Uns Dias...
Para Caiul Harim Pereira, meu pequeno filhote lindo.
- Eu estou com uma vontade de comer queijo. Eu disse para meu pai, enquanto andávamos por uma rua que não me lembro do nome no momento. Talvez fosse a Avenida Padre Arlindo Vieira, Ipiranga, Jardim Clímax, Zona Sul da Cidade de São Paulo. Sinceramente não sei se era esta avenida. Eu sabia muito bem que ele não tinha dinheiro para comprar o bendito queijo, por isso que só fiz o comentário sem mais sem menos como quem não quer nada. Não estava pensando numa indireta daquelas que dão vasões para os pensamentos do receptor fazer colocações próprias em seu íntimo. Acho que nesta parte, olhando por um prisma mais maduro, fui um tanto ingênuo.
Meu pai não respondeu e não disse nada a respeito naquele momento. Continuou andando e até fez outro comentário que não tinha nada a ver com aquele que eu tinha feito.
Ele é do tipo durão que não gosta de chorar ou ficar demonstrando fraquezas ou sentimentos e eu o acho forte por isso, porque ele é racional e age com sabedoria e justiça mesmo nas advercidades. O humor dele é constante, pois nunca se demonstra abalado por nada. Até quando o motivo é enfermidade, ele está sempre com os pés no chão. Ele é uma pessoa que posso chamar de equânime. Esta é uma das razões por que eu o admiro.
À tarde ele chegou com mussarela fresquinha e pão e pôs num lugar que eu pudesse ver logo de cara - em cima da mesa.
- O que é isso pai? Lhe perguntei num tom um tanto curioso demais, porque eu sabia que ele não tinha dinheiro para certas mordomias ou para meu caprichos.
- Você num tava com com vontade de comer queijo? Ele respondeu com outra pergunta.
- Estava. Mas e daí? O pai está sem dinheiro!
- Que bobeira. Não esquenta a cabeça com isto. Dinheiro é para se gastar mesmo.
Ele não me disse que me amava com palavras. Disse que me amava com atitude. A ação dele foi indefinível para mim naquele instante. Eu era um simples rapaz ingênuo que queria mussarela e que meu pai, por ser um mecânico de ponta na metalúrgica onde trabalhou mais de dez anos, queria agradar. Nem pensei se ele tinha ou não passado no cartão de crédito ou se tinha tirado alguma economia de algum dos bolsos de seus paletós. Aquilo não importava. A mussarela estava lá e eu ia desgustá-la, simplesmente.
O tempo passou...
Depois de um bom tempo que eu já tinha este menino lindo por nome de Caiul Harim Pereira que eu fui me lembrar daquele dia que meu pai comprou a mussarela para mim. Fiz reflexões básicas certo dia, mas nada com a minúcia e a ternura que o fato realmente merece.
O Caiul tinha me pedido um dvd vários dias pregressos e eu não tinha dinheiro para comprar o bendito dvd que ele tanto almejava. Ora, pobre não compra dvd original nem a pau! E eu vivia aparencendo com uns dvds piratas lá em casa justamente por causa da minha situação financeira. Claro que os dvds não tinham uma qualidade péssima como os dvds do centro de São Paulo, porque eram muito bem prençados. E
minha mulher vivia reclamando, fazia cara feia e ficava de mau humor, pois eu não a deixava assistir tv com sua mãe.
No outro dia quando cheguei em casa com o dvd do Pica-Pau que meu filho tinha me pedido nas vésperas, minha mulher fez cara de poucos amigos, porque agora o motivo era: a falta de mistura em casa, as contas de água e luz e um monte de outras pequenas contas que nós deveríamos pagar. Mas o Caiul pulou em cima dos meus braços com o sorriso ledo que chegava nas orelhas, todo eufórico, quase me derrubando:
- O papai comprou o dvd do Pica-Pau pra mim? Brigado papai. Eu te amo papaizinho lindo! (Acredite quem quiser: ele tem apenas quatro anos e meio e muitas vezes fala assim mesmo).
E ele não parava de falar em nenhum momento, tal era sua felicidade; e a alegria dele me contagiou assaz que eu me emocionei por dentro e tive que conter as lágrimas áticas. Não era só o Caiul Harim eufórico de todos os dias que eu via à minha frente. Parecia ser uma felicidade fora do comum. Uma felicidade que me ensinava... a ser simples e amoroso, compreensivo e justo.
Então eu me lembrei do dia em que meu pai comprou a tal mussarela para mim e pensei: Era isso que meu pai queria que eu sentisse algum dia? Era isso que ele queria sentir naquele momento e me ensinar? E eu viajei naquele passado que tornou-se tão perto no átimo. Agora eu via com toda clareza do mundo que, além de meu pai querer me ensinar estava demonstrando que me amava nas pequenas coisas da vida e que ver um filho feliz não tem preço para um pai.
Eu te amo filhote.