Para o querido psicanalista Alexandre Coimbra do Podcast Carta de um Terapeuta #### (Carta/Ficção)

São Paulo, dia 10 de junho de 2024.

Querido Alexandre Coimbra de Amaral, muito emocionada escrevo esse e-mail relembrando da época que adorava escrever cartas caprichando na letra para enviá-las pelos Correios. Que delícia você ter resgatado essa ideia. É tão bom escutá-lo dizendo para “abrir o envelope e aceitar a carta que está chegando”.

Ouvir sua voz acolhedora, que exala compreensão, cheia de ternura, suave como um abraço reconfortante, é muito bom. Eu consigo imaginar enquanto escuto o programa, qual deve ser a expressão do seu rosto durante a leitura da carta e seu olhar atento à cada palavra escolhida para contar a história.

Seus comentários me atravessam e me fazem lembrar da época que em casa, meus saudosos pais, ouviam música e notícias na rádio o tempo todo. Atualmente escuto vários podcasts, que é um tipo de rádio na internet, pelo meu celular. Coisa boa que a tecnologia nos proporcionou. Estar conectada com novas tecnologias o que me faz sentir participante do meu tempo.

Me chamo Drielle, tenho 86 anos, nasci e moro em São Paulo, quem escolheu meu nome foi meu pai, muito religioso, e um leitor encantado da Bíblia.

Sei que você completou há pouco cinquenta anos, tem cabelos grisalhos e que está encantado com a maturidade que somente o passar do tempo pode proporcionar. Gosto muito de assistir suas entrevistas na televisão e em canais no Youtube. Você tem razão : “toda ansiedade merece um abraço”.

Estar viva é uma alegria e envelhecer é um privilégio, não é fácil ver o corpo se modificando, mas é gratificante acumular experiências.

Cheia de disposição, cercada por minhas amizades novas e antigas, com saúde, me defino como uma mulher que realizou. Tive uma vida comum, estudei, me casei, tive filhos, me separei do primeiro marido, casei novamente, namorei, tenho netos, fui trabalhar fora depois que os filhos cresceram um pouco, foram décadas de dedicação, me aposentei.

Escrever durante toda a vida foi uma necessidade para mim, ao mesmo tempo era uma espécie de forma de expurgar a angústia que pulsava no meu peito e fonte de alegria. Algo difícil de explicar para quem não sente esse chamado. Sei que você me entende, pois sempre comenta que escrever para você é algo urgente, é um mergulho para dentro, sem o qual você não fica bem.

O papel e a caneta têm sido meus companheiros ao longo de muitas décadas, com diferentes motivações: escrever cartas para mandar notícias, anotar em um caderno para registrar os acontecimentos bons ou nem tanto, para lidar com os momentos difíceis, para aplacar a tristeza, para mergulhar na dor do luto, para deixar como recordação, para declarar amor, para saber como está quem mora longe, as finalidades foram e são tantas. Escrever usando computador ou notebook é algo recente para mim, salvar uma ideia no bloco de notas do celular é bom, mas gosto mesmo do caderno, dos meus rabiscos, das minhas anotações que depois reescrevo e transformo em texto.

Durante anos da minha juventude os diários foram meus companheiros. Neles eu anotava tudo. Eu os reli anos depois. Tenho eles guardados até hoje. Depois de um tempo com a correria da vida não dei continuidade, uma pena.

Enquanto escrevo esse texto imagino quantas mulheres ao longo dos últimos séculos tinham tanto para expressar, contar e produzir, mas não tiveram a oportunidade de escrever. Muitas nem puderam estudar ou a massacrante rotina de trabalho, dentro e fora de casa, foram impeditivo.

Imagino que quantas delas escreveram em cadernos, enquanto cuidavam de filhos e das tarefas da casa que as sobrecarregavam, mas nunca foram publicadas e tantas outras que tiveram seus livros publicados, mas foram apagadas da história da literatura brasileira e que estão tendo as obras resgatadas por mulheres pesquisadoras, em geral, nas universidades. Isso é maravilhoso.

Nas livrarias até alguns anos os títulos que encontrávamos, especialmente entre os mais vendidos, eram de autores, homens, brancos, estudados, moradores de capitais, ricos. Poucas autoras conseguiam vencer a barreira imposta pela sociedade que enxerga a mulher como objeto do desejo e pouco como sujeito da sua história.

É delicioso atualmente encontrar dezenas títulos de mulheres escritoras potentes, brasileiras ou estrangeiras, de diversas etnias , produzindo, sendo publicadas em editoras físicas ou virtuais, pesquisando, escrevendo ficção, poesia, produzindo texto jornalístico, realizando pesquisa histórica, dissertando sobre psicologia, psicanálise, educação, ou produção científica, entre tantos temas. A Elisama Santos, sua amiga e parceira de trabalho, é uma delas. Que bom !

Sou leitora devoradora de livros, e assim como a escrita, a leitura faz parte da minha vida. Livros escritos por mulheres me fascinam ainda mais. Nas livrarias, as poucas que ainda resistem na cidade, compro um livro de uma autora e outro de um escritor, assim torno equânime a minha pilha de livros para as próximas leituras. Costumo ganhá-los de amigos e familiares. Não existe presente melhor, penso eu.

Nesse contexto acompanhar as leituras das cartas escritas com tanto sentimento e sempre lidas de forma tão respeitosa (trocando os nomes) me deixa profundamente tocada, melhora meu dia. É emocionante reconhecer o outro ser humano lidando com suas dores e vazios sem disfarce em um mundo tão artificial como esse onde as redes sociais podem ser usadas para mostrar uma suposta vida perfeita.

Escutar seus comentários sobre casos tão delicados e demasiadamente verdadeiros faz meus olhos marejarem. Com alguns me identifico, com outros, não, mas é sempre reconfortante ouví-lo.

Sou grata pela potência e sua doçura em forma de áudio produzidos por você em tempos difíceis de intolerância e desvalorização da verdade.

Abraços afetivos (também sou abracenta)

Drielle Silva

Podcast Carta de um Terapeuta pode ser ouvido gratuitamente nos tocadores virtuais e é apresentado pelo psicólogo, escritor, palestrante e Alexandre Coimbra Amaral que participou de diversos programas de tv e entrevistas em canais na internet.

Instagram : @alexandrecoimbraamaral

Manuh Danorte
Enviado por Manuh Danorte em 20/06/2024
Reeditado em 20/06/2024
Código do texto: T8089947
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