MELANCOLIA
Minhas cartas não têm destinatários.
Mas, são toda a minha liberdade.
Constituem também um limite.
Por vezes, me pesam nas pontas dos dedos, o lápis fica denso...
como se cada palavra fosse feita de chumbo.
Musas dormem sobre o papel danificado.
Seguem silenciosas, ocupadas demais para ascender neuroses mundanas.
Quando de mim não verte a palavra e o impulso, estou condenada.
E, de certa forma, isso é um privilégio.
Morrer do meu próprio veneno, tão familiar...
Uma gota dessa bile negra é capaz de desolar toda a vida que eu conheço.
Nada de divino,
nenhum espetáculo,
nenhum suposto talento.
Apenas uma desordem egoísta, regida por uma entidade sem nome,
ou a qual não ouso nomear.
Talvez porque ando me confundindo com ela...
Maltrapilha como ela,
indiscreta e sonolenta como ela,
apática, magra e fraca,
sem apetite.
Desapareço num desejo antigo e vulgar de apreciar a minha invalidez,
oscilo por angústias triviais, suporto noites de domingo.
Regrido, assim, tão infantil para um ventre desertor, sem sabê-lo.
Busco abrigo no disfarce de um divertissement sombrio,
que é parte de mim agora.
Embora aqui eu possa me esconder
de ser feliz (e tola).