O poder do grito (Trombetas - PA.)
Vim correndo!
Montei em minha bike lilás, equipada com luz de freio, devidamente lubrificada, que semana atrás havia comprado, e vim correndo. Vim correndo a fim de relatar mais esse caso, pra não dar chance ao tempo de consumir com algum detalhe.
Domingo passado fiquei boquiaberto com as estórias do Vitamina, com quem eu almoçava no Iate e do Sarmento, um pernambucano quarentão, forte, que é dono da casa. Sarmento quedou-se por aqui em Trombetas há vinte anos atrás, época em que veio como segurança do então Presidente da República, o Gel. Ernesto Geisel – que Deus o tenha em ``bom `` lugar – quando da inauguração da MRN - Mineração Rio do Norte.
Hoje, responsável pela Segurança Patrimonial da Mineradora, este bravo ex-soldado do Exército Brasileiro colecionou estórias no noroeste do Pará e não poupa a lingua pra contá-las. Assim foi que, durante o almoço, a conversa que girava em torno das cobras venenosas de picadas mortais que existem na região, passou derepentimente para os felinos que vez por outra são avistados. Sarmento jurou de pés juntos que transita por aqui uma categoria de onça preta de nome Tapiauara, que tem as duas patas traseiras semelhantes às de um burro, que andam sempre em duplas, também mortais e que não encontrou nenhum registro delas nos anais da História Natural.
Se ela aparecer e tu subir numa árvore, uma fica lá em baixo à tua espera, enquanto a outra sai à busca de mais caça. Só assim é que se separam.
E aí? Perguntei ávido de solução.
Aí, respondeu ele, tu pega o celular e liga prá nós no 7198 que a brigada vem te resgatar.
E eu que tinha prá mim que esse negócio de celular era mais prá exibicionismo, estava me inclinando em adquirir um, por estar longe da família, agora então... pensei...
Ah sim, ia me esquecendo! Ele disse também que esta onça deixa exalar um mau cheiro horrível e não se sabe proveniente donde. A onça comum, meu amigo – continuava ele – tem medo do homem. Ela só ataca o homem pequeno. É que ela o confunde com as suas presas. Um homem com uma estatura tal como a sua – apontou prá mim - ela nunca ataca.
Fez uma pausa, tempo suficiente para que eu me sentisse confortado pela rechonchuda barriguinha que trago comigo por estes últimos anos. E eu que pensava em tirá-la, heim!
Ele aterroriza de novo: agora tem o seguinte: - parei com o garfo que havia levado à altura da boca - se tu passares em meio à ela e sua presa - a caça a que ela estiver espreitando - ahhhhh meu amigo,
aí não tem perdão, ela te mata qualquer que seja a tua estatura.
Mas de uma maneira em geral - prosseguia - ela tem medo da gente.
Tu quer ver? Se tu deparares com uma onça, fique quieto. Fique quieto e solte um grito bem forte - lembra do Tharzan? Então. Bem forte que ela imediatamente sai correndo! Elas também têm medo do homem!
Nessas alturas já estávamos acabando de saborear a caldeirada – tucunaré ao molho de alcaparras, regado à cerveja – e demos a conversa por encerrada . Procurei rumo de casa doido por uma soneca. O certo é que fiquei matutando aquela estória pela semana inteira. Cheguei a dar algumas risadas sozinho e também à conclusão de que deveria continuar a conversa com Sarmento. Domingo seguinte, depois de assistir à missa, pedalei rumo ao Iate para dar conclusão ao caso. Dei de cara com ele assentado junto àquele amontoado de mesas e cadeiras reviradas da noite anterior. Os empregados ainda não haviam chegado. Aqui, dia de domingo, antes das dez, só missa. Pedi uma cerveja dando mostras de que queria prosear. Não resistí por muito e fui direto ao assunto:
Ôh Sarmento vem cá. Estive pensando naquele caso da onça e cheguei à conclusão de que você é bem fêdaputa! Porque? – Perguntou sorrindo.
Você falou que se agente der um grito a onça vai embora, mas eu penso que numa hora dessas, além de nos faltar as pernas, faltará também a fala. E aí? Como é que fica?
Ele deu uma farta gargalhada e disse:
Ah meu amigo! Essa mesma pergunta uma senhora fez ao Sr. Djalma - do zimba-safari de São Paulo, - há dois anos atrás, quando aqui esteve a proferir uma palestra sobre os felinos. E sabe o que ele respondeu prá ela?
``Bem; se faltar a voz dona Maria, se faltar a voz..., a senhora peida! Peida bem forte que a pintada vai embora do mesmo jeito! E isso com certeza a senhora vai conseguir fazer - ah isso vai.
Não aguentei de tanto rir! Pequei minha bicicleta, já sem forças nas pernas e concluí: não vou mais perder meu tempo.Você é bem mais F.D.P. do que eu imaginava! Tchau...
Já pensou se D. Pedro I soubesse do poder desse grito?
Trombetas, junho de 1999.
Vim correndo!
Montei em minha bike lilás, equipada com luz de freio, devidamente lubrificada, que semana atrás havia comprado, e vim correndo. Vim correndo a fim de relatar mais esse caso, pra não dar chance ao tempo de consumir com algum detalhe.
Domingo passado fiquei boquiaberto com as estórias do Vitamina, com quem eu almoçava no Iate e do Sarmento, um pernambucano quarentão, forte, que é dono da casa. Sarmento quedou-se por aqui em Trombetas há vinte anos atrás, época em que veio como segurança do então Presidente da República, o Gel. Ernesto Geisel – que Deus o tenha em ``bom `` lugar – quando da inauguração da MRN - Mineração Rio do Norte.
Hoje, responsável pela Segurança Patrimonial da Mineradora, este bravo ex-soldado do Exército Brasileiro colecionou estórias no noroeste do Pará e não poupa a lingua pra contá-las. Assim foi que, durante o almoço, a conversa que girava em torno das cobras venenosas de picadas mortais que existem na região, passou derepentimente para os felinos que vez por outra são avistados. Sarmento jurou de pés juntos que transita por aqui uma categoria de onça preta de nome Tapiauara, que tem as duas patas traseiras semelhantes às de um burro, que andam sempre em duplas, também mortais e que não encontrou nenhum registro delas nos anais da História Natural.
Se ela aparecer e tu subir numa árvore, uma fica lá em baixo à tua espera, enquanto a outra sai à busca de mais caça. Só assim é que se separam.
E aí? Perguntei ávido de solução.
Aí, respondeu ele, tu pega o celular e liga prá nós no 7198 que a brigada vem te resgatar.
E eu que tinha prá mim que esse negócio de celular era mais prá exibicionismo, estava me inclinando em adquirir um, por estar longe da família, agora então... pensei...
Ah sim, ia me esquecendo! Ele disse também que esta onça deixa exalar um mau cheiro horrível e não se sabe proveniente donde. A onça comum, meu amigo – continuava ele – tem medo do homem. Ela só ataca o homem pequeno. É que ela o confunde com as suas presas. Um homem com uma estatura tal como a sua – apontou prá mim - ela nunca ataca.
Fez uma pausa, tempo suficiente para que eu me sentisse confortado pela rechonchuda barriguinha que trago comigo por estes últimos anos. E eu que pensava em tirá-la, heim!
Ele aterroriza de novo: agora tem o seguinte: - parei com o garfo que havia levado à altura da boca - se tu passares em meio à ela e sua presa - a caça a que ela estiver espreitando - ahhhhh meu amigo,
aí não tem perdão, ela te mata qualquer que seja a tua estatura.
Mas de uma maneira em geral - prosseguia - ela tem medo da gente.
Tu quer ver? Se tu deparares com uma onça, fique quieto. Fique quieto e solte um grito bem forte - lembra do Tharzan? Então. Bem forte que ela imediatamente sai correndo! Elas também têm medo do homem!
Nessas alturas já estávamos acabando de saborear a caldeirada – tucunaré ao molho de alcaparras, regado à cerveja – e demos a conversa por encerrada . Procurei rumo de casa doido por uma soneca. O certo é que fiquei matutando aquela estória pela semana inteira. Cheguei a dar algumas risadas sozinho e também à conclusão de que deveria continuar a conversa com Sarmento. Domingo seguinte, depois de assistir à missa, pedalei rumo ao Iate para dar conclusão ao caso. Dei de cara com ele assentado junto àquele amontoado de mesas e cadeiras reviradas da noite anterior. Os empregados ainda não haviam chegado. Aqui, dia de domingo, antes das dez, só missa. Pedi uma cerveja dando mostras de que queria prosear. Não resistí por muito e fui direto ao assunto:
Ôh Sarmento vem cá. Estive pensando naquele caso da onça e cheguei à conclusão de que você é bem fêdaputa! Porque? – Perguntou sorrindo.
Você falou que se agente der um grito a onça vai embora, mas eu penso que numa hora dessas, além de nos faltar as pernas, faltará também a fala. E aí? Como é que fica?
Ele deu uma farta gargalhada e disse:
Ah meu amigo! Essa mesma pergunta uma senhora fez ao Sr. Djalma - do zimba-safari de São Paulo, - há dois anos atrás, quando aqui esteve a proferir uma palestra sobre os felinos. E sabe o que ele respondeu prá ela?
``Bem; se faltar a voz dona Maria, se faltar a voz..., a senhora peida! Peida bem forte que a pintada vai embora do mesmo jeito! E isso com certeza a senhora vai conseguir fazer - ah isso vai.
Não aguentei de tanto rir! Pequei minha bicicleta, já sem forças nas pernas e concluí: não vou mais perder meu tempo.Você é bem mais F.D.P. do que eu imaginava! Tchau...
Já pensou se D. Pedro I soubesse do poder desse grito?
Trombetas, junho de 1999.