amigos sabiam que o compadre era brincalhão, mas não aceitava que falassem assim de sua mulher. Por várias vezes saiu calado de alguma reunião quando notava que a conversa descambaria para esse fato. Só que naquele dia, alcoolizado, bem alcoolizado, Manoel não saiu da roda, pelo contrário, partiu para cima de Maximiniano e o furou com sua peixeira, deixando o falador sem vida ao chão. Foi uma tragédia.

A alegria transformou-se em tristeza, dor e vingança, isso mesmo, a Lei naquela região seca do nordeste é a do “olho por olho”. A família do finado Maximiniano iria cobrar aquela morte. Agora restava saber em quando e em quem da família de Manoel.

Em cima de meu cavalo, a caminho da casa do compadre, tive um pensamento infeliz, pensei ainda bem que nessas horas sou somente compadre e não parente, apesar de que o tinha em alta-estima e nos tratávamos melhor que parentes.

O meu cavalo, estrela branca, sacolejava de um lado para o outro, era madrugada e devagar para se evitar situação de perigo, desnecessário. Meu finado tio é quem me dissera: - Menino, se você não está enxergando direito, então vá mais devagar, num dos seus muitos conselhos que sempre me dava, quando estávamos sentados descansando ou ao redor do fogo.

E ali com meus pensamentos, cuidava para que estrela branca não se machucasse. Compadre Manoel tinha pedido que me apressasse, pois tinha que me falar logo. Como aquela tragédia tinha acontecido, fazia umas doze luas, com certeza ele queria tratar sobre isso, e na última conversa que tínhamos tido, ele me dissera que estava com mau pressentimento.

A situação pedia cuidado, ainda mais que tudo andava muito quieto nada se falava a respeito. Isso não era bom de jeito nenhum. Os da família o apoiavam, cabras valentes a toda prova, ignorantes também. Não chegados à conversa, de jeito nenhum, principalmente diante da situação.

Já tinha andado muito e ainda pensava que do jeito que Manoel tinha sorte, mesmo que fosse direto contra ele a vingança, se sairia bem. Pelo menos eu queria acreditar nisso.

Mas tem dias que a sorte descansa ou tira folga e vai dar volta de mãos dadas com a vingança. O compadre além de alegre era agoniado por demais. Sem paciência de esperar, vindo ao meu encontro, na noite, de lua minguante, seu cavalo não viu um buraco fundo de boca pequena, suficiente para entrar a pata e assim aconteceu, o animal quebrou a perna e Manoel o pescoço.

A família de Maximiniano nunca cobrou a dívida.