Meu amigo e a Abigail

Quando chegou de viagem ela estava lá, na varanda dos fundos. A varanda não é grande e isso a fez parecer enorme, na sua cor negra. Uma cadeira de ginástica, dessas que aparecem nas propagandas de TV com um atleta e uma gatona que juram que ficaram malhados graças a ela, a cadeira. Um presente de grego que não cabia na casa da prima, então, ela fez o obséquio de presenteá-lo com o trambolho, mesmo sabendo que a cada dele tem ainda menos espaço, com o argumento de que, sendo presente, fica feio recusar. Nos dois primeiros dias ele passava ao largo daquele monstrengo, mas aos poucos foi se acostumando com ela e até ensaiou uns exercícios. Até que não era ruim e estava mesmo precisando uns exercícios. Passou a levantar ainda mais cedo para a nova atividade. E foi se afeiçoando, digo, acostumando. Vinte dias de enlevo, digo, de exercícios e aquela barriguinha já era; já era, mais ou menos, mais pra menos, bem menos, quase nada. Mas o importante é manter o espírito para não desanimar e desistir. E para não desistir, melhor reforçar. E arranjou um tempinho à tarde também A cadeira já era uma amiga íntima e ele até a cumprimentava com bom dia e boa tarde e, eventualmente à noite, um até amanhã. Mas faltava algo nesse relacionamento e ele ficou matutando até que... Eureka !!!Falta um nome, ela precisa de um nome. E nada desses nomes fresquinhos, tem que ser um nome simples, bonito, um nome que seja companheiro, forte. Amélia. Não! Amélia já existe na música, podem dizer que é plágio ou inveja. Batizou a nova amiga íntima de Abigail, Abigail era discreta, sóbria, calada, Abigail não exigia nada, não pedia nada. Como uma Amélia, mas era Abigail. Abigail não suava, mas gemia. Como gemia e rangia a Abigail. Meu amigo não sai mais, não bebe mais aqueles chopinhos da sexta feira; qualquer coisa que se faça ou diga e ele menciona Abigail; a força da Abigail, a elasticidade da Abigail, a leveza da Abigail. Sei não, sei não. Se isso não é vício, é paixão.