ESSE NÃO! ESSE NÃO!

Era uma noite sossegada de segunda feira, que, de repente, foi interrompida quando, por volta das vinte horas, chega à Maternidade Ana Bezerra, o bancário André Abel, residente em Santa Cruz (RN), que havia sofrido um acidente de automóvel na estrada de Currais Novos (RN), já próximo a Santa Cruz. O médico de plantão era o Dr. João Albérico Fernandes.

O paciente havia sofrido traumas diversos que inspiravam cuidados e recomendavam sua transferência para um hospital melhor equipado da capital logo após um atendimento de primeiros socorros.

O bancário acidentado não corria perigo de vida, estava consciente, mas não podia falar, tampouco movimentar-se, visto que havia sido imobilizado e sedado. O paciente estava sendo devidamente preparado para ser transferido logo que a ambulância que seve ao Hospital estivesse de volta de uma viagem anterior para levar outro enfermo para Natal. Os hospitais de interior são assim mesmo, apenas uma plataforma de embarque para o Walfredo Gurgel ou para um hospital particular, que era o caso.

Entra no quarto do paciente o enfermeiro plantonista Joca Borges que, orientado pelo Dr. João Albérico, trazia em uma das mãos uma seringa e na outra uma ampola do antibiótico “Benzetacil” 1.200.000 unidades. O enfermo teve um repentino susto, esbugalhando os olhos que mais pareciam que estes iam saltar.

Ora, André Abel, diariamente, costumava prosear com Raimundo Galvão, nas noites amenas da calçada da sorveteria de Agenor. Várias vezes chegou a afirmar que não tinha coragem de ir até ao hospital Ana Bezerra e tomar uma injeção aplicada pelo enfermeiro Joca Borges. “Deus me livre” – dizia. “Injeção com Joca: nem morto”.

O enfermeiro Joca seguia manobrando a seringa, suspendendo-a na execução dos procedimentos preliminares para a aplicação, ao tempo em que o paciente imobilizado e praticamente incomunicável entrava em pânico.

O bancário fazia de tudo para que o Dr. João Albérico, que acabava de entrar no quarto, entendesse que ele não queria tomar injeção aplicada por aquele enfermeiro. O médico falava com o paciente, tranqüilizava-o sem entender o que estava tentando se expressar. Com os olhos rodopiando tentava dizer não. Com os dois pés imobilizados e suspensos numa tipóia, girava-os para um lado e para outro na tentativa desesperada de se fazer entender. NÃO! Esse não! Esse não!

O Doutor Albérico, que não notou o desespero do paciente e na convicção de que o deixava nas boas mãos do enfermeiro de plantão já se retirava para o seu alojamento.

De nada valeu a tentativa do paciente e, enquanto a injeção era aplicada nas suas nádegas, uma solitária lágrima descia do rosto do bancário medroso e falador.

DJAHY LIMA
Enviado por DJAHY LIMA em 01/07/2008
Reeditado em 01/07/2008
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