Amar é...

Amar é difícil, ser amado mais ainda. Isso porque quando entramos em um relacionamento buscamos a pessoa que idealizamos, aquela que só existe em nossa mente, em nossas ilusões românticas, em nossas expectativas irrealistas. Na convivência aprendemos a enxergar a pessoa real, concreta, com muitos erros, defeitos, incômodos, mas também algumas qualidades e bem estar. A maturidade interna nos faz ir adiante, desconstruir nossos padrões para investir sentimentos naquela relação se ela nos faz bem, se ela nos traz alguma alegria. Aprendemos a estabelecer acordos mútuos (respeito, limites, perdão, fidelidade, lealdade, cumplicidade, empatia, reciprocidade). Entendemos que nós também estamos muito longe da idealização feita pela outra pessoa sobre nós, que ambos não correspondem a representação utópica, pois trazem conflitos, bagagens, traumas, uma série de fatores complicados com os quais a outra pessoa terá que ser paciente em lidar e vice versa. Compreendemos que é uma via de mão dupla. Não dá para estar solitário à dois, não há nutrição verdadeira em território desértico. É impossivel e cruel tentar amar por dois, pois os dois precisam se desconstruir para se reconstruir como parceiros de uma vida toda, onde tudo será dividido e tudo será cuidado em comum acordo, com amorosidade recíproca. Afinal, quem cuidará de sua febre madrugada a dentro, quem aceitará seus quilinhos a mais, quem a achará linda sem maquiagem, quem rirá de suas piadas sem graça, quem enxugará suas lágrimas, quem estudará com você? Somente fará isso a perder de vista, quem souber que pode esperar o mesmo na outra pessoa. Confiança, entrega e reciprocidade. Quando apenas um dos lados pensa e age assim, e o outro só espera receber, se acomoda em não retribuir, ou oferta o mínimo como única coisa disponível, há um fim demarcado logo no início. Receber sem retribuir indica egoísmo, indiferença, descaso e descompromisso com a outra pessoa. É preciso amor de ambas as partes para um relacionamento dar certo. Se apenas uma parte ama, há insatisfação e incompletude nas duas partes e consequente desgaste da relação. Somos seres humanos e não máquinas. Só o amor não basta, porém, sem amor é impossível continuar. O amor é o combustível para os dias de cansaço, os dias em que tudo dá errado, os dias em que nem queremos sair da cama. É o amor que leva café na cama, abraça e faz cafuné, conta piadas sem graça ou simplesmente só faz silêncio e ouve as batidas dos corações entrelaçados. Cada um oferece ao outro o que tem dentro de si naquele momento. Cada um retribui o amor conforme aprendeu ou não a ser amado. Se alguém responde ao amor e dedicação com frieza e distanciamento, as duas pessoas estão entregando uma a outra o que há nelas naquele momento. Uma ama e a outra não ama. Há pessoas que não conseguem se descolar da ilusão, da utopia que criam do "ser amado" e por mais que "aquele que ama" se dedique por completo, não é dele que se espera aquele amor, a pessoa continua esperando, clamando, buscando na sua idealização o mesmo que lhe é entregue por aquele a quem não quer amar. É justo. Ninguém é obrigado a amar ninguém. E é plenamente justo que cada um faça suas escolhas e finde um relacionamento onde não há equilíbrio de sentimentos, de reciprocidade, de acolhimento. Pior que não amar a outra pessoa é sentir o desamor da outra pessoa. Quem oferece flores, bombons, carinho, afeto, os quer de volta. Se a pessoa de destino não os pode ofertar e, mais ainda, não os quer ofertar, nada mais justo do que a separação. Não se retribui com um "nada" um amor intenso e nem se espera que após uma ruptura difícil onde orbitam rejeição e julgamentos, permeados por ressentimentos, se mantenham sentimentos positivos. Aquele que não foi amado merece encontrar alguém que valorize seus sentimentos, sua dedicação, sua pessoa amorosa, assim, como aquele que não amou merece encontrar alguém a quem consiga amar e retribuir sem esforço. O amor ou o desamor não devem ser prisões de pessoas que não estão destinadas a estar juntas. O amor deve ser liberdade, para que cada um encontre o que considera ser a sua felicidade, junto com quem comungue dessa idea. Ninguém deve se manter em um relacionamento só para evitar a solidão ou ter a quem mostrar à sociedade ou ter um suporte salva vidas quando não há mais com quem contar. A solidão dói muitas vezes, mas traz paz. O desamor dói muito mais e mantém conflitos e infelicidade. Escolher a paz, escolher amar a si mesmo será sempre a posição mais sábia. Ninguém merece passar pela vida sem amar e ser amado. Amar é ser capaz de dizer adeus, mesmo quando se está destruído por dentro. Deixar livre a outra pessoa para realizar o sonho de amor que não encontrou em ti. E, com o tempo, se reconstruir internamente para quem sabe encontrar finalmente alguém recíproco, que te nutra, alguém que te perdoe por não ser uma ilusão e que te ame muito por ser uma realidade.