DIÁRIO
O brio da existência me apavora:
É cruel a inpassibilidade do agora -
Não há muito o que se pensar, e há muito...
Eu ouço as vozes da morte me chamar,
Está nos escombros de meu futuro,
Ecoando erros de meu passado.
Elas sabem bem onde me encontrar.
Eu não sou o que tenho me tornado,
Mas sei muito bem o que irei me tornar.
É assim na guerra!
Ninguém escolhe o próximo alvo,
Mas eles sempre estão lá,
Sempre mais e mais perto.
Posso sentir o cheiro dos seus cigarros,
O suor de suas roupas encharcadas.
Eu quase posso ver suas lembranças
E eles as minhas, através de nossos bolsos,
Nas cartas que escrevemos e nunca irão ler.
A única certeza que temos é que não temos
Mais nenhuma certeza.
Mentiram para nós, nos deram essa guerra
Como quem dá um brinquedo a uma criança,
A única coisa que aquece nossos corações
São as pontas de nossos fuzis já gastos.
Não há mais nada para nós lá fora,
Sabemos disso. Acabou!
Estamos todos condenados a essas cinzas:
Resta-nos saber o quanto ainda podemos de arder...
M.N.C - SOLDADO / INFANTARIA
LENINGRADO, 1942-3
(Heterônimo)