Um caipira de “corage”
No interiorzão desse mundo de meu Deus vivia Sebastião, um lavrador que era conhecido por Tião Corage porque era covarde como ele só. Para voltar do lugarejo até seu rancho, Tião teria que passar por dentro do cemitério sem muro, ao léu, justamente no meio do caminho, ou optava por gastar um tempo dobrado, indo por outra estrada. Era este o caminho sempre escolhido por Tião Corage, claro.
Certo dia, louco de vontade de chegar em casa, depois de ter gasto quase tudo com o dinheiro que recebeu da venda dos milhos que colheu, ensopado de suor e muito cansado, pensou: ora sô, hoje vou pelo cemitero, tô muído de tanto trabáio!
E foi. De longe ia “imaginano” a travessia, enquanto as pernas já iam dando sinal de tremedeira. Mal se aproximou do cemitério, quando viu que densas, negras e baixas nuvens cobriram a lua e a noite virou um breu só. As pernas de Tião tremiam como vara verde. E nessas horas coruja pia, morcego voa, sombra assusta e a gente vê coisa que não existe.. Tião só tinha um pensamento: chegar ao rancho e ir no “quartinho” para se esvaziar. De repente, sentiu uma presença ao seu lado, o matulão afroxou no braço. Alguém lhe tocou o ombro e disse:
- Tá cum medo, Tião Corage?
Gaguejando e quase se esvaziando ali mesmo, Tião respondeu:
- tô não, môço e prumode que devia di tá? Intonce ocê nun sabe qui hôme anssim cuma eu topa carquer parada?
- Mió anssim, -disse o companheiro- pruquê quando eu tava vivo murria de medo de passá aqui ...
Sebo nas canela, pensou Tião e correu tanto que, ao chegar ao rancho, o cumpade Zé das Trouxas , que estava sentado em um tronco, no terreiro da casa, perguntou:
-Ô cumpade, viu mula sem cabeça?
- Vi não, vim correno pruquê quero botá os barde nas gotêra pra mode juntá água da chuva.
- Qui chuva, cumpade? Faiz tempão nun chove puraqui... Inté trêis bode docê morreu...
- É... mai quano chuvê, os barde taí nos lugá, né mermo?
Tião Corage até se esqueceu que precisava ir ao quartinho...
:
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Versos da canção de Xico Bizerra:
matuto eu conheço pelo ajeitado do chapéu
matuto eu conheço pelo carregar do matulão
matuto eu conheço pelo olho que olha pro céu
matuto eu conheço pela pisada do pé no chão
pela fé que ele tem em nosso senhor
pela paz bem guardada no seu coração
pela crença incontida que tem no amor
pelo jeito tão sincero de apertar a mão
matuto eu conheço pelo caminho que estradou
matuto eu conheço quando escuta um baião
matuto eu conheço quando canta o fogo-pagou
matuto eu conheço pelo amor que tem pelo sertão
(Matuto)
No interiorzão desse mundo de meu Deus vivia Sebastião, um lavrador que era conhecido por Tião Corage porque era covarde como ele só. Para voltar do lugarejo até seu rancho, Tião teria que passar por dentro do cemitério sem muro, ao léu, justamente no meio do caminho, ou optava por gastar um tempo dobrado, indo por outra estrada. Era este o caminho sempre escolhido por Tião Corage, claro.
Certo dia, louco de vontade de chegar em casa, depois de ter gasto quase tudo com o dinheiro que recebeu da venda dos milhos que colheu, ensopado de suor e muito cansado, pensou: ora sô, hoje vou pelo cemitero, tô muído de tanto trabáio!
E foi. De longe ia “imaginano” a travessia, enquanto as pernas já iam dando sinal de tremedeira. Mal se aproximou do cemitério, quando viu que densas, negras e baixas nuvens cobriram a lua e a noite virou um breu só. As pernas de Tião tremiam como vara verde. E nessas horas coruja pia, morcego voa, sombra assusta e a gente vê coisa que não existe.. Tião só tinha um pensamento: chegar ao rancho e ir no “quartinho” para se esvaziar. De repente, sentiu uma presença ao seu lado, o matulão afroxou no braço. Alguém lhe tocou o ombro e disse:
- Tá cum medo, Tião Corage?
Gaguejando e quase se esvaziando ali mesmo, Tião respondeu:
- tô não, môço e prumode que devia di tá? Intonce ocê nun sabe qui hôme anssim cuma eu topa carquer parada?
- Mió anssim, -disse o companheiro- pruquê quando eu tava vivo murria de medo de passá aqui ...
Sebo nas canela, pensou Tião e correu tanto que, ao chegar ao rancho, o cumpade Zé das Trouxas , que estava sentado em um tronco, no terreiro da casa, perguntou:
-Ô cumpade, viu mula sem cabeça?
- Vi não, vim correno pruquê quero botá os barde nas gotêra pra mode juntá água da chuva.
- Qui chuva, cumpade? Faiz tempão nun chove puraqui... Inté trêis bode docê morreu...
- É... mai quano chuvê, os barde taí nos lugá, né mermo?
Tião Corage até se esqueceu que precisava ir ao quartinho...
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Versos da canção de Xico Bizerra:
matuto eu conheço pelo ajeitado do chapéu
matuto eu conheço pelo carregar do matulão
matuto eu conheço pelo olho que olha pro céu
matuto eu conheço pela pisada do pé no chão
pela fé que ele tem em nosso senhor
pela paz bem guardada no seu coração
pela crença incontida que tem no amor
pelo jeito tão sincero de apertar a mão
matuto eu conheço pelo caminho que estradou
matuto eu conheço quando escuta um baião
matuto eu conheço quando canta o fogo-pagou
matuto eu conheço pelo amor que tem pelo sertão
(Matuto)