Walkíria Werônika, nº 4 - "Ai Bela!"
Carta de Walkíria Werônika - Ai Bela!
Aquele lugarzinho que você sempre sonhou, na sua data favorita, em horário de fusos intermináveis.
Meus caros amigos (e aos baratos também):
Mais um passo nestas ruas sujas, isso é o que é, e como? Por que?
Minhas compras se desajustaram, vêm gritando loucos pra me apedrejar, mas ainda estou de pé, estou por cima, e abaixo de quem não quero. Almejo é bem mais distante do longe que posso alcançar, que num piscar de meus ressalta a libido de uma vida que já tenho, e que de sonho não passa, e pesadelo se forma de nuvens pra inebriar a tachada lucidez... Eu quero é mais, porque é da certeza que me refresca a pele que sei que posso mais!
Não me calei, não desisti, aliás se alguém se faz raridade em desistir de algo, sou eu. Apenas pausei, como um click na história de meus carnavais e primaveras o que desejo contar, e mais uma vez como a certeza que me refresca a pele, sei que desejam ouvir, ver, sentir na sua própria mente as loucuras, lutas e sonhos de alguém que é ele mesmo, que mudou a vida para mudar a cabeça. Eu vou contar de novo, de meus acasos na história anônima do mundo, homônima de mim.
Venho de uma linhagem, de beleza divina, tanto maus irmãos, papai, mamãe, tios e tias... Todos com graça sedutora e angelical. Era uma obra de arte em minha casa. E mesmo sendo menino, desde pequenino, um botão ainda grudado ao seio materno, e já venci concursos de beleza por este rosto ímpar, nada efêmero em memória. E cresci, e tive pernas e braços que me levaram onde quis, e meu grande problema e solução é que sempre quis mais. Porque tenho como os poros em cada partícula de pele a certeza de que posso mais. E adolescência boa tive, sem nada deixar, de tudo que queria obter concretamente sem muito tempo de sonho. Até que a pouco depois da maior idade virei esta mulher que vos escreve, e me afligiu os mais possíveis pensamentos de que a feiúra, o mau do mundo moderno, a exclusão por aparência estava em meu caminho, como palmilha em todos os sapatos que calçava... Seria o jeito andar descalça, não contar com estas dádivas? Mas atos precipitados não garantem futuros pródigos, e por isso que pensei errado (graças a Deus não agi de forma alguma), e duas semanas após a cirurgia, como inchaço e o cansaço do pós-operatório já levados pro espaço, olhei-me no espelho e vi uma diva, lágrimas correram em emoção colorida e cintilante de meus olhos sempre azuis mistério. Estava linda, exatamente como sonhara desde muitos anos. Muitas me invejariam, e estava pouco reconhecível em vista do que era antes, e isso era bom. Não que necessitasse para tapar algum furo do passado, porque a alma pedia para a eternidade e a ciência assim me abençoar, e assim elas em conjunto e Deus me abençoaram.
E apesar de saber fazer várias coisas, e também da boa disposição e aptidão para aprender coisas novas, sempre quis trabalhar, ganhar dinheiro, em partes, pela minha imagem pessoal. Porque uma foto publicitária não diz o que você é, modelos também interpretam, completamente diferente de atores, mas trata-se idem de interpretation.
Quando bebê, recém-nascido eu fiz menino Jesus numa encenação da Paixão de Cristo. Uma pena que no final da cena do nascimento, a estrela guia despencou do teto bateu com a ponta na moça que fazia Maria, e a deixou inconsciente pela próximas duas cenas, que ainda bem, não contavam com a participação dela.
Depois disso me dediquei mesmo foi aos estudos, e não tinha noção d3e como funcionava o mundo, como esta engrenagem ligada a tantas outras chamada vida era constituída e girava sozinha. Porém como já relatei, depois que virei mulher, procurei incessantemente um trabalho na área. Soube depois que muitos não me empregaram, apesar da vontade, porque achavam que fosse cobrar os olhos da cara, já que era muito linda, e que provavelmente estava de brincadeira, pois deveria ter muita gente a meus pés (que desgraçados, por que não perguntaram?!). Mas enfim, bati bastante perna, e tive uma idéia: vou fazer fotos de graça, o que desejarem, apenas para própria publicidade. Só não saio nua, mas preciso desta alavanca pra começar algo, porque nem posso me acreditar!
Tampouco me oferecia de boca, na porta de uma agência, ou sinônimo de procura desesperada, tinha meu orgulho, e preserva-lo fazia parte dos planos. Foi quando consegui o apartamento de uma amiga na maior avenida da cidade, a mais movimentada, e mandei fazer uma placa pra lá de escandalosa, e do tamanho que era cabia ao meu lado, na sacada, no primeiro andar. Incrivelmente visível a todos... E com um vestidinho delicioso em libido. Todos que passavam podiam ver a mim, e a placa com os dizeres: “Já pensou em mim para sua publicidade? Completamente grátis!”. E meu telefone terminava com o espaço abaixo na propaganda. Foi que no primeiro dia senti aquela coisa vibrar na mesa de plástico atrás de mim, entre assobios dos caras, e o atropelamento de várias pessoas. No meu celular um fotógrafo chamava-me: Lá estava eu curtindo a inteligência e loucura dos meus planos, no meu carro, no endereço em que combinamos.
Já onde entrei, vi várias garotas quase nuas, roupas circulando, cenários e spots. Fiz um bico, empinei o queixo, sorri e ri alto... Aquilo tinha limite de bondade: chegava o tempo que em você dependendo daquilo se torna superficial, e pra mim nem era necessidade, mas conforto e fetiche! Em poucos minutos a história de uma novata estava na boca e no ouvido de todas, e minhas fotos, apenas em várias situações como ele queria, gratuito como prometera, era assistida por inúmeras pessoas e não me chateara esta situação. Todos da agência estavam em minha frente, piscando aos clicks, e encantando-se a cada mudar de pose, a cada caretão que mandava pra câmera. Foi meia hora de fotografia, e comecei a me desesperar pois nenhum convite firme havia surgido. Cumprimentei meu fotógrafo, e conversávamos quando uma bicha louca entrou seguido de garotas: a bicha magra e esguia, maquiada e cheia de roupas as mãos, dava um discurso para garotas que vinham logo atrás, implorando pela sessão publicitária que necessitaria daqueles trajes. Nos assustamos, ele mandou as garotas embora aos gritos, e se assustou ainda mais do que nós quando me viu. Disse-me assim: - “Ai bela!” e matava-me se não trabalhasse para as campanhas que ele desejava. Foi assim que conquistei os primeiros milhares com minha imagem, que rendeu enorme sucesso, e vez por outra ainda se faz ilustre em meio a tantas coisas e selvageria nestas rochas e pedras imundas. E a cada foto, cada suspiro de meu seio, ele também suspirava: - Ai bela!
Na próxima carta, conto como foi virar mulher, o começo de tudo, e as pessoas que conheci na área de modelo...
Um beijo molhado de glitter e gloss!
Walkíria Werônika.
Miss Purpurina