Ayrton Senna Por um Dia
Marquinho gostava de esportes, como qualquer um. Nem tinha uma paixão especial por alguma modalidade, mas gostava particularmente de um atleta: Ayrton Senna. O grande ídolo do automobilismo também mexia com a imaginação do pacato Marquinho; carioca, sangue bom, o meu “chegado” nunca imaginou mesmo é que na sua vida ainda seria Ayrton Senna por um dia. Ou pelo menos por alguns minutos!
Não se tratava desses famosos shows televisivos de makeover, que propiciam aos telespectadores a chance de serem estrelas por um dia. Tudo se passou na vida real. O meu “chegado” tinha acabado de desembarcar na Flórida. É moreno, baixo e, pode-se dizer, um pouco gordinho. Entrou em um supermercado, um pouco por curiosidade. É aquela coisa de sempre, não é? Tudo é novidade quando se chega aqui e até ir ao supermercado e tomar ônibus é excitante para quem vem batalhar na terra do Tio Sam. Marquinho logo entrou no supermercado e, sem dificuldades, encheu o carrinho. A confusão começou no caixa.
Ele, fã do Senna, tinha adquirido no Brasil um cartão de crédito de afinidades, daqueles que trazem estampados o emblema do seu time, a foto do seu ídolo, ou aquela ‘gostosona’ da novela. No caso dele era a foto do Ayrton. Na hora de pagar a conta a funcionária do caixa, com cara nada amigável, apontou o cartão e tascou a pergunta: Is that you?
Marquinho encheu a boca e respondeu, sem medo e quase com orgulho: -Yes! O orgulho era por poder estar se comunicando em inglês, afinal a gente, sempre que aprende um pouquinho de inglês no Brasil, chega aqui querendo desatar o nó da língua.
Mas a reação da “caixa” foi estranha. Ela olhou para o cartão, olhou para o Marquinho, e perguntou outra vez, até quase incrédula: Is that you?!
Yes! Respondeu com firmeza Marquinho, sem entender a dúvida. Quantas vezes ele teria que responder para aquela “caixa” estúpida que aquele cartão era dele sim. Ora, se não fosse dele porque ele estaria ali, pagando suas compras com ele. Americano é tão estúpido! Pensou, consigo.
Mais um minuto de exame detalhado do cartão e a funcionária do supermercado resolveu chamar o gerente. Marquinho já estava até irritado, assim como as várias pessoas atrás dele, na fila, assistindo à cena patética.
O gerente, outro cara meio desconfiado, repetiu o gesto da funcionária, perguntando após olhar o cartão e olhar o Marquinho: Is that you!?!?! – Yes!!! Disse Marquinho, outra vez, entre preocupado e envergonhado. Ele estava quase começando a acreditar que aquele cartão não era dele não, tamanha era a pressão. Mas a confusão só conseguiu piorar com a chegada da polícia, que foi acionada pelo supermercado. Diante dos policiais a pergunta foi repetida e a resposta, já não tão segura de Marquinho, continuava a mesma. De turista/consumidor, Marquinho passou a potencial criminoso em alguns minutos e estava para ser levado pelos policiais quando um curioso, que passava por perto, resolveu se inteirar da situação. Entre nervoso e acuado, Marquinho conseguiu perceber que o curioso era brasileiro também e explicou a situação para ele. De potencial criminoso, nervoso e acuado, Marquinho passou a indignado e possesso de raiva quando viu o compatriota começando a gargalhar da sua situação. - Ora bolas! - pensava ele. Se não ajuda, também não humilhe o compatriota! Falava para si mesmo, enquanto o curioso tentava achar uma brecha entre uma gargalhada e outra para explicar aos policiais o que estava acontecendo. Não passava de um engano. Marquinho, na sua ânsia de praticar seu inglês, só conseguiu se enrolar ao confirmar para o caixa que era ele a pessoa do cartão. E então “caiu a ficha” no Marquinho; a funcionária “esperta” achou que a foto no cartão, a do Senna, era de identificação do portador do cartão. E Marquinho nunca mais esqueceu esse dia; o dia em que ele, baixinho, moreno e gordinho, foi confundido com o Ayrton Senna. E o dia em que o piloto deve ter se retorcido no túmulo de tanto rir!
Is that You? = Esse é você?
Is that yours? = Isso é seu?