Em defesa da acessibilidade
Deficiência não é uma opção pessoal: é também ônus do próprio progresso. Quanto maior o avanço tecnológico, maior também a incidência de acidentes e o aparecimento de pessoas com deficiência.
As autoridades constituídas deveriam tratar os seus idosos, os seus deficientes e as suas crianças com maior deferência, mais respeito. Deveriam imitar os Países mais evoluídos.
O deficiente é parte da sociedade e também paga impostos. Pode e deve se sustentar com o fruto do seu trabalho. O que ele precisa é ser reconhecido, não como coitado, mas como força de trabalho, como indivíduo produtivo, como cidadão. E, para isso, é de fundamental importância a supressão das barreiras de concreto, permitindo-lhe executar o caminhar pelas ruas da cidade. Além disso, os governantes precisam se preocupar com o mobiliário urbanístico, a acessibilidade ambiental e os transportes coletivos, propiciando vida, não só aos deficientes, mas às desigualdades, como bem disse Rui Barbosa.
Dentro desses parâmetros, sinto-me gratificada por ter ocupado um cargo tão esdrúxulo aos olhos do leigo (Delegado de Polícia), provando assim que o deficiente físico pode, não só ser força de trabalho, mas força transformadora.
Transcrevo, na íntegra, ofício de minha lavra, quando titular da Delegacia de Vigilância e Proteção de Menores de Goiânia, endereçado a um parlamentar municipal, corroborando o seu nobre projeto em prol dos deficientes físicos e do direito à vida.
Li, com muita alegria, em O Popular, matéria sobre o projeto de lei de sua autoria que trata da feitura de rampas nas ruas e logradouros públicos para acesso aos deficientes físicos.
Afinal um parlamentar municipal encampa tão digna bandeira, pois pernas têm, apenas, a simples função de andar, enquanto o cérebro é o comando, é a vida, é o progresso.
Quantas vezes assistimos de cátedra a essa sociedade, a essa cúpula das grandes empresas estatais e até de nível nacional decepar grandes cabeças com aposentadorias, simplesmente por causa de uma disfunção locomotora.
Na qualidade de delegada titular da Delegacia de Vigilância e Proteção de Menores de Goiânia, e deambulando numa cadeira de rodas, posso afirmar que não há quaisquer dificuldades para o desempenho de minha função, a não ser quando enfrento grandes escadarias de prédios públicos, o que não me arrefece, pois, se não houvesse desafios não haveria méritos e os trapezistas não teriam espectadores. Assim iremos criando consciência popular, e quem sabe, no futuro, compreenderemos que a deficiência física é fruto do próprio progresso, do avanço tecnológico, fazendo-nos irmãos de verdade com acesso e aceitabilidade em todos os lugares.
Precisamos mudar o porvir! Permitir que a sociedade reconheça que somos parte do sistema socioeconômico e político do País. Isso conseguiremos com esse primeiro degrau que o nobre parlamentar acaba de legar-nos. Depois, com a coragem, a ousadia, a garra que, geralmente, substituem a falta ou a disfunção de órgãos locomotores.
Se um deficiente físico de cadeira de rodas pode ser até Delegado de Polícia, o que mais ele não poderá exercer?
A sociedade, justamente pela falta de acesso ambiental e arquitetônico que isolam o deficiente, foi conduzida a vê-lo sempre como pessoa incapaz, inválida, e até relacionar cadeira de rodas à mendicância.
Precisamos mudar tal consciência! Precisamos ir à luta nem que seja para legar aos que virão um lugar mais ao sol ou, pelo menos, o vital direito de emprestar ao País a sua cota-participação de trabalho.
Costumo dizer que a mente não está nos pés e o querer é poder.
Assim, mesmo com algumas disfunções locomotoras, visuais ou auditivas, a vida é possível e o trabalho é digno dentro da capacitação.
O deficiente não precisa da caridade pública! Ela é vergonhosa para ele e para o País. Ele precisa de oportunidades, acessibilidade, meios para qualificar-se, evitando o subemprego, uma vez que as suas despesas primárias são inadiavelmente majoradas.
Assim, Senhor Ageu Cavalcante, o seu projeto de lei apresenta nímia contextura humana e merece elogios, pois, se aprovado, marcará a história de Goiás, incentivando-o a conquistar novos e maiores espaços para as pessoas com deficiencia, corroborando-lhe o potencial e a dignidade.
Na oportunidade, apresento-lhe protestos de estima, consideração e muito respeito. (Assinado) Dra. Genaura Maria da Costa Tormin. Delegada de Polícia Titular da Delegacia de Vigilância e Proteção de Menores.