IZA

Essa é uma carta aberta às mulheres.

Ontem a noite, antes de dormir, eu chorei essa dor coletiva que sentimos sempre que uma de nós é exposta. Esse corpo de dor gigantesco que é ser mulher no Brasil, no mundo.

Rimos, fazemos piada. Contamos, entre um gole e outro, na mesa do bar com as amigas, as maiores atrocidades que nos fizeram passar.

Eu faço muito isso. Eu rio de todas as vezes em que um homem passou por cima de mim como um trator. Acho que o humor anestesia essa ferida dolorosa e incicatrizável. Seria impossível digerir de outra forma.

Mas avaliando as coisas com seriedade, não é engraçado.

O jeito como eu já fui machucada não é engraçado.

Aquela vez em que eu peguei uma conversa do meu namorado com uma colega de trabalho no celular dele, não foi engraçado.

Quando o cara que eu tava saindo não me deixava falar e me tratava como se eu fosse burra, me fazendo acreditar que eu realmente era, minando minha autoestima, não foi engraçado.

O dia em que eu comecei a chorar no meio do sexo pedindo para o cara parar porque eu já tinha dito que não tava a fim... Aquilo não foi engraçado, foi estupro.

Estar num relacionamento de anos com alguém indisponível emocionalmente, egoísta e irresponsável, não é engraçado, é somente violento.

Vivi essas relações abraçada na ilusão de consertar esses caras. De que era minha responsabilidade educa-los, ter paciência. Não vou fingir que não sei de onde isso vem. O machismo é filho desse sistema socioeconômico maldito que é o capitalismo. A falta de caráter desses homens é uma construção social muito bem amarrada que eu não sonho em ver desfeita.

Mas, no horizonte, vejo que em nós, mulheres, existem inúmeros reservatórios de autoamor e raiva que, se unidos, viram um oceano que está sempre disponível. É nessa água que devemos nos banhar para nunca mais aceitar viver essas violências. Todas as vezes em que fui salva, quem me puxou foi outra mulher. E sigo prestando atenção na vida das minhas irmãs para estar preparada para ser para elas o suporte que elas merecem ter.

"Lifting as we climb" tenho essa frase tatuada para nunca esquecer.

No final essa é uma carta de amor, muito mais que de mágoa. Amor infinito ao feminino. Sagrado, real, poderoso, falho, lindo, único.

Dias mulheres virão... Eu acredito.

Amor,

M.

PS:

Ouçam "Fé nas maluca" da Iza

A Melodia da Letra
Enviado por A Melodia da Letra em 12/07/2024
Reeditado em 12/07/2024
Código do texto: T8105606
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