VELÓRIO
VELÓRIO
Tocou o telefone,não gosto de telefone,acho que ele só serve para duas coisas:para pedir favores,e para dar notícias ruins.
Celular então eu odeio,acho que foi fabricado no inferno,pois assim será fácil o anticristo localiza-lo no fins dos tempos, ou no mínimo foi idealizado em um complô feminino,pois ele se transformou em controle remoto a distância.As mulheres ficam em casa apertando os botões,e os maridos ficam correndo de um lado para o outro:supermercado,farmácia,escola das crianças,passar em tal lugar,pegar alguma coisa etc...outra coisa terrível é que qualquer um o encontra,e você encontra qualquer um.
Bons tempos em que você só encontrava e era encontrado por quem você realmente gostaria de encontrar.
Atendi!fato dito,fato consumado,era minha mãe:
Seu Arlindo ,seu ex-patrão morreu!!você não vai ao velório???,lembrei que também odeio velório,se possível não quero ir nem no meu.
Mas neste eu tinha de ir,pois Seu Arlindo,fora a primeira pessoa a ter coragem de me dar um emprego,e além do mais,nunca me tratou como empregado,apesar de haver umas três gerações de diferença entre nós,ele sempre me tratou como amigo.
Cheguei ao velório,logo percebi pessoas estranhas,mas pensei:devem ser parentes de longe.Entrei e abri espaço entre aqueles que choravam e aqueles que lamentavam,e tentei dar meu último adeus à beira do caixão,quando percebi que o defunto estava sem o bigode.Perguntei então:por que haviam aparado seu bigode,algo que ele tanto estimava e cultivava durante mais de meio século???uma pessoa que estava ao lado me disse:ele nunca usou bigode!,lógico que sim!,era seu atestado de vaidade!! ,afirmei.
Não,ele nunca teve bigode! ,retrucou em tom de desafio.
De novo sem querer perder o duelo disse:olha,eu trabalhei com Seu Arlindo bilheteiro por mais de sete anos,como não iria saber disso!!!
Este não é o Arlindo bilheteiro rapaz,este é o Arlindo padeiro!!!
Olhei novamente para o defunto,e meu pensamento vazou bem alto pela boca:UFA,AINDA BEM!!!
Todos,até o cachorro que estava embaixo do caixão,me olham petrificados com olhos de coruja.
Digo...,bem...,sabe...,é que estou no velório errado.Saí dali o mais rápido possível,para não ser o próximo a ser sepultado.
O único encontro em que não gostaríamos de encontrar a pessoa certa,é o velório.