Quando o peito aperta

“ Hay dias que no se lo que me pasa

Eu abro o meu Neruda e apago o sol “

Cotidiano 2 – Vinicius e Toquinho

Querida Marília,

Ontem estive em São Paulo e só pude ler a sua crônica “A tristeza derruba os talheres” esta manhã.

Não sei quanto a você, mas minha TPM alterna Tempo Para Meditação e Tendência Para Matar. Acho que seu texto foi escrito sob os efeitos do Tempo para Meditação : ficou triste e lindo. A tristeza aguça a sensibilidade. Nós, ocidentais, acreditamos que ela é sentimento negativo, nos expondo aos olhos alheios e confrontando nossa indiscutível fragilidade. Vivemos na corda bamba entre a esperança e o medo, a alegria e a tristeza... Antíteses são essenciais: reconheço a covardia na coragem ; o tormento nos instantes de paz ; a alegria nos tempos tristes. A tristeza funciona como uma bússola, que aponta a área afetiva que precisa ser melhor cuidada. Já a mágoa é a cirrose da alma : se a tristeza despede-se sozinha, a mágoa só parte pelo transplante do perdão.

Não sei como você concluiu que “a arte de vencer a tristeza sem derrubar os talheres” seria um bom tema para eu escrever. Parte da minha ascendência é italiana e italianos vivem emoções com tanta intensidade, Mama Mia! Talvez por isso, na adolescência fiz Socila, espécie de escola de boas maneiras – “decadence avec elegance”. Não choro mágoas, sou combativa : meus pavores são que algo ruim aconteça com minhas filhas ou encarar um rato algum dia. O resto tiro de letra: sei que tristezas, assim como alegrias, passam.

Imagino que tenhamos pontos comuns, além do gosto pelas palavras. Você teve uma infância mais dura e uma adolescência mais conturbada, eu acho. Percebo que está conseguindo, especialmente através dos textos juvenis, fazer releituras pessoais e exorcizar fantasmas. Para mim, 2007 foi um ano conturbado, com conflitos pessoais e doença na família. Escrever e meditar me foram úteis.

Para não derrubar talheres quando estou triste, deixo vazar as lágrimas represadas. Procuro um lugar de recolhimento e choro como criança. Cansada, adormeço - quando acordo, a dor já desinflou. Tento transformar a experiência em aprendizado, redefinição de rota. Tento, nem sempre com sucesso, perdoar. Não me deixo seduzir pelos ganhos secundários da tristeza : num primeiro momento as pessoas nos acolhem, o que é perigoso se estamos carentes. Com o tempo, cultivando o lado triste, transformamo-nos em espalha-bolinhos.

Se a crônica de ontem foi motivada por tristeza decorrente da desregulação hormonal, esta carta nem fará sentido hoje. Para você não perder a caminhada dos olhos sobre o texto até aqui, uma receita que é tiro e queda para acabar com tristeza de TPM é barra de chocolate ( das pequenas, para você não ficar triste de gorda ), de preferência TALENTO, seu chocolate preferido... Compre e deixe guardada para o próximo mês!

Gosto da sua escrita leve e fluida. Ela guarda maturidade, sensibilidade e bom humor. Sei que seu sonho é ter um livro publicado em 2008 e ver reconhecido o seu talento. Tenho certeza que seus desejos hão de se realizar .

Na próxima vez que estiver sofrendo em TPM, não hesite em me telefonar : só uma mulher reconhece que em TPM somos sempre prioridade máxima!

Um grande beijo em você e no Dagger ( quando você o encontrar).

Hope you are much better today.

Love,

Maria Paula Alvim
Enviado por Maria Paula Alvim em 14/12/2007
Reeditado em 14/12/2007
Código do texto: T778314
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