MAR DE MONÇÕES
Posso te fazer versos brancos*, românticos
ou vermelhos, em curvas, que queimam tão forte e se tornam azuis.
Mesmo no silêncio, meus afetos não se submetem às tuas oscilantes marés,
nem se amortecem ante longas ausências.
Fecho os olhos e assisto o mundo desaparecer nas minhas ficções.
Cometas cruzam a constelação de aquário e se chocam,
experimento o torpor de uma presença una me tomar num ritmo lento.
Você está lá "sorte da minha sorte"**,
"velut luna, statu variabilis"***
Ainda no fim de tudo, você é apenas o início do meu fantasioso final feliz,
me fitando com seu olhar etéreo e indiscreto,
do qual não posso me desvencilhar
Sou feita de água doce, em mim tenho muitas monções
e o desejo de me desintegrar nas tuas águas salgadas,
ser atravessada pelas tuas ondas,
me diluir nessa substância da qual tive uma breve prova.
Submergir nelas é o risco de não ser mais eu mesma e me tornar parte da tua imensidão.
Mas, sempre acabo naufragando nas fendas abissais do teu oceano que, com recuos e maremotos repentinos, desaparece...
Notas:
* em teoria literária "versos brancos" são versos sem rimas que podem ou não possuir métricas.
** Sadalsuud (estrela mais brilhante da constelação de aquário)
***verso de "O Fortuna (Ó, Sorte) " um dos poemas das Canções de Beuern (Carmina Burana)
- velut luna (És como a Lua) statu variabilis (mutável).