Meu avô vereador!
Estamos às vésperas das eleições para prefeito e vereadores, pleito de 2008, e isso me faz lembrar de uma história que sempre ouvi no seio de minha família paterna.
Essa coisa de eleitor pedir favores e bens, móveis ou imóveis, não é coisa nova não!
Nos idos das décadas de 1950 e 1960, meu avô paterno, Francisco de Moraes Lins, mais popularmente conhecido por Chiquinho de Moraes, por várias vezes foi vereador na cidade de União dos Palmares, Alagoas, terra de Zumbi dos Palmares. Se candidatou também a prefeito, porém, não se elegeu.
Apesar de possuir uma boa gleba de terra localizada numa serra que fica nas redondezas de União, Chiquinho não era um homem rico. Toda a produção que conseguia tirar do sítio, só dava para a manutenção da família e dos funcionários. Um pouco que sobrava era vendido na feira livre, revertendo em algum trocado para as despesas, que não eram poucas, pois, chegaram a ser dezoito filhos, imaginem! Até parece que Chiquinho queria começar seu eleitorado ali mesmo, dentro de casa!
A casa da cidade, que normalmente já vivia cheia, em época de campanha eleitoral virava um pandemônio! Meu avô distribuía frutas e verduras, todas colhidas no sítio da família; dava alguns trocados; pagava remédios para uns; oferecia lambedores naturais produzidos por minha avó Regina para aquele monte de crianças que viviam cheias de gogo, tossindo e com aquele catarro verde escorrendo pelas narinas.
Uns pediam dinheiro, outros pediam telhas, tijolos, madeira da mata lá do sítio, e assim Chiquinho ia fazendo a sua campanha. Naquela época a compra de votos era uma coisa muito normal e permitida, porém, Chiquinho nunca foi um “Coronel”, nunca passou por cima de nada nem de ninguém para se eleger! Seus eleitores votavam nele, não só pelos favores e presentes que recebiam, mas, principalmente pelo homem que era; amigo; boa praça, sincero e acima de tudo, honesto! Era um político na verdadeira acepção da palavra. Carismático, conversador, alegre, prestativo. Ele se realizava no meio daquele povão! Ir com ele à feira, viche! Podia contar: duas ou três horas de apertos de mão, pedidos, conversê, rosários e mais rosários de lamentações, e ele ouvia a todos com muita paciência e palavras de otimismo!
Essa conversa de voto consciente, não existia mesmo! O eleitor fazia questão de pedir, fosse o que fosse, qualquer coisa! Ele queria mesmo era tirar vantagem! Muitos que chegavam à cidade em dia de feira, procuravam diversas casa de candidatos para pedir os favores, e também para filar uma bóia, nem que fosse um taco de pão dormido e uma xícara de café. Alguns comiam na casa de um, depois corriam para a casa de outro, comiam, comiam, vomitavam, e iam para outra casa, no intuito de filarem mais uma bóia!
Numa dessas eleições, no dia da votação, chegou um eleitor no finalzinho da tarde à casa de meu avô, dizendo já meio chumbado: Seu Chiquim, me arruma um copo d'água! - Meu avô então gritou lá pra dentro: ô menino, traz aí um copo d'água pra esse moço! - O eleitor tomou vagarosamente a água e depois falou: o sinhô num me arrumava um prato de comida, pois ainda num comi nada hoje? - Ô Regina, faz aí um pratinho com as sobras do almoço e dá aqui pra esse moço! - O homem comeu que se lambuzou e depois perguntou: num tem uma bananinha não? - ô menino, pega ali duas bananas naquele caçuá! - Depois das bananas, barriga quase estourando, o pretenso eleitor sartou mais uma: o sinhô num tem uns trocadinho preu tumá uma caninha ali na venda de seu Dão? - Seu Chiquinho já cansado, vendo que aquele eleitor não iria lhe render voto algum, disse para o homem: olhe meu senhor, o dinheiro que eu tinha, já acabou. Não tenho mais nada, já dei tudo! A comida que o senhor acabou de comer, era parte do almoço de amanhã da minha família! - O eleitor, não satisfeito, querendo a todo custo tirar mais algum proveito daquele candidato, falou: tô andano desde cedo nesse solão de meu Deus, o juízo chega tá frevendo! O sinhô num tem um chapeuzinho pra me arrumá? - Meu avô segurou seu chapéu nas mãos, dizendo ao pidão: já dei roupa velha; sapato usado; o único chapéu que eu tenho é esse velhinho aqui, que é para o meu próprio uso. - o cabra não perdeu tempo; puxou o chapéu das mãos dele, e saiu depressa dizendo: “Séuve!”