Carta para o Delegado

Senhor Delegado,

Peço-lhe que me dê um instante de sua atenção, pois eu quero lhe contar um acontecimento triste que me ocorreu.

Eu, Maria José dos Santos Silva, tenho 48 anos e sou beata da Igreja Católica Apostólica Romana desde minha adolescência. Com 17 anos de idade passei a residir com a família da Dona Marlene, onde sempre trabalhei como doméstica.

A família da Dona Marlene e do Sr. João Nepomuceno sempre foi a minha própria, pois sempre tive um ótimo relacionamento com os seus irmãos, filhos, sobrinhos e demais parentes. Se o senhor quiser pode conferir o que estou falando.

Há sete anos, a Dona Marlene ficou viúva a partir de um trágico acidente automobilístico quando o Sr. João Nepomuceno retornava do trabalho para casa.

Com aquele fato, todos nós enfrentamos anos muito difíceis, até que o tempo foi passando e com a ajuda de Deus conseguimos superar aquele trauma. Hoje, faz dois anos que a Dona Marlene se casou novamente e desde então ela passou a sorrir novamente. Mas confesso ao senhor que nada daquela fase horrível após a perda do Sr. João poderia se igualar a tormenta que venho sofrendo de dois anos para cá. Eu tenho sofrido muito nos últimos dois anos, e tal sofrimento culminou com a minha demissão na semana passada.

Para mim é muito difícil estar informando ao senhor quais foram os reais motivos da minha demissão. Mas, sei que fui injustiçada e não posso mais ficar calada.

A minha demissão ocorreu pela indicação do novo esposo da Dona Marlene, Sr. Pedro Paulo, que tem me atormentado por muito tempo. Desde o dia em que ele passou a morar aqui na casa da Dona Marlene, a minha vida virou um grande pesadelo. Ele passou a me assediar quase que diariamente, fazendo muitas coisas para me constranger. Ele é uma pessoa muito saliente, ou seja, uma pessoa sem pudor e sem respeito para com o próximo. Todos os homens daqui (filhos, sobrinhos e irmãos da Dona Marlene) sempre me trataram com todo o respeito, mas ele não.

Ele ficava me abraçando forçadamente, passava a mão em mim, nas pernas, nas costas, nos braços, no cabelo e na cintura. Tudo isso sem o meu consentimento. Várias vezes eu o repreendia, mas ele nunca parava de fazer essas coisas. Ele começava brincando e, de repente, me abraçava por trás e ficava cheirando o meu pescoço e se esfregando em mim. Ele falava palavras obscenas, palavrões e grosserias. Isso aconteceu um monte de vezes. Quando ele fazia isso, e outras pessoas estavam por perto, todo mundo repreendia ele.

Eles falavam com ele, mas ele nunca parou. Eu sempre falava duramente com ele, mas ele não me respeitava. Eu ficava sempre constrangida e os filhos da Dona Marlene também reprovavam o comportamento dele. Eles até falaram com ela, mas eu acho que ela também tinha medo dele. Eu acredito que é por isso que a Dona Marlene nunca fez nada para impedi-lo.

Eu sou uma pessoa digna. Nunca fui a festas, nem freqüento bares, nem saio à noite. Não bebo e nunca tive nenhum homem. Sou muito temente a Deus e quando saio sozinha vou à igreja ou à casa de amigas, quase sempre acompanhada de pessoas da igreja. Isso tudo o senhor pode comprovar.

Sou uma pessoa calma e não gosto de brigas. Nunca me envolvi em confusão. Por isso mesmo, foi muito difícil e muito sofrido ter que passar por uma situação dessas. Eu sofri muito e tive muita resistência em levar isso adiante. Mas, agora, com o apoio do vigário Salomão Barbosa e com muita fé que Deus pode resolver essa situação é que estou apresentando isso ao senhor.

Como eu sou uma pessoa pacata e calma, isso tudo foi muito difícil, pois ele vinha chegando, conversando e, de repente, quando eu percebia estava de novo sendo constrangida pelos gestos que ele fazia e pelas palavras obscenas e torpes que ele falava. Ele queria se deitar comigo, mas eu nunca quis, pois entreguei a minha vida a Deus, ainda na minha adolescência.

Esse assédio foi ficando tão grave que no último semestre ele passou a me ameaçar, dizendo que, caso não deitasse com ele, eu iria ser demitida. E o pior de tudo é que ele cumpriu as ameaças, pois no início desse mês eu fui demitida.

Desde que isso aconteceu, eu choro muito quando relembro dessa situação.

Todos os dias eu peço a Deus para reverter essa situação, pois eu quero que ele pague pelo mal que me fez e quero voltar a trabalhar na casa da Dona Marlene.

Que Deus abençoe o senhor !!!

São Paulo – SP, 14 de dezembro de 2007.

Maria José dos Santos Silva

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Gurupi – TO, Dezembro de 2007.

Giovanni Salera Júnior é Mestre em Ciências do Ambiente e Especialista em Direito Ambiental.

E-mail: salerajunior@yahoo.com.br

Giovanni Salera Júnior
Enviado por Giovanni Salera Júnior em 18/12/2007
Reeditado em 20/03/2009
Código do texto: T783769