Maria Geralda, a muié do pito aceso

Era branquinha, branquinha. Tinha uma verruga no lado esquerdo do nariz que nem dava para esconder porque estava na cara. Trabalhava dia e noite a coitada. Ela e o marido eram donos de uma mercearia que servia os moradores locais: “Venda da Geralda”. Gostava de uma prosa, a dona Maria Geralda. De uma prosa e de um pito pendurado no beiço.

Tinha seis filhinhos que corriam o dia todo dentro da loja de sacarias amontoadas. E ela dando conta do recado. Enquanto isso o marido andava pelas fazendas em outras tarefas, ou coletando leite, frutas e verduras para revender na loja.

Eu freqüentava a venda sempre que viajava pra lá. Gostava de papear com o povo.

Um dia ela me contou sobre uma viagem que ela fez para a capital. Ela e o esposo. Foram visitar sua tia Zulmira em São Paulo. A Maria Geralda ficou curiosa de saber que o bairro que a Tia Zulmira morava se chamava Ó. O que será que vendia lá em Ó para Ter tanta freguesia? Voltaram sem saber. A Tia Zulmira ria muito da sobrinha. Uma noite foram jantar no shopping. O lugar, as luzes, aquela monteira de gente, e as lojas, deslumbraram Maria Geralda. Comeram pizza, e ela pensou que ainda iriam jantar depois disso, mas não. Aquilo era o jantar. Ela tinha dó da Tia Zulmira, coitada, comendo essas comidas fraquinhas. Ela precisava se alimentar melhor, comer feijão com toicinho, galinhada com mandioca. Dormiram com fome aquela noite, mas ficaram quietos em respeito à pobre Tia.

Na manhã seguinte voltaram para o interior. Afinal estavam com muita saudade dos guris, e com uma vontade louca de comer um porco assado. O povo da capital passa fome.

Um dia de pouca clientela Maria Geralda, cansada, aboletou-se num canto da venda. Tinha no colo a Marietinha e tentava fazê-la dormir. A mulher que carregava o tempo todo um cigarrinho agarrado nos beiços, caiu no sono. Aliás, ambas adormeceram, e o cigarrinho de Maria Geralda despregou da beiçola e caiu em cima da sacaria ateando fogo imediatamente. A coitada acordou assustada, juntou os guris e correu pra fora. O fogo ardeu na vendinha, com labaredas mais altas que o telhado. E queimou tudo.

Depois disso ficou conhecida como a “mulher do pito aceso”. Ela gostava de ser chamada assim. Achava graça. Só que depois desse acidente ela nunca mais fumou. Precisou incendiar a própria casa para parar de fumar.

Deu pena deles, coitados. Mas se aprumaram de novo e logo logo já tinham montado outra vendinha de sacaria. Bonita que só vendo! Tinha até caramanchão! Só que agora a venda trocou de nome: “Venda do pito aceso”. Vixe, e precisa ver como aumentou a clientela. Vinha gente de todas as bandas.

Tem males que vem pro bem...

ANA MARIA MARUGGI
Enviado por ANA MARIA MARUGGI em 18/06/2008
Código do texto: T1039911
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.