Paisagem do Morro do Estreito jun/2008

O DIA SEGUINTE (Fabula do PÉ de GARRAFA!

No dia seguinte, somente Valmir de Vessinho poderia com exatidão descrever a angustia do dia-a-dia de Vera Coco, depois daquele tremendo susto que mudou sua vida. A notícia já tinha se alastrado por toda cidade, que não falava noutra coisa, senão naquele episódio sinistro e um tanto cômico, ocorrido na Luzia de Pedro Ferreira A Luzia tinha em sua histórias alguns estigmas, como lugar assombrado e vai lá saber a razão dessa fama; talvez alguma lenda! Era a região onde a população ia buscar caju e olha que ali tinha os cajus mais raros da região, longos como dedo de moça e doce como a própria comparação.
 
A Luzia era um lugar sinistro pela própria natureza, por vezes a bicharada fazia um silencio que de tão absurdo, se escutava a voz do vento soprando no alto das copas das árvores, ou zuzindo num pequeno graveto no chão e nessas horas estar no meio da mata era assustador; pisar num galho seco e sobre as milhares de folhas secas que forravam o chão,  fazia um eco assombrador, como a dizer ao predador a exata localização da presa.
 
Na Luzia havia algumas grutas nativas e buracos por todos os lados, abertos pela população que ali iam buscar um barro colorido, que dissolvido na água quente e adicionado goma de tapioca, transformava-se na tinta com a qual se caiava as casas, razão das romarias nos fins de ano, quando a cidade vestia-se de cores, para chegada do menino Deus.  Era também na Luzia que o velho Xixico tinha uma pequena propriedade e se passava pelo “Pantaleão” de Correntina; e olha que naquele tempo Chico Anísio não era conhecido naquele eito de sertão. Xixico  contava histórias absurdas, com uma seriedade que fazia muitos crerem nos causos que ele contava que ocorria em sua pequena propriedade. Suas mentiras eram contadas com tanta convicção, que creio ser ele mesmo uma dos seus admiradores de suas in-verdades, que para muitos, era tudo verdadeiro. Dizia Xixico que em sua exotica propriedade, criava um casal de unicornes, nego d´água solteiro que vivia atrás de uma moça, recusava  qualquer intimidade com uma jovem  Saci, de uns 14 ou 15 anos. Até um casal de Pé-de-garrafa Xixico mantinha em sua propriedade. Quando o rio ficava com suas águas barrentas, dizia o velho aventureiro, que estava construindo um grande taque,  como casa de um casal de baleia que havia encomendado de um amigo, morador no litoral. Quem sabe se a besta fera que atacara Vera Coco não tinha escapado do viveiro do velho Xixico, já que tudo ocorrera nas mediações de sua propriedade!


 

- O Pé- de-Garrafa quase comeu Vera Côco!

Este a grande gozação da meninada!  Eu sei bem o que era passar pela atentação dos endiabrados meninos, afinal nós também eramos um deles, a questão era apenas de oportunidade e eu havia dado também um grande motivo para ser alvo de seus maldosos comentário, quando peguei  CR$ 10.000 (dez mil cruzeiros) no armário do me pai. Não havia banco na cidade e meu Pai era responsável pelo pagamento dos funcionarios da Codevas e para tal, buscava o dinheiro em Bom Jesus da Lapa, ficando como guarda do mesmo por mais de uma semana, as vezes e neste intervalo eu havia descoberto que a chave da penteadeira também abria o armario pessoal de meu pai e na curiosidade de menino tive a grande descoberta dos montes de dinheiro... cometei o fato com Pedrinho de Pedro Aleixo, o amigo mais próximo e juntos bolamos o plano que ele já fazia com sucesso em sua casa. Pegar dinheiro no bolso do Pai. Só que o velho Pedro Aleixo tomava todas e meu pai não tomava nada!  Resultado. Peguei os dez mil cruzeiros, dei três para Pedrinho, e queimei cinco mil entre sexta e segunda, pagando tudo para todos, sentando nos bares da cidade e pagando rodadas e mais rodadas de guaraná antartica, a melhor bebida do mundo, comprando bandeijas e tabuleiros de bolo, pão, cocada, doces... 

Os parceiros de gastança foram os primeiros a seguir em procisão atrás de mim e de minha mãe, quando fui descoberto. Diziam uns para os outros: - Vamos pra casa de Toinho, ele vai tomar uma surrra! - Porque? porquE?  Ao eles apoiavam um dos polegares no centro da mão e girava os quadro dedos no sentido horário, dizendo: - Ele roubou um dinheirão do pai dele!

Eu sabia o que era passar pelo que Vera Côco estava passando, pois daquele dia e por um bom tempo, eu virava bicho quando um menino apoiava o pelegar na palma da mão e girava, gritando meu nome:  Toinho oh! oh! ... Outros faziam o mesmo gesto, apoiando o polegar na beira do bolso da calça ou da camisa e girava os mesmos quatro dedos, enfiando depois a mão inteira no bolso: - Toinho oh! oh! oh!  Tudo aquilo era como se gritasse na minha mente: - Ladrão! ladrão! tanto que eu por vezes respondia impensadamente: - Pegar do Pai não é ladrão!

Hoje chamam tudo isso de "buling", coisas da modernidade de uma vida globalizada. Os meninos de Correntina e de toda cidade do interior do país, nos anos 60 e 70, viviam a procura de emoções onde gastar suas energias, até mesmo suas fantasias sexuais,  com as experiencias vividas nos pastos e currais... mas viviamos uma vida sem igual, uma vida que nunca, nenhum de nós, meninos dos anos 60, 70 trocariamos pela vida vivida pelos meninos de hoje, principalmente apartir dos anos 2000... de 70 para cá esta vida foi se transformando, transformando, as emoções foram dando lugar a uma vida vazia de sentimentos puros... Talvez o minha história e o causo de Vera Côco tenham sido os ultimos vividos. 

Naquele tempo a imaginação era sim  mais vasta em sua pureza e os causos vividos  passavam de boca em boca, as vezes transformando um pequeno incidente, num ato de heroismo que nem o causo de Geraldo Corujão, quando diziam ter ele voado grudado no rabo de um teco-teco.  (veja o conto Correndo atrás do avião) . No caso expecífico de Vera Côco, para que não ficasse dúvidas quanto ao tipo de comida se referiam os fedelhos; o aceno que se segui com a pirraça era o que mais indignava Vera Côco: Com os braços curvados pra fente, em L e a altura da cintura, o maroto pirraçento levava e trazia os braços, como se num ato sexual,  pelo sincronismo com que  imititava o sacolejo sexual! Ao invés de ais e uis de prazer a  cena era precedida de risos de deboches e por vezes com uma baixa frase: - O Pé-de-Garrava queria o comer o cú de Vera Côco!!! Isso era demais, muito demais para o macho menino  que sentia na pele a raiva que passara também os loucos da cidade, quando atingidos em suas fragilidades. 

Na falta do que fazer, perambulava as ruas da pequena cidade em busca de um doido, para lhe puxar o xalé, o chapéu ou gritar uma frase ou nome por ele detestado: - Cebola!!!.

- O Pé de Garrafa enrabou o côco de Vera côco! ih ! ih! ih!...


E Côco nada podia fazer, senão azular de raiva...! Pensa num pretinho irado, com o sangue a subir-lhe pela cabeça!! Vera Côco espumava enquanto os fedelhos contavam como bem imaginavam ter ocorrido. Teve menino que foi até o local vê se encontrava indícios que comprovasse a tal aparição.

A roça das Prexedas se transformara em local de romaria de meninos curiosos, que na desculpa de pegar frutas do cerrado, (cajú, cascudo, puça, araça ou até mesmo pequi), acabavam indo parar frente aos pés de barriguda onde o tal Pé de Garrafa, primo em 1o. grau do Moleque Saci, havia atacado Vera Côco.

A prova estava lá, pelo menos o cenário não negava as narrativas. Era tudo igual ao que descrevera Luis de Queno, quando no momento exato, salvou Vera de ser comido, comido, ou comido fudido, pela tal alucinação.

Era tudo uma questão de momento. Na manhã seguinte àquele fatídico domingo, lá estavam eles, Vera Côco e seus algozes, hora jogando uma peladinha na grama da praça, no campinho frente ao casa de Bazu; noutras abriando pequenos burados no chao, a que chamavam de "topes", nos fundos da igreja matriz, para jogar bola de gude. Os meninos andavam com os bolsos abalroados de bolas e jogar bola de gude para Chuíte de Luizinho e Linguiça, não era mais uma diversão, mas uma profissão. Os pestiados eram bom em qualquer modalidade de jogo com as pequenas e brilhosas bolas de vidro, tinham uma pontaria que lhes davam o dominio do jogo e quando chegava a hora de matar a jogada era fatal o arremesso do dedão polegar, ou mesmo direto do "catóio" em direção a uma das dezenas de bolas espalhas no canto de uma parece ou barroca, esperando o acertador da bolada.

- Pimba!!! e lá corria Shuíte ou Linguiça, aos risos de prazer, para pegar a bolada que enfiavam no embornal que já lhes servia de deposito de bolas, para no momento seguinte vender aos novatos ou viciados, na brincadeira.
Tudo ía bem nestes furtiveis encontros, desde que nada do acontecido na Luzia viesse a tona. Bastava um olhar atravessado, seguido de um sorriso de canto e todo cenario mudava de cor... a harmonia de antes se transformava em bate-boca ou num atracamento dos moleques que rolavam pelo chão, aos gritos da torcida... Lá nas Prexedas o cenário era outro; quatro ou cinco pés de barrigudas predominavam a paisagem e em volta deles uma intacta mata de cerrado, rica em frutas típicas do cerrado brasileio. Os pés de barrigudas eram tão barrigudos que se faziam necessário quatro homems de mãos dadas, para abraçar o tronco do maior deles; a sexta barrigudeira a leste dos demais, havia tombado e foi alí o epicentro de todo esse alvoroço. O ciclo de vida daquela barriguda estava celado; ele se completaria nas maretas do maretão; quando pedaços aplanaidos serviriam de pranchas para a molecada descambar rio abaixo, as vezes em bandos, seguindo um lider que levava consigo uma suculenta melancia, para chupar em alguns lugar especial na beira do rio até o lavador; um antigo banheirão masculino onde homens e meninos tomavam banho pelados, a qualquer hora do dia ou da noite.

Os meninos da cidade não podiam saber de um pé de barriguda tombado que pra lá saiam em grupos, pra tirar lascas preciosas da fofa madeira, uma especie de isopô natural, que se transformava em assessório indispensável de banho, para meninos e rapazes, nas águas do rio corrente de Correntina.

A excessão era Valquíria de Seo Porfírio, que certamente animada pelo eu irmão Geraldo, por vezes era vista flutuando pelas correntes do rio, embelezando o cenario com seu corpo dourado, cortornado pela roupa molhada. O maiôr e o biquini eram privilégio de poucas corajosas moças, que alheias as opiniões das carolas, completavam a beleza do ceenário... impossível não lembrar Raquel de Seo Moacir, Noelia de Dr. Lauro, Diana de Iozinho e Rosinha de Joaquim Brotinho, as filhas de Dr. Raul... razões suficientes para de quando em vez topar um assanhado adolescente ou rapaz a mudar o nome de sua mão esquerda ou direita... com a cabeça fora dágua, ou escondido na moita mais próxima a se satisfazer diante do cenário indescritível... aí Edna!... ai zil... aí... ui!.

Esse negócio de pranchas, brinquedos industrializados, era coisa de cidade grande; lá em Correntina a tábua de barriguda, o carrinho de madeira, a bola de meia, eram fabricação caseira, brincar na rua de areião, cavalo de pau, boi-de-osso era o grande momento de um passatempo infinito, na predileção de nossos meninos... Controlar com um guiador de arame rígido,a rodar de aço que faziam rodar por toda cidade... O objeto rodante era extraído das bordas dos tambores de 200 litros, que vinham com querorene ou gasolina, para abastecer os carros e lamparinas da cidade. O desafio de qualquer um deles era passar pela calçada do velho "meleta" que se irava com aquele barulho de roda ou carrinho a passar na calçada, frente a seu pequeno comercio, na praça do Cine Teatro. Militino ficata tão irritado que chegava se esconder atrás da porta, esperando o fedelho adentrar o espaço de sua calçada e saia na rapidez de um calango, surpreendendo o moleque que tinha o objeto chutado longe, pra fora de sua calçada. eita velho burrento que nos deixou tanta saudade!!!Vítima de uma grave miopia, seus óculos de grosas lentes, era chamado de fundo de garrafa, mas isso não lhe impedia chutar o carro ou a roda de quem passasse por sua calçada; Descobrimos mais tarde que não era o barulho que tanto aborrecia o velho marrento; diziam que ele dizia, que aquilo gastaria o piso de sua calçada e a prova desse exagero era confirmado quando por pirraça algum moleque atravido passava arrastando o sapado ou a velha havawaia. O velho não arracanva o cançado dos pés do moleque, mas saía a porta com um chicote e aí daquele fedelho que o tentasse encarar.

Hoje tudo mudou, a inocencia acabou e muitos daqueles dias foram esquecidos diante dos televisores, computadores...o que antes chamavamos de pirraça, agora surge um termo vindo lá do estrangeiro a dizer tudo aquilo é hoje chamado de "bullings!" . Aquela coisa de pirraçar os doidos, de brigas por motivos banais... "bullings"!!! mas até nisso se tinha inocencia.

Eu mesmo ja fui a bola da vez dessas pirraças, quando em 63 voltei do Rio de Janeiro, onde fiquei por quase dois anos e de lá retornei tocando acordeon e depois que deixei de ser novidade, foi alvo da molecada que passaram a pejorar minha arte musical, a chamar-me TOIM Pé de Bode! Eu virava o bicho, a responder que tocava uma Todeschine 80 baixos! Eu prefiro a pirraça de outrora, ao "bullings," de agora!

São tantas pequenas histórias "bullings ou pirraças" que hoje, as próprias vítimas, se confessam saudosa daquele tempo... das velhas lembranças dos meninos que fizeram morada eterna em nossas lembranças. "Comia muiiito!!" Quem se lembra dessa?

Era um sobrinho do velho Lormino, morador da Praça da Matriz, na antiga casa onde havia morado Miro Telegrafista, funcionário dos correios, que acabou virando candango. Parece que o menino tinha o mesmo nome do tio, e saiu do interior do municipio para vir estudar na cidade, interno do Educandário São José, dirigido pela Professora Julia Guerra e Ir. Zelia Brandão. O menino sentou-se a mesa para comer e lhe colocaram um prato feito diante de si... ele olha o prato, passa as vistas nos demais colegas e pratos a mesa e se eterniza numa frase que o seguiu por todo tempo, quem sabe o segue até hoje:

- Lá em casa eu comia muuiito e aqui só esta moitinha!
(moita é uma porção de mato; ele se referia a uma moita pequena de comida) Ficou conhecido em todo colégio como "Comia muuuiito!".

Com certeza o protocolo fora quebrado em risos incontroláveis, quando Zinzinho de Zé de Malvina, de nome Evangelista, passou por uma dessas experiências memoráveis.

Foi numa daqueles saudosas excursões futebolistas, quando grupos de atletas saíam da cidade para jogar bola nas cidades vizinhas. Santa Maria da Vitória era uma rivalidade Argentina, não havia amistoso, era rivalidade mesmo. A loucura era encarar a carroceria de uma vasculante, sentados numa plataforma de ferro, ou sentados na borda que cobria a boleia da cançamba... Lá fomos nós pra Santana dos Brejos, trepados na vasculante, por 80 km de estrada de terra, totalmente desconfortável. Santana era o lugar preferido dos rapazes correntinenses, que sempre procuravam um motivo ir vê as belas donzelas do lugar e visitar o Seo Edvaldo o guarda da SUCAM, pai de cinco belas morenas e uma loirinha de parar o transito. Eles haviam morado em Correntina e de lá saíram próximo a adolescencia, mas já haviam deixado o ar da graça nas matinês dançante de domingo, realizadas na sala da casa de Cordeiro.

Zinzinho recebeu algumas dicas de etiqueta, a grosso modo; não que não as tivesse, mas era sua primeira viagem fora dos limites da cidade de Correntina; os supostos entendidos da tal finura lhe havia dito que a mesa não se falava de boca cheia, que não se assoprava a xicara com café ou leite quente, ou que pegasse com as mãos qualquer coisa de comer e que tudo podia ser feito, mas com muita discrição, mas o uso de um pegador ou o garfo, era a forma correta, e colocava em seu prato de uso pessoal, etc... etc... Pois bem, a caravana chegou a noite no hotel Santana e no café da manhã havia na mesa pão, mangeiga, bolacha de sal... Zinzinho pegou um garfo e foi na direção do prato de bolachas de sal e fincou o objeto de pontas, com vontade no prato de bolachas... não ficou nada no prato! os risos foram inevitáveis e Zinzinho voltou da excursão sendo "o bulachão"... pancoso ou playboy como era, nunca quiz admitir o fiasco, e teve a sorte do apelido não vingar, o geralmente ocorria com os apelidos crônicos, que mudam nas pessoas o nome de batismo.

Vera Côco não teve a mesma sorte, já havia sido marcado pelo codinome Côco, diante da destreza de subir nos coqueiros, e de um dia para o outro Vera Côco virou celebridade; seu causo era o mais contado nas rodas de conversas; na porta de casa ou no Jardim da Praça da Matriz, onde por hábito homens e meninos faziam pequenos circulos de prosas, que avançavam noite a dentro. Não era só mais um causo de assombração, pois aquilo com acontecera com Vera Coco podia acontecer com qualquer menino do lugar; foi um fato sobrenatural, com testemunho ocular, tal qual acontecera com Bento, o menino que não tirava a desgraça da boca, até o dia que ela lhe sorriu. O porém é que a cada vez que se contava o causo ocorrido com Vera, alguém por querer florear ou assombrar mais a narrativa, lhe acressentava pitadinhas de fantasias próprias, isto é, acrescia mais um ponto, naquele conto.

Após essas rodada de prosas, que vazava noite adentro, ficava difícil mesmo era a volta pra casa. Era um alívio quando Pai ou Mãe chegava a procura do seu rebento, do contrário, o mais corajoso da turma saia fazendo entrega um por um, de porta em porta e depois contava no dia seguinte como ele chegara em casa:

- foi um carrerão só, mal via por onde passava. Não havia rumão-zinho, saci ou pé de garrafa que me pegasse na carreira.

Era mais fácil para Vera Côco conviver com as lembranças daquele domingo assustador, de que com as pilherias dos meninos, pelas ruas da cidade. Os fatos fugiram da realidade e aquilo azuretava Vera que de tanta fama, repercutida com o causo, que Seo Zé Patricio acabou por lhe convidar para fazer um numero no Circo Hollywood, armado ao lado da Maternidade do Pa. André. O circo já tinha pronto a chamada do espetáculo, mas não estava conseguindo a autorização de Dona Francisca, o anuncia dizia:

- Circo Hollywood apresenta com exclusividade o menino e o Pé-de-Garrafa! um caso real que o circo Hollywood apresenta em seu picadeiro, com a participação especial de Vera Côco.

Dona Francisca não se entusiasmou com a idéia, embora Vera, acostumado a ganhar seu dinheirinho, se mostrara entusiasmado com a idéia, para Dona Francisca a honra estava acima de qualquer questão, mesmo se tratando de dinheiro, muito ou pouco, para a ela a questão da dignidade da familia estava acima de tudo. Enquanto todos esses fatos estavam ocorrendo, no universo dos meninos, era coisa de menino, mas da ípartir para espetáculo... Seria admitir o ridículo, pensava ela.

Quem quisesse conhecer Vera Côco tinha que saber dele antes do susto do Pé-de-Garrafa, pois agora, o menino teimoso se convertera aos mandamentos da Senhora sua mãe e estava bem distante de ser o que antes fora. Vera podia ter moldado seu comportamento arredio, mas perdia as estribeiras quando nas rodas de bate-papo o inevitável assunto vinha a tona, muitas vezes com uma insinuações maldosas...

- O Pé-de-garrafa queria enrabar Vera Côco! mais um pouco ele torava as pregas dele.!

- O Pé-de-Garrafa queria torar o miolo do Côco!

As risadas e caçoadas se davam em côro e aquilo matava a unha o menino Everaldo; que por vezes sacava seu estilingue, quando não se atracava com um dos que lhe faziam pilheria e aí era um fuzuê que somente Cassimiro seu irmão era capaz de arrancá-lo daquele teretete desmedido, literalmente arrasta-o para casa.

- Eu que vou torar sua irmã seu cafuçu!

- Calma Vera! Não liga não meu irmão! isso é uma cambada de estrupiados, filhos de uma puta. (dizia Cassimiro enquanto arrastava seu irmão) Ocês não viram o que Vera viu! senão batia mesmo era as botas invés de desmaiá!

Outros, curiosos em saber realmente do ocorrido; sentavam-se em torno de Vera Côco, no batente do coreto da praça e ouviam atentos o relato:

- Ví um barulinho de graveto fazer trake e depois crek e olhei para trás quando ví o bilho de um só olho na testa, um olho grande; ele era peludo como um macado pardo... olhei para os lados pra pedir ajuda e quando ví o danado estava quase colado na minha nuca... abriu os braços... eu quiz apontar o estilingue... além dele estar perto demais, não senti os braços nem as pernas; como correr! não tinha pernas aí tudo escureceu e eu caí... acordei com Luis batendo na minha cara!

- Vera acorda! acorda! cê desmaiou cara ?

- Cara!!! você viu? você viu o cara?

- Que cara, Côco, ví um vulto, parecia um sombra... sei lá o que ví! Foi o que você viu?

- Acho que foi ! Era um bicho? um homem de um olho e uma perna só!!! só lembro que dei um grito como nunca gritei e pulei pru o lado e não ví mais nada!

- Era o Pé-de-garrafa Côco? como era Ele?

- Eu já não disse! assustador! assustador! uma olhada de segundos foi o bastante pra vê que parecia gente, mas era muito peludo pra ser gente, tinha um olhos só, uma perna só... era um pedaço do cão!.

- Se não fosse um cão inteiro!

- Cão cachorro?

- Deixe de ser burro Linguiça é cão de cão, capeta, ora esse de cão cachorro!

- Ô Vicente! quer me deixar confuso com essa coisa de cão e cão que não é cachorro!

e Vera Côco continuava sua narrativa, agora se valendo da atenção dos que lhe ouviam; contava o causo com alguns pontos a seu favor, claro!.

Não se tem conhecimento na história da cidade, que alguém tenha em outra oportunidade se deparado com a tal criatura cavernosa. O que se fala é que lá pras bandas da Baraunas o Nego D´água, outro primo primeiro da familia de capetas, havia levado embora pelas águas do rio, uma domestica, por quem se apaixonara.

Raimunda Raposa foi uma louca que toda cidade conhecera, e que viveu por essas bandas até a década de 90; muitos não lhes davam ouvidos, mas ela por vezes chegada a cidade ferida, arrastando uma grande cobra ou contanto uma história de luta com uma besta fera. Certa feita contara que encarou o tal Pé-de-Garrafa, com uma lasca de aroeira. Nninguém duvidava da coragem daquela louca selvagem. (Veja artigo: Raimunda Raposa, em Biografias: Os loucos de Correntina.)

Pior que a aparição do Pé-de-Garrafa, só mesmo a aparição do Rumãozinho na casa de Godão de Maria Nova; ambos tivera testemunhas oculares e no caso do ocorrido com Vera Coco, os irmãos Paulo e Luis de Queno foram testemunhas e estão aí, até hoje para provar a quem duvidar deste causo. Foram eles quem socorrera Vera e lhe erguera do chão onde estava desmaiado. Junto com eles estavam ainda Shuite, Vicente de Pedro Guarda e Jaime de Pedro Ferreira, que em momento algum desdizem os relatos de Luis.

- O Bicho é qualquer coisa, menos gente e muito menos bicho do mato. Dizia Vera aos que atentos ouviam seu relato.

Rarissimamente o Pé-de-Garrafa é visto e quem o viu foi de longe, em rapida aparição, como um raio que passava e se escondia por trás de uma árvore. Comum era ouvir o eco de seus gritos pelas matas, a confundir com o nosso próprio grito. Dizia Dinda que a tal assombração era perita em imitar vozes humanas e cantos de passarim, para justamente atrair meninos levados, que se embrenhavam no mato.

Naquele dia Vera Coco se deparara de frente com ele sem ter ouvido um só grito ou gemido. Há quem diga que ele usava os pés de barriguda como morada e isso explica a aproximação silenciosa. Vera estava no lugar em que ele estava, coisa rara de acontecer. Os companheiros estavam a pouco mais de 100 metros, a ponto de ouvir as pisadas uns dos outros nas folhas secas. O pior em tudo aquilo fora a fama de frouxo que caiu sobre Vera Côco. Todo mundo na cidade queria caçoar dele, mas ninguém tinha coragem de colocar-se em seu lugar. Eles não viram o que Vera vira, mas tinham uma noção de tudo que acontecera; o fato de caçoar era mesmo culpa da "mesmice" de todos os dias na cidade; a rotina de sempre, a necessidade de um caso novo, para quebrar a rotina de todas as horas.

Qualquer fato, ou boato, por mais banal ou insignificante que fosse, era um grande motivo para mudar a rotina das pessoas; muitos passavam horas assentados nas portas das vendas e bares, esperando por cliente ou que o tempo com seu mormaço quente passasse.

Luis foi o primeiro a chegar no local, atraído, diz ele, por um grunido rouco e gritou por Paulo seu irmão. Rapidamente o grupo estava lá, em volta de Vera Côco, querendo saber o que de fato acontecera. O grito de Luiz fora um salvador, pois desarmou o bote do Pé-de-Garrafa, que evaporou feito fumaça, no ar, não se sabe até hoje se ele entrou em alguns tronco dos pés de barrigudas próximo, ou se escafedeu cerrado a fora, na velicidade da luz.

- Cê viu? cê viu? vamo embora daqui ! vamo, vamo!

Vera Côco continuava assustado, quando o grupo todo conseguiu se reunir em torno dele; todos confessaram ter ficado arrepiado do pé a cabeça e de olhos exbugelados de medo tentavam identificar o que de fato acontecera naquele lugar sombriu...

- Ninguém viu o que você viu Vera. Só ví uma sombra feia flutuar no vento e sumir. Disse-lhe Luis.

- O que você fez com o facão que tinha na mão meu irmão?

- Eu lá lembrei lá de facão Jaime!

Naquele lugar Vera Côco nunca mais colocaria os pés; por muito menos eu, só sei que o dia seguinte àquela tarde de domingo, na verdade até hoje não passou!

 
Flamarion Costa
Enviado por Flamarion Costa em 13/10/2009
Reeditado em 13/08/2013
Código do texto: T1863056
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