O POEMA NUNCA SE FECHA EM SI MESMO

(ao amigo Ramirez, em São Luiz do Maranhão)

Não concordo com esta posição subjetiva e possessiva em relação à criação poética, principalmente com a primeira parte, em que acusas o analista crítico de "esculhambar" o poema feito por terceiro.

Esta posição resume o que os franceses denominam "ramplis de soi même!", o que equivale a dizer, em nosso idioma, "cheio de si mesmo". Ou seja, aquele que não aceita colaboração, o que vale por si, numa posição extremamente autoritária e impositiva de sua vontade pessoal.

É o que os preguiçosos e os vaidosos sempre dizem: o poema vale pelo que é, mas não completam: também pelo que representa. Este “valer” sempre é altíssimo para qualquer autor, principalmente em Poesia, notadamente para os novatos. É compreensível: qualquer jovem se sente dono do mundo e/ou, no mínimo, este está errado e o autor vai renová-lo com a sua concepção de ‘nova estética’.

O importante é o encaminhamento do tema, no poema, e sua abrangência e profundidade. A Poesia de verdade tem cânones próprios, específicos para cada tempo, para cada época. A tal apregoada atemporalidade da Poesia me parece um equívoco.

A Poesia conota-se, diretamente, com o plano da realidade. E não pode ser tão abstrata que em nada tangencie o real. Fique claro que estou falando do ‘grande poema’, isto é, aquela peça poética que discute temas importantes para o Homem e, conseqüentemente, para a Humanidade.

Não se trata, obviamente, dos “bilhetinhos de amor da juventude”, a que costumeiramente os radialistas – à busca de audiência – dizem que se trata de um exemplar em linguagem poética, um ‘belo poema’, querendo agradar ao seu ouvinte.

Sendo o poema a materialidade da Poesia e do talento que está dentro de seu autor, ela é a medição do tamanho do pensamento deste. E o bom pensador, em Poesia, já nasce feito, como diziam os latinos, com a expressão “poeta nascitur, escriba fit”. Traduzindo: o poeta nasce, o escritor se faz!

O que diz o emérito brasileiro Rui Barbosa sobre a possessão egoística da obra intelectual por parte de seu autor é genérico, não vale para a especificidade, a meu ver. Rui não avalizaria o individualismo a este ponto!

Mas é bom que estejas – em teus quinze anos – a discutir estes temas.

Saberás, desde muito cedo, que sentir-se poeta não é apenas ser o ‘possesso da criação pessoal à cata de elogios fáceis’ e, sim, alguém que precisa ver o mundo com abertura, reinterpretá-lo e trazer ao leitor o resultado de sua leitura pessoalíssima, de si e suas circunstâncias.

Bravos! Segue com tuas leituras e viva o teu poema!

– Do livro CONFESSIONÁRIO – Diálogos entre a Prosa e a Poesia, 2006 / 2008.

http://www.recantodasletras.com.br/cartas/850511