Fantasma Moderno
João e Maria viviam na periferia da cidadezinha de nome Mãe Rosa. Município de pouco mais de cinco mil habitantes. Ali viviam pequenos agricultores e criadores de gado leiteiro, entre outras lidas correlatas. O comércio era simples. Poucas casas se destinavam para este fim. Certo dia, Maria que já percebera a situação deplorável das vestes em que o marido andava enfiado. Seu velho já estava com as calças em farrapos, que mal davam para a lida nas roças de mandioca e amendoim. Resolveu comprar para o seu João, uma calça de brim, conhecida por ‘calça jim’, aquelas que os ‘cowboys’ dos filmes usam.
Maria esperava o marido chegar da labuta, com o jantar posto a contento, pois era homem trabalhador e merecia recíproca consideração da esposa que era dedicada. Os dois a mesa fazem uma oração agradecendo as bênçãos; põe-se a comer. Lá pelas tantas a mulher diz: comprei uma calça nova pra você meu velho. As tuas estão tão surradas. – É mesmo! E não custou caro, não? – Que nada. Tu tava precisando mesmo. Assim João mal acabou de jantar e foi logo querendo experimentar a novidade. Maria apresenta a nova aquisição e vai logo dizendo: tu não estranha, mas, é calça moderna que ta se usando agora. Ultimamente nada o interessava, mas aquela ‘calça jeans’ realmente era novidade. Poucos homens tinham uma daquelas na cidade e João ficou contente. Foi até o quarto do casal e embrenhou-se calça adentro. E lá de dentro fala: Tem que fazer a bainha! – Deixa eu ver aonde é que tenho que medir para poder fazer a bainha. Então Maria entra no quarto com a permissão de João. Era um casal de princípios. Não ficavam despidos na frente um do outro sob luz crônica. Tinham certo respeito por serem religiosos fervorosos. Tudo arranjado, João estava com a calça nova em folha. Não via a hora de inaugurar. Amanhã à noite vou até o armazém do Chicão jogar truco e quero ir com ela. - Ta bom! Concorda Maria. Que vê a felicidade nos olhos fundos do marido.
Era sábado, João deixou a roça lá pelas quatro da tarde, nos outros dias da semana fica até às seis horas. Aquela noite estrearia calça nova, para os amigos morrerem de inveja. Maria passou uma camisa ‘volta ao mundo’ que ainda tava na moda, era vermelha com gola branca. João vai sedo para o centro da cidadela, são aproximadamente umas cinco horas. O homem caminha estrada afora, um vento de pouca força tenta desfazer o penteado que levara brilhantina, ia ele esfregando um pente, de chifre de boi, as mãos para manter o penteado no lugar. Assobiava acompanhando alguns pássaros das árvores próximas ao caminho. São menos de mil metros para que atinja o miolo da vila. No que entra no armazém do Chicão, todos notam que João esta numa pinta. Alguns elogios lhes são direcionados. A noite de truco se dá como nas noites de sábado são costumeiros, contudo, João esta mais feliz que nas outras ocasiões, mais perde do que ganha, no entanto aquilo não iria estragar sua noite, teria que ser algo muito assustador para que isso acontecesse. Sua calça moderna fazia uma bela combinação com a camisa e o seu penteado, apenas o sapato estava um pouco em desacordo. Perguntavam onde comprou? quanto custou? Se é confortável? Respondia a todas as questões com muito orgulho do presente que a mulher lhe ofertara. Mas como nos contos de fadas, a noite não dura muito. Lá pelas oito horas aquele povo vai se recolher um pouco mais tarde, não se trabalha no domingo, mas, todos vão a missa e João quer se fazer presente com a novidade, por esta noite já lhe parecia suficiente.
Despediu-se dos amigos e seguiu rumo a sua casa. Depois que deixou a rua principal que atalha o povoado em dois, o homem entra numa rua sem luz elétrica nos postes a iluminação agora era parca, tendo apenas o luzir do reflexo exposto de um sol ocaso, que repercutia na lua, que era cheia e dar-lhe visão do caminho. O vento naquele momento era mais fraco que antes. De repente João precente que esta sendo seguido. Um arrepio percorre a espinha no momento que a adrenalina entra na corrente sanguínea, motivado pelo medo que assola sua mente. Então alonga os passos e nota que, os passos de quem o acompanha também insistem. Agora uma lufada de vento lhe pega por traz. Ele esta a uns cem metros de casa, olha por sobre os ombros e não consegue ver nada, só o som do passos são percebidos. Faltam apenas cinqüenta metros, ele agora põe-se a correr. O seu seguidor o acompanha na mesma tocada. Nos últimos trinta metros João já esta em disparada e começa a gritar: ‘mulhe’! ‘mulhe’ abre a porta! Maria! Maria depressa abra essa porta! Chega tão rápido que ao subir os degraus da varanda cai. Abre a porta Maria! Pelo amor de Deus! Levanta rápido e sacode a porta esmurrando e gritando. Quando Maria abre, ele cai no chão da sala. – Corre! fecha essa porta... Tem alguém me seguindo. Maria atordoada com aquela situação tenta acalmar o seu João. – calma homem! calma. - Isso fecha a porta. – vou te buscar água com açúcar. O pobre homem fica ali largado no chão da sala quase sem fôlegos. O homem se levanta com a ajuda da mulher e, quando tudo parece estar bem, caminha com as pernas bambas na direção do quarto e percebe que quando ele dá o passo uma perna da calça roça na outra fazendo um som estranho. E descobre que aquele estranho som foi o que acabara em lhe proporcionar o maior susto de sua vida.
- Calça ‘disgramada’! Sua infeliz! Quase me mata do coração! João que nunca havia passado por situação semelhante, despiu-se daquela que quase lhe enfartou, foi até a cozinha pegou uma faca, a mais amolada, a qual fora afiada com suas próprias mãos picotou a calça jeans, de tal modo, que Maria nada pode fazer diante da situação.