O Caso do Senhor Sabe Com Quem Está Falando?

Não podemos ser justos se não formos humanos

Luc de Clapiers Vauvenarques

I

Um colega aposentado a quem encontrei numa das Secretarias de Belo Horizonte relatou-me a história que vai abaixo e me afiançou que com toda a certeza a mesma houvera se passado com ele.

Não duvidei!

Porém, devo registrar que já ouvi o mesmíssimo caso sendo contado por outras pessoas. E que pelo menos dois outros servidores afirmaram igualmente terem sido eles o personagem principal da referida façanha.

Mas vamos ao caso que é o que realmente interessa!

II

Segundo aquele nosso colega, ele havia começado recentemente a trabalhar nos Serviços Gerais. Naquela época essa Diretoria era a responsável por efetuar os consertos e a troca de peças vencidas ou defeituosas numa grande variedade de máquinas e aparelhos do Tribunal.

Dentre as primeiras, destacaram-se as antigas e eficientes máquinas de datilografia que por tantos anos tão bem serviram aos interesses e à finalidade da Justiça do Trabalho.

Certo dia, entretanto, o chefe daquele setor convocou os seus poucos funcionários para informá-los que a partir de então estavam proibidos de proceder à troca de fitas usadas nas máquinas de escrever dos servidores, estivessem esses lotados nas Secretarias das Juntas de Conciliação e Julgamento ou nas demais Diretorias do Tribunal.

Segundo lhes dissera a chefia, se algum funcionário telefonasse solicitando que alguém do setor se deslocasse para efetuar a troca das referidas fitas, era para se negarem terminantemente.

Deveriam então informar que o setor dispunha atualmente de pouquíssimos servidores, o que inviabilizava aquele tipo de atendimento “in loco”. Deviam explicar ainda que a partir daquela data as próprias Secretarias das Juntas de Conciliação e Julgamento se tornavam responsáveis por aquele serviço e que se fazia necessário treinar e capacitar alguns dos seus servidores para aquela finalidade.

III

Pois bem: o elemento complicador dessa história foi que - passados alguns dias - eis que ninguém menos que o próprio Presidente do Tribunal entra em contato telefônico nos Serviços Gerais solicitando a troca de uma fita usada em seu gabinete de trabalho.

Entretanto - como ele não se fizera claramente anunciar ao servidor que o atendera - aquilo gerou o seguinte diálogo:

- Alô. Serviços Gerais, bom dia!

- Bom dia! Quer me fazer a gentileza de mandar alguém na minha sala para trocar a fita da minha máquina de escrever? Peça para vir rápido, pois tenho certa urgência!

- Bem – respondeu-lhe o funcionário com toda a calma e tranqüilidade desse mundo - isso será impossível, meu senhor! A partir de agora os servidores de cada setor do Tribunal devem ser e estar capacitados a procederem à troca das fitas em suas maquinas de escrever. Estamos em época de vacas magras, meu amigo, e não vai ter jeito de alguém se deslocar até ai pra fazer esse serviço! É bom que vocês comecem a se virar sozinhos, senão...

- Por acaso – cortou-lhe o Presidente bastante irritado com tamanha falta de respeito e consideração – sabe você por acaso com quem está falando?

- Não! E com quem haveria de ser, pergunta-lhe o funcionário.

- Com o Juiz Fulano de Tal, Presidente deste Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região!

- E o Senhor, Presidente – devolveu-lhe imediatamente o servidor – sabe o Senhor também com quem está falando?

- Claro que não...

- Ainda bem...! – respondeu o servidor

E desligou imediatamente o telefone.