Que veneno foi esse?
A mulher alta, magra, espreguiçou-se, esticou-se sentada à frente do computador, enquanto aguardava a execução de um comando. Tanto fez, que acabou caindo para trás. Nunca ouvira falar que cadeira giratória pudesse cair , pensava, enquanto tentava levantar-se. Do chão via a tábua de apoio ao teclado caída num canto, o teclado , rente aos pés, o mouse, dependurado, ainda balançando, a cadeira, tombada. Não se machucara, mas também não se esforçou muito para levantar-se; recostou-se um pouco e dormiu de cansada ali mesmo, de pés para cima, apoiados na cadeira ainda virada.
Chegou o marido, homem baixo e gordinho, muito apaixonado e zeloso de sua prenda:
_ Ritinha, Ritinha! Ó, meu Deus! Ritinha, fale comigo, o que é que aconteceu aqui?
A mulher, sonolenta, tranqüilizou o marido, concluindo que não fora nada grave.
_ Deite-se só um pouquinho aqui comigo, João; depois a gente levanta e arruma tudo.
O João fez uma ginástica para abaixar-se e repousar a cabeça no peito da mulher. Estava ele também muito cansado; ia ficar só um pouquinho; fizeram silêncio e dormiram os dois, ela, ainda de pés para cima, ele, com os dele, encolhidos, nádegas um pouco erguidas.
Chegou a irmã da mulher que os visitava naqueles dias e voltava das compras com a chave emprestada, para não ficar do lado de fora, caso eles não estivessem.
_ Sabe, Ritinha, que o comércio daqui é melhor... João... Ritinha... aí meu Deus, eles quebraram o pau aqui e depois tomaram veneno! Não é possível! Ritinha! João!
O João foi o primeiro a despertar e correu, envergonhado, para o banheiro; Ritinha, bem descansada, na dela, ergueu-se e pôs-se a consertar o estrago.
_ Sabe, Zenaide, que essas cadeiras são uma porcaria?
Zenaide pegou as compras e achou melhor ir para o seu quarto:
_ Vai entender esses dois!