Eu como é dois
Meu compadre “Manezin Caolho”, contou que lá no interior do Pernambuco, onde ele morava, tinha um casal tão pobre, mas tão pobre, que há vários dias não tinham nada para comer. Foi quando acharam um ninho de galinha com três ovos. Cozinharam os ovos e aí começou a desavença:
- Eu como dois ovos e você come um – disse o homem – pois eu sou maior do que você.
- Não senhor, eu como dois, pois estou grávida e tenho que comer por dois – justificou a mulher.
- Não, você come um e eu como dois, pois sou eu que tenho que sair para trabalhar e conseguir mais comida.
E nesse impasse, começaram uma discussão e ela já debilitada pela fome desmaiou. Passaram-se algumas horas sem que ela se reanimasse. O homem sentindo-se o mais monstruoso dos maridos deu-a como morta e reuniu os parentes e vizinhos para o velório. A casa lotou de gente. Porém, lá pelas tantas da noite, a mulher já com a alma recomendada para o outro mundo, resolveu voltar e retomar a discussão interrompida. E assim que abriu os olhos, sentou no caixão e gritou:
- Eu como é dois!
Debandada geral!!! Depois de alguns quilômetros de correria ininterrupta, seu Zé Furreca, lembrou que no velório tinha um rapazinho que nascera sem os pés e era mudo de nascença o infeliz. Na hora do susto, todos saíram correndo e esqueceram-se do coitado. Triste sina, pois, para se locomover tinha que ser pelas mãos dos outros. E no meio da multidão correndo desenfreada mente o coração generoso do seu Zé Furreca não suportou o remorso de deixar para trás aquela criatura indefesa. De repente parou a multidão e gritou:
- Parem, parem todos!!! Esquecemos o rapazinho, temos que voltar para pegá-lo.
- Quando alguém utilizando apenas as mãos passou correndo a sua frente, quase sem fôlego e disse:
- É ruim hein, eu estou aqui não está vendo?
Joana Aranha