Acidente Premeditado
Foi um acidente, mas eu já sabia que algum corpo acabaria no asfalto, sangrando — e não seria o meu. Foi um acidente, mas a vítima já havia sido escolhida. Escolhida pela minha fuga, pela minha rigidez e pelo medo. Eu sempre soube que o medo iria me roubar algo nessa situação, e acabei descartando alguém que já não servia mais. Alguém que não serve nem para si mesma, pois não se vê com valor.
De um coração cheio de feridas mal cicatrizadas, retirei os curativos e o fiz sangrar novamente. Sinto como se houvesse um coração em minhas mãos, pulsando e derramando sangue por todo lado. É quase como se ele dissesse: "Olha, foi isso que você fez!" E meu frágil coração respondesse: "Desta vez, não poderia ser eu."
Meu coração, cheio de buraquinhos, já não suporta a dor de um amor não correspondido, da rejeição e do desafeto. Minha forma de defesa foi fazer outro coração se machucar — contanto que não fosse o meu. Porém, carregando o peso dos batimentos e da dor, entre os meus dedos sinto escorrer a culpa pelo acidente premeditado.
E não, eu não me senti tão bem quanto achei que me sentiria, punindo alguém como já me puniram antes. Eis o dilema: quebrar um coração ou ter o coração quebrado? Dois pesos que, colocados na balança, equivalem a culpas diferentes, mas com a mesma proporção.
O amor é engraçado — e eu não sou piadista.