Querida minha, é com pesar que lhe escrevo para dizer que hoje, angustiado; desprovido de qualquer manifestação positiva, colhi no jardim da memória, algumas letrinhas, às quais tentarei ordenar para que possam transmitir algum sentimento. Absorto, careço de algum estímulo com o poder de clarear minha escuridão. Quando a benévola imaginação dá sinais de fertilidade, eis que surge a intrigante ociosidade mental interpondo-se com firme intuito destruidor, borrifando ácido em meu jardim de letras. Sempre esbarro em mesmices que esmorecem meu viver. Não tenciono formar versinhos inconsequentes que se resumem em banalidades recheadas de frases feitas acrescidas de surtos utópicos. Tento dedilhar alguma letra, o stress vem feito desgraça, interceptando qualquer iniciativa. Gostaria tanto de estar a teu lado, falar com você. Nesta noite, a tristeza veio me visitar impiedosamente. Desejaria que tudo parasse agora. Ando cansado de mim. Chego a duvidar da fé. Vejo minha foto amarelada retratar meu corpo, penoso invólucro, massa descartável que vai se distanciando do cérebro. Meu desmantelo é total. Acho melhor abster-me da tentativa poética, pois certamente eu iria afirmar que a felicidade não existe nos míseros versos tristes que ainda não escrevi. Ando depreciando-me, convivendo com as ausências criativas. Atado, vivo em profundo exílio, enclausurado no enegrecido jardim onde as letrinhas não afloram, cautelosas, quanto às minhas desesperanças. Sem flor, sem vida; tudo o mais se transforma num sepulcro deprimente. Você sempre ausente, não consigo elucidar o dom; não sou eloquente. Mas com você a pagina estava virada porque numa noite fria e degradante, enlouquecido por uísque barato e ecstasy de anfetamina, vi com alegria meu corpo saindo de mim, transformando-me em espectro errante, vagueando, a procura de nada...enfim eu estava liberto da privação do curral humano que incentivavam a fornalha global, fixados numa política traiçoeira que se diverte com joguinhos de guerras. Num providencial descuido a mão do destino roubou minha vida.

 

 

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Paulo Izael
Enviado por Paulo Izael em 22/05/2024
Reeditado em 22/05/2024
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