Cartas de Saint-Michel - Pequenos bilhetes de amor VIII

 

Mais uma carta escrita e nunca enviada para você por não saber mais o seu endereço.

 

Querido Joseph

 

"Sabe que dia eu tenho muita saudade? Um dia quando eu estava lá no interior da Abadia com você. Você estava restaurando aquele quadro lindo dos anjos ao redor da luz. Então você olhou para mim, me fitou profundamente e me falou com os olhos. E ficamos por muito tempo nos fitando e você me falando do seu amor. E por fim você piscou os dois olhos juntos para frisar o que tinha acabado de mim dizer: eu te amo maria!, tanto, tanto. Foi o que entendi, foi o que senti, foi o que meu coração se agarrou como fosse uma tabua de salvação num mar revolto.

 

Tanto tempo já se passou desde aquele dia Joseph. A pintura já foi restaurada. E eu estou aqui olhando pra ela novamente e eu lembrei desse momento. Eu sinto falta dessa nossa comunicação com os olhos, do dia que você me tocou na escada da Abadia antes de eu descer. Ao passar você disse 'adeus' e me tocou no cotovelo. Eu quase fiquei lá, para ficar sentindo o toque.

 

E do dia que eu estava chorando lá num canto da Abadia e as lágrimas quase enchendo de dor o vaso que segurava na mão para restaurar e você sentou ao lado e perguntou o que eu tinha e eu não queria dizer porque era o dia dos namorados e você, mesmo me amando, abraça outro coração. Então você ali sentado colocou a cabeça entre as mãos e ficou ali, triste, olhando a mesa em que eu trabalhava... Então eu sabia que você estava sentindo o mesmo que eu. E que sabia como me doía estar do teu lado e não poder te ter e saber que dali a pouco você voaria para outros braços e eu ficaria sozinha e triste. A sua sensibilidade para isso, para essa dor me tocou... E então você ficou sentado ali, conversando comigo sobre tantas coisas e o sentimento de solidão e dor foi passando. Você riu, brincou... e depois... olhou o relógio e disse que tinha de ir. E se foi... E fiquei lá, triste, triste... sozinha e chorando...

 

São essas coisas que me atravessam quando eu sinto isso. Quando eu sofro por não te ter na vida real. Por te ter em meu coração, me saber no teu coração, mas não ser o teu presente, não ser a tua escolha para o Amar no dia a dia, no cotidiano.

 

Sabe? Jamais quero ferir e machucar você como você me fere e machuca com tuas escolhas (principalmente porque me deixa saber delas). Quando faz isso é você mesmo que se fere, que se machuca, porque quando amamos alguém e ferimos seu coração é a nós mesmos que estamos ferindo. Então... Se você se machuca e sente dor precisa saber que é você mesmo que está se machucando. Não diga nunca mais que te sou indiferente, que escolheu outra porque não te quero. Não diga, porque isso não é verdade. Eu te amo! Com toda força do meu ser!. Sempre Marie".

 

Esta carta escrevi de minha mesa de trabalho dentro da Abadia. Era um dia triste e de muitas lembranças. Dia de dor e de amor.