BRIGA COM LOBISOMEM
BRIGA COM LOBISOMEM
Foi lá para os lados da Bandeira. Esperava-me uma leitoinha assada no forno de barro, mais uma cachaça do alambique. Purinha. Muito delicado o casal anfitrião. Acolhedora a casinha modesta. Levei uma caixa de cervejas para ajudar nas despesas. Festa familiar. Apenas oito pessoas. um tutuzinho de feijão de lamber os beiços. Torresmo, ovo caipira e couve fininha. Melhor que o Fazano e o Mássimo juntos. O bule de café no fogão de lenha, perfumando. Broa de fubá. Doces de figo, abóbora e leite. E a gente ali falando coisas. Êta gente sabida!
E as horas foram passando. Mais um golinho da “marvada” e uma geladinha por cima. Olhei no relógio. Tava na hora de voltar. Antes, outro gole. O penúltimo. Levantei-me para despedir. Dona Zefa pôs-se à minha frente:
- O senhor dorme aqui hoje.
- Bem que eu gostaria. Mas tenho que levantar cedo amanhã. Tenho audiência.
Ela, em tom decisivo:
- Não! O senhor dorme aqui!
Estranhei a ordem.
- Por que, dona Zefa?
- É quaresma. Tempo de lobisomem. E hoje é lua cheia. Sexta-feira. Eles estão por aí.
Arrepiei.
- Mas a senhora já viu algum?
- Tem um que mora prestas bandas. Até é gente boa quando é homem. Mas, na quaresma...
- Ta brincando?
Não senhor. Todo mundo aqui conhece o Adriano. Ele vira bicho. Até os cachorros sabem. Quando ele passa, é aquela latição atrás dele.
Tomei mais um gole. Também o penúltimo. Mais uma cervejinha. Desceu redonda a danada. Levantei-me para despedir. Senti que não estava apto para dirigir. Resolvi aceitar o pouso. Acordo com barulho na janela. Levanto-me com dificuldade. A lua ilumina a cara horrenda do monstro que força a entrada. E eu sem nenhuma bala de prata. Mesmo que tivesse, não tinha o revólver. To ferrado! A mão peluda já dentro do cômodo. Rezo. Lembro da medalha de prata, pendurada no chaveiro, com a imagem de Santo Antônio. Presente da mãe. Pego a relíquia e atiro com violência na cara do maldito. Foi a salvação. Ele dá um urro. Sai correndo. Embrenha-se na mata.
Acordo com gosto de cabo de guarda-chuva na boca. No ar, aquele cheiro de café de coador.
- Bom dia, dona Zefa!
- Bom dia, doutor! Dormiu bem?
- Que nada! Briguei com o lobisomem.
- Deixa disso, doutor! Eu estava brincando. Só queria que o senhor não fosse embora depois de ter acabado com o garrafão. Lobisomem não existe.
- E o Adriano?
- Esse é amigo da gente. Tem apelido de lobisomem, mas é gente boa. O senhor vai conhecer. Ele ta chegando pro café. Olha ele ali!
Olhei para o homem. Na sua face, uma marca de queimadura. Igual à imagem de Santo Antônio.