A Posse apimentada de Euclides

A pequena e pacata cidade no oeste baiano, Correnitna, costumava pegar fogo em temporadas eleitorais, as familias tomavam posição em suas trincheiras e quando mais próximo se fazia o grande dia,  maior era o zum zum zum e a boataria acerca dos ultimos acontecimento. Foi não foi!  é ou não é...  era um interetete que só se acalmava, depois do resultados extraído das urnas e isso leva dias para que os animos se acalmasse e as rijas e ranços fosse sendo apagados... nem sempre se apagava de tudo, familias eram dividas sem prazo de um possibilidade de união para as lideranças, o povo e as famíias, aos poucos iam-se misturando a rotina de todos os dias, embora tivesse lá suas recaídas se alguém se metesse a recordar algumas das paródias ou alguns dos fatos, ocorridos na campanha.

Tudo na cidade era rotulada pelas siglas partidarias e em festa de Arena 1 não entrava Arena 2, que depois voltou a ser MDB e o pior é que o MDB era maioria na cidade e sua festas exploriam em sucesso, mas Arena não dava por vencida nos movimentos e festas folclóricas, embora tivesse os grandes artistas do outro lado de toda aquela intriga partidária.

Eleições de 1966,  eu tinha só 14 anos de idade, quando um fato tornou-se o grande causo que inspirou-me a contar tudo que não foi contado ainda em nossa história. Este causo tem um pitadinha de ficção,  como relato no livro "conto mais um ponto" onde publiquei uma serie de causos baseados em fatos reais.  O  fato é que este fato, virou causo e o causo virou lenda e agora ponho o meu ponto, como propriedade de quem  conta um conto aumenta um ponto e então vamos nós aos meus pontos.

...
Na cozinha ampla da casa de Iôzinho era comum ver Dinda, para muitos Maria de Iôzinho)  horas e horas conversando com um e outro, ouvindo os queixumes de jovens apaixonados, feridos pelo amor ou mães com seus filhos no colo, esperando Dinda, que nos mandava pegar um masso de flores sabuqueira, arruda ou fedegoso, e na falta desses plantas fortes, servia três galhinhos verde de qualquer quintal, a fé   faria é quem iria fazer a grande direrença da reza. Dinda não era nenhuma santa casamenteira, mas Dinda andou juntando alguns pares de namorados. Era um entra e sai da cozinha de nossa casa, onde Dinda alí fazia funcionar um escritório sentimental ou psicológico.

A Arena por mais de uma semana anunciava a festa de posse, do prefeito eleito nas eleições de 1966; os convites eram feitos em todos os arraiais do município, anunciando dia, hora, atrações e todo mundo sabia que a comilância e a bebedeira durava toda noite de forrobodá em algum ponto da periferia, para o povão, enquanto os socieleites dançavam no Cine Teato ou no salão principal da Prefeitura Municipal, embalados por um Conjunto Musical do momento.

Enfim era chegado o tão esperado dia da festa de posse do Prefeito Euclides, uma eleição tumultuada, com recontagem de votos e confirmada a vitória sobre Dr. Lauro Joaquim de Araújo, filho do lendário Major Feliz Joaquim de Araujo, por apenas 25 votos... Era um sábado e já de manhã cedinho a cidade já refletia o ambiente do que seria aquele fim de semana, desde o início da quinta-feira, com a chegada de muita gente do interior do município, famílias inteiras chegavam e se hospedavam na casa de parentes e os mais compromissados com as lideranças políticas, eram hospedados em casa alugadas para receber o povo.


Roberto de Flozinha, o jovem tipo por irreverente pela oposição, mas que tinha um grande acesso a juventude e crianças, se mostrava inquieto e inconformado com a falta de justiça; achava ele que a Justiça Eleitoral tinha argumentos de sobra para anular aqueles eleições, mas nada disso aconteceu e o prefeito da Arena foi empossado, agora, ele recebia o povo para uma grande e farta festa comemorativa, pela vitória. O baile seria na sexta para sábado e a posse se daria na noite de sábado para domingo.

Naquela sexta, Roberto procurou Mãe Dinda, talvez por outros motivos, mas antes de sair do confessionário, perguntou a Dinda:

- Dinda como se acaba com uma festa?

- Encha um salão de mulher e bebida destilada e provoque ciúmes a um valentão e ta feito o borogodó!

- Não Dinda! acabar com uma festa sem provocar briga !

- Ah! aí fica mais fácil ! Joga pimenta moída com torrado no salão e espere o pisa-pisa fazer a mistura de tudo no ar; os olhos começam a arder e lagrimejas, a garganta aperta e espirro pra todo os lados. O ár está apimentado e com cheiro forte de torrado. Bau! bau! Festa! Tem que se lavar o salão se quiser continuar..

- Genial !!! Dinda você é genial! Funciona mesmo ?

- Batata !

- Vou providenciar a pimenta, um kilo ? dois ?

- Espere aí rapaz, você vai fazer o que pensei ?

- Com certeza Dinda !

- Aqui tem moedor de Café ? Serve não serve?

- Sim! vou trazer mais um ou dois e gente para ajudar.


Roberto saiu dalí, com aquele seu andar peculiar, apressadinho, próprio dele, quando estava em providências. Não foi duas horas e Ele estava de volta com dois baldes de pimenta e acompanhado dos inseparáveis amigos Aristeu, José Aires, Aderson Garrinha, Claudinho de Mário e logo logo estavam com vários pacotes de pimenta moída, em tamanhos próprios para serem carregados nos bolsos das calças e dos paletós. Chamou para o quintal os companheiros e traçaram o plano de como iriam atacar o baile da vitória do prefeito arenista. Voltaram para casa e a noite, por volta das 9 horas voltaram para vê Dinda e pegar a pimenta moída.

A festa começou entre 21 e 22 horas, no salão da prefeitura Municipal. Era (um baile animado pelo conjunto de Tonho de Rafael (saxofonista) e Mariano, guitarrista), Afonso de Seo Anjo na Bateria, entre outros. Duas horas depois de iniciada a festa, Roberto e sua turma se dividiram em dois grupos de dois, combinando que o segundo grupo entraria um três minutos, sincronizados, após o primeiro. Como não havia portaria controlada, apenas segurança para uma mera formalidade; eles entraram, passaram cerca de 10 minutos e saíram todos juntos. O fato chamou atenção de Zé Bolinha, que ao vê o grupo saindo, indagou com Tonho do velho Balduíno:

- Não to gostando disso aí. Apontando para os rapazes que já desciam a calçada.

- Acho que só vieram dar uma espiadinha na festa ! Vê se ta animada?

- É bom dar uma olhada por aí! Vai vê o quadro de luz, se não tem uma vela acessa pra provocas curto! Eu vou aos banheiros!

- E é ome !

Antes mesmo que o conjunto parasse a seqüência de músicas que tocava e Zé Bolinha encontrasse algum indício de sabotagem, Mariano reclamou com João do Fino, que passava por perto, que estava sentindo a garganta.

- Seo João, pede pra trazer uma água aqui, mas sem gelo, minha garganta ta em brasa.

- É de tanto tocar meu filho!
Tonho tirou o sax da boca e disse a Mariano:

- Parece que o ar está apimentado, meus olhos estão começando a ardes...

No salão começou uma seqüência de espirros e a coisa, em menos de 10 minutos, foi se configurando como Dinda havia previsto. Roberto e os seus companheiros, que observava tudo do coreto da praça; viram quando alguns convidados saíram para tomar ar e não paravam de expirrar... Eles viram que era hora de deixar o posto de observação, pois tinham certeza de Dinda sabia o que tinha dito. A festa estava fadada ao fracasso.

Naquele instante, Mariano velho de guerra tira a guitarra do pescoço e fala ao microfone, em alto e bom som:

- Jogaram pimenta com torrado no salão.!

- Então é isso ? Fomos sabotados!

Gritou o velho Odilon, fiscal da prefeitura, seguido de um falatório geral. Revolta, risos e deboches dos que não acreditavam no que estava acontecendo.

- Mas quem teria tamanha ousadia?

- Os meninos que entraram aqui ! Sim! Só pode ter sido eles, um deles era o neto do Major; o major deve ter mandado sabotar nossa festa.

- Eu não disse Tonho ! Eu não disse que aqueles tinham vindo aqui para aprontar!

- Não e que cê tinha razão Zé.

- Dor de “cutuvelo” dos derrotados da Arena 2, dor de “cutuvelo”, inconformismo!

- Providenciem lavar o piso, urgente, urgente! vamos lavar o piso! Não vamos deixar que acabem com nossa festa.

- Lavar a prefeitura a essa hora da noite!!!

- Ainda bem que não é pó-de-mico!

- E ninguém fez nada João?

- Quem podia imaginar Seo Anjo! Não ví nenhuma atitude suspeita.

- Só a presença deles aqui já era motivo de sobra e grande suspeita, eu tinha desconfiado.

O povo saída para o jardim em frente a prefeitura, alguns iam até as torneiras de aguar das plantas e lavavam o rosto, os olhos. A festa tinha ido para o espaço, mesmo assim chamaram Bentiví e Seo Joel, o velho jardineiro e pediram para acionar a equipe de limpeza para lavar rápido o salão principal de prefeitura, pois a festa tinha que continuar. Aceitar a paralisação era uma derrota na alegria dos eleitores e algo que ficaria marcado, como ficou, na história da posse do Prefeito.

- Onde já se viu tamanha ousadia, seria cômico se não fossemos as vítimas, o que torna o fato lamentável e inadmissível.

- O leite já foi derramado Seo Joel, agora só resta limpar! ...

Falavam os dois enquanto coordenava o trabalho.

Muitos convidados foram para casa, perderam o tesão da festa, outros se espalharam pela praça, se distraíam no jardim em frente a prefeitura; outros, foram para beira do rio, de onde vinha o som de um violão. Se havia uma coisa que a política não conseguiu rotular em Correntina era enterro e serenata.

Fosse quem fosse o finado ou o cantor da noite; lá estavam pobres e ricos, brancos e pretos, unidos como se fossem natal!

Cano, desde muito é o seresteiro predileto da cidade, sem dúvida a patativa do lugar. Não é atoa que da união acabaram gerando o mais talentoso cantos do centro oeste do Brasil; Laércio Correntina, que nos surpreendeu em aceitar o nome de batismo que o público lhe deu.

Salão limpo, músicos a postos... a festa tinha perdido o tesão e no outro dia era o assunto prediletos dos partidários da Arena 1 e Arena 2. Uns inconformados, outros rindo atoa e parabenizando Roberto neto de Major Felix pelo seu grande feito.

FINAL:
RUMÃOZINHO NA TORRE DA IGREJA

Flamarion Costa
Enviado por Flamarion Costa em 02/07/2009
Reeditado em 13/04/2013
Código do texto: T1679384
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