O CASO INCRÍVEL DA PRISÃO DE UM JUDAS ( Celismando Sodré-Mandinho)

A PRISÃO DO JUDAS

( Celismando Sodré - Mandinho)

Este caso aconteceu em nossa cidade, Barra do Mendes. Era final dos anos setenta, a Ditadura Militar estava em pleno processo de transição “lenta, gradual e irrestrita”; só que a democratização era muito mais intensa nos grandes centros urbanos, como: Rio, São Paulo, Salvador, etc. Aqui, na nossa pequena cidade, a ditadura ainda exercia controle absoluto, tanto que as eleições eram disputadas entre a ARENA 1 e a ARENA 2, que era o partido do governo militar que se dividia para disputar as eleições, mantendo tudo sob o controle dos militares.

Com a Anistia, veio a reforma partidária em 1979, o governo implantou o pluripartidarismo, surgindo, assim o PMDB, PT, PDT e o PDS, descendente da antiga ARENA, e que dava apoio ao governo; era o partido do prefeito de Barra do Mendes da época.

Há uma tradição religiosa, influenciada pelo catolicismo, de se fazer na noite de sexta-feira santa para sábado de aleluia, o Judas__ que representa o traidor de Cristo e que deve ser punido. Consiste num boneco de pano que é preenchido com palha, papel, amarrado no topo de um mastro e colocado no meio de uma praça ou rua para ser queimado. O mesmo pessoal que havia fundado o MDB, que agora estavam no PMDB, começaram a tramar uma idéia para protestar contra o governo do prefeito da época, e para “encher o saco” do pessoal que ainda defendiam a ditadura em nossa cidade. Era aquela eterna ânsia da juventude em chocar os mais tradicionalistas. Afinal, “somos incendiários na juventude e bombeiros na velhice”.

Com o plano em ação, eles fizeram o Judas à meia-noite para ninguém ver e colocaram este, vestido com a camisa do prefeito e com a sigla do PDS estampada no peito do Judas, colocando-o bem no meio da praça principal da cidade. Quando amanheceu, foi aquele maior reboliço. Todo mundo que passava e olhava para o tal Judas do PDS, ficava espantado com ousadia e a petulância dos que tinham cometido tamanho desrespeito e desprezo com o partido do Governo da ditadura. E a notícia começou a se espalhar, “dizem que foi os comunistas do PMDB” afirmava o Sr: Antônio Rocha, fiscal da praça. O comentário estava em todo canto.

De repente, a praça já com muita gente para ver a novidade, chega o motorista da Caçamba, para derrubar o Judas com seu veículo de trabalho. A turma pequena, mas, aguerrida do PMDB, cercou o poste onde estava o traidor com a camisa de PDS, alguns gritavam: “No Judas ninguém mexe, só se passar por cima da gente”, e foi tanto choro, gritaria de avó e mãe clamando e rezando, os pais querendo recolher seus filhos rebeldes, o motorista querendo derrubar o Judas, os jovens protestando para que isso não acontecesse.

De repente, chegam os policiais, com o delegado a frente que imediatamente dá a ordem de prisão: “negócio é o seguinte...o Judas está preso por desacato as autoridades e por perturbar a ordem!!” Leva, não leva, e o tumulto foi geral. O delegado ameaçou logo “baixar o pau” em quem interferisse em sua prisão, o Judas finalmente foi preso e passou a noite da delegacia. No outro dia, um dos subversivos, segundo a opinião do prefeito, afirmou: “Se era pra ‘encher o saco’ e causar tumulto, nós conseguimos” e foram para o Bar de Dó, comemorar o feito. O coitado do Judas, se é que podemos dizer assim, passou à noite preso na delegacia, já sem a camisa do PDS. Dizem que apanhou muito. Depois encontraram apenas as cinzas do réu inconfesso, perto da delegacia.

MANDINHO
Enviado por MANDINHO em 13/03/2009
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