Ninguém por ele

O homem fedia mais que macaco matado a tapa, também pudera, estava enfiado no mato a mais de trinta dias. Saíra para caçar, levou seu cachorro e uma bocuda, munição à vontade e até um pequeno rancho caso precisasse ficar mais de dois dias. Mas a coisa deu pra trás. Dentro da mata, perderá o rumo, não sabia como isso poderia ter acontecido, mateiro velho, conhecedor de tudo o que era caminho e picada, agora se via sem saber se ia ou se vinha, devia estar ficando fraco da idéia, pensou. O cachorro, companheiro de tantas jornadas, forte e corajoso, inteligente que mais parecia uma pessoa inteligente, é claro, fora picado por uma bico-de-jaca e agora estava agonizando e seus últimos suspiros e babando, a munição não tinha usado, a caça parece tinha tirado folga, chegou a pensar que estava tendo um pesadelo. Quando o cão deu o último suspiro, foi que sentiu que era verdade mesmo, chorou copiosamente, de novo parecia que tinha morrido uma pessoa, querida. Nem a víbora conseguira matar, veja lá se isso é um amigo leal, não foi capaz de vingar a morte do amigo. Desesperado enveredou mais ainda para dentro da mata, sem se preocupar o destino, estava emocionalmente abalado. Alguns minutos depois, percebeu o quanto estava sendo desequilibrado emocionalmente, parou suspirou fundo e mais aconteceu, a comida e a munição juntamente com a espingarda tinham ficado para trás. Sentou em uma pedra grande, abaixou a cabeça e pensou: um rio é isso tenho que seguir a correnteza de um rio, mas onde há um rio? Sem chance. O peão então desistiu, deitou ao relento, esperou a noite chegar, até que essa chegou, percebeu que não tinha nada mais do que o cachorro e a roupa do corpo, nunca pensara em fazer amizade profunda e muito menos casar. Então ninguém sentiria sua falta. Dormiu. Depois de algum tempo foi acordado por uma cadela, feia, magra lambendo-lhe o rosto, mas como pudera ser isso? Foi justamente aí que percebeu, ele não tinha ninguém por ele, mas seu cão tinha e foi aquela magra e feia cachorra que salvou sua vida.