O HOMEM E SEUS VELHOS SAPATOS

Lá vinha seu moço andando pelas calçadas inertes daquela cidade agitada. Fazia calor, tempo nublado, seu cérebro cozinhava.

Andava conversando com tico e teco (seus neurônios) sobre as tais das contas que devia, o quanto de dinheiro tinha e sobre aquele almoço horrível que sua mulher lhe fazia.

Pensava, falava e caminhava com pressa, o banco, a casa lotérica (tem que se ter uma fezinha, né?), supermercado, tudo lhe esperava.

Careca, passava as mãos na cabeça e agia como se ainda possuísse cabelos, jogando os fios invisíveis para trás. Era automático. De repente. tropeça e cai como um não sei o que no chão. Que judiação !

Seu moço levanta, ardido de raiva, soca a árvore e machuca a mão. Chuta o poste e dói o pé. Tira os sapatos, dedo sangra. Sendo assim, pega e lança-os no ar, com toda sua força e raiva desmedida desta vida besta de só contas a pagar e mulher feia a lhe cobrar.

Céus, meus sapatos!!!!!, grita o moço. E os calçados, se entrelaçam nos cadarços e se amam sobre os fios.

Todos na praça param para assistir aquela cena. O homem, coitado, senta em um banco e chora. Chora por tudo, pela vida dura, pelo pé doído, pelos sapatos.

Chega fotógrafo e clica esta imagem, homem esconde rosto. Noutro dia, manchete no jornal da cidade : - “Homem chora pelos seus sapatos”.

Acabou a estória ? Não. Homem virou garoto-propaganda de uma marca famosa de calçados e agora não tem mais os problemas que tinha.

Moral da estória : - Nem sempre o que perdemos, era de boa serventia. Às vezes dá certo, lançarmos no vácuo, velhas tralhas que não nos servem mais.

OBS : Se virem um homem careca fazendo propaganda de calçados de uma griffe famosa, tenham certeza : é ele o homem dos sapatos no fio.

27/02/2005