Mais "Tio Domiro"

Mais "Tio Domiro"...

O perdigueiro

Dizem que quase tão importante na vida de Tio Domiro, quanto o picassinho, era um seu cachorro perdigueiro (que como o próprio nome diz era especialista em caçar perdizes) chamado “Rex” . Um dia foram a caça, o cão e seu dono. Como sabem, em casos tais, o cachorro fareja a perdiz, a localiza e a faz levantar um vôo para a morte, visto que o caçador à espreita atira assim que a avista, depois o cão a trás até onde está o caçador. A diferença é que conforme os latidos do “Rex “ o Tio Domiro já sabia a direção e a altura que a perdiz voaria aí ficava fácil. O fato é que localizaram um perdigão daqueles baitas – assim que a ave levantou vôo o caçador já calculou que bastaria aquela pra alimentar toda a família durante o jantar, mirou e pá, buf. Mas azar danado a ave caiu no caudaloso rio amambai. Iria perdê-la. Mas que o quê, assim que viu a cena o bom e velho melhor amigo do homem mergulhou atrás da perdiz. Tio Domiro, apesar de admirar tanta lealdade chegou a temer pelo seu cão, pois naqueles tempos o rio amambai era tão brabo, mais tão brabo que tinha peixe que não tinha coragem de nadar nele (mas essa é outra história). O fato é que cerca de quarenta minutos depois surge o perdigueiro, esbaforido, cansadíssimo, com um baita dum dourado (mais gordo que uma baleia) na boca.

- Bueno. Perdi uma perdiz, mas ganhei um douradão. - resignou-se nosso herói.

Mas surpresas das surpresas, assim que abriu o bitelo pra pôr na panela, na barriga no peixe não estava a perdiz??? É verdade, tão aí os Mascarenhas que não me deixam mentir.

Guaviral

De certa feita Tio Domiro foi com toda a família catar guavira ali pros lados do cerrinho – pra quem não sabe guavira é uma fruta típica da região que nasce em pés rasteiros e para catá-la tem que se abaixar – pois foi catando, catando tanta guavira que de repente quando olhou para cima já estavam em chegando em Ponta Porã – que dista uns cem quilômetros daqui de Amambai.

O Porongo

Tio Domiro sempre foi louco por caçadas. Não admitia que bicho bicho qualquer fosse mais sabido que o bicho homem. Queria porque queria caçar patos pretos as aves mais ariscas que se tem notícia por essas bandas, mais desconfiadas que urubu em dia de vigilância, basta sentir o cheiro, a presença de alguém que pernas ou melhor asas pra que te quero. Pois bem, Tio Domiro pegou um porongo desenhou o seu rosto e soltou na água, na primeira vez que viram aquilo os patos voaram todos, não ficou um pra contar história, da segunda vez voaram quase todos ficaram um ou dois mais confiantes, depois as aves acostumaram com aquilo, viram que o porongo não oferecia perigo. Quê o quê. Bastou a pataiada perder o medo que Tio Domiro se afundou no rio, ficou só com a cabeça de fora, como as aves já estavam acostumadas com o seu rosto nem ligaram. Moleza. Pá, buf, ia pegando os patos, destroncando e pondo no emborná que a janta ia ser boa.

Cavalheiro

Se tinha uma coisa que Tio Domiro não admitia de jeito maneira era que homem maltratasse mulher na sua presença. Fosse quem fosse. Em mulher não se bate nem com uma flor, dizia. Pois um dia estava na fila do Cine Cacique para assistir uma fita do Mazzaroppi (não se sabe porque ele gostava tanto desse personagem) segurando na mão um patacão (aquelas moedas enormes, tipo um piréx, de cobre, que se usava como dinheiro em tempos idos) para pagar a entrada. Atrás dele uma mocinha, frágil, inocente, quando de repente chega um sargentão – naqueles tempos o quartel ainda mandava – pegou a mocinha pelo braço e exigia aos berros que ela voltasse para ele, que não era homem de passar por aquilo, que mulher dele tinha que aprender como eram as coisas, que ia mostrar quem é que mandava ali nas paradas e coisa e tal, a moça coitada resistia como podia, dada a enorme diferença física, dizia apenas que não queria mais o romance. Indignado com a cena Tio Domiro foi falar com o rapagão para deixar a moça em paz, porque aquilo não era coisa que se fazia, pra quê, o enfezado se voltou pro nosso herói e veio pra cima dele este se abaixou e o soco passou no vento, Tio Domiro mirou bem a venta do infeliz e deu uma só uma, bem dada mas tão bem dada que o patacão que ele tinha na mão virou farelo. Forçudo ou não???

Teixerinha

Não é que uma vez chegaram uns gaúchos papudos (com perdão da redundância) na pensão do Tio Domiro ali pros lados da avenida e foram logo dizendo que vinham do sul amado pra trabalhar nessas bandas e que o pensioneiro nem ia acreditar mas conheciam pessoalmente o Teixerinha – famoso cantor da época – tinham até pegado um autógrafo dele. Ouviram na lata. – O Teixerinha ? Pois ele tava aqui na minha pensão mês passado tomando mate comigo, veio me fazer uma visita. Sabe a música "tordilho negro"??? Fui eu que compus.

O campeiro

Tio Domiro tinha uma chacrinha ali pras bandas de Coronel Sapucaia, onde criava um gadinho, coisa pouca, apenas para o consumo pessoal e de sua família coisa de mil e poucas rêses. Pois diz que o Tio Domiro tinha um cachorro campeiro tão bom, mas tão bom, que de manhazinha o animal pegava o ônibus da Queiróz que ia para Coronel Sapucaia, descia na chácara, trabalhava o dia inteiro camperiando o gado e de tardezinha pegava o ônibus de volta e descia perto da pensão para passar a noite ajudando o dono, a guardar o estabelecimento.

O Peixe cego

De outra vez Tio Domiro pescava tranquilamente nas águas do caudaloso rio Amambai, de repente viu um dourado pequitito aí de uns 3 ou quilos, puxando por uma linha de anzol um douradão enorme de umas duas arrobas carém (20 quilos). A explicação: É que o douradão era cego e o peixinho o guiava pra cima e pra baixo do rio para o grandão não se perder.

O relógio

Dessa veizada Tio Domiro tava camperiando o gado no seu famoso cavalo picassinho. No vai-e-vém da lida com o gado jogou o laço pra cima duma rês brava que insistia em não obedecer imaginem, a ordem verbal que Tio Domiro lhe dera de ir se recolher mais cedo, o fato é que ao rebolear o laço pra laçar a vaca, pelas orelhas que esta nem chifre tinha, seu relógio de estimação escapuliu do pulso e foi parar não se sabe onde. Tio Domiro procurou até não poder mais, não conseguiu achar o relógio e deu se por conformado. O fato é que passados mais ou menos uns dez anos daquele episódio, voltou ao mesmo lugar, escutou um tic-tac conhecido e ao olhar num galho de uma árvore próxima achou o bendito. Pra sua surpresa o relógio, que era de dar corda a cada 24 horas, estava marcando a hora certinha, certinha. Ficou abismado aquilo não era possível, quem será que ficou dando corda no relógio esse tempo todo??? Deixou o relógio no mesmíssimo lugar que o achou, se escondeu atrás de uma moita de caraguatá e ficou espiando. De noite quando soprava o vento sul, este batia no galho da árvore que batia no ponteiro do relógio que dava corda e marcava as horas certas. Não teve coragem de levar o relógio embora, iria servir para orientar os sacis, os lobisomens, os bichos do mato que decerto passavam sempre por ali pra se informar a quantas andava o tempo.