MELANCOLIA

Minhas cartas não têm destinatários.

Mas, são toda a minha liberdade.

Constituem também um limite.

Por vezes, me pesam nas pontas dos dedos, o lápis fica denso...

como se cada palavra fosse feita de chumbo.

Musas dormem sobre o papel danificado.

Seguem silenciosas, ocupadas demais para ascender neuroses mundanas.

Quando de mim não verte a palavra e o impulso, estou condenada.

E, de certa forma, isso é um privilégio.

Morrer do meu próprio veneno, tão familiar...

Uma gota dessa bile negra é capaz de desolar toda a vida que eu conheço.

Nada de divino,

nenhum espetáculo,

nenhum suposto talento.

Apenas uma desordem egoísta, regida por uma entidade sem nome,

ou a qual não ouso nomear.

Talvez porque ando me confundindo com ela...

Maltrapilha como ela,

indiscreta e sonolenta como ela,

apática, magra e fraca,

sem apetite.

Desapareço num desejo antigo e vulgar de apreciar a minha invalidez,

oscilo por angústias triviais, suporto noites de domingo.

Regrido, assim, tão infantil para um ventre desertor, sem sabê-lo.

Busco abrigo no disfarce de um divertissement sombrio,

que é parte de mim agora.

Embora aqui eu possa me esconder

de ser feliz (e tola).

Solivagant
Enviado por Solivagant em 15/09/2023
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