Epístola a um amigo que já se foi
11 de abril de 2023
Não estou muito bem, meu amigo. Levantei e comi apenas agora, e já são quatro da tarde, numa terça-feira. Parece que não tenho emprego, mas tenho, só não importa. Não sinto que importa o que faço, nem o que deixo de fazer. Tem algo me puxando firme para baixo, sugando toda a minha energia, toda a minha força. Fechar os olhos é gostoso, fechar essa janela e encontrar uma escuridão carinhosa, que me fornece um abraço macio e quente. Fora desse abraço eu tenho contas, autocobrança, e um fracasso que sei fazer parte da vida, que serve reflexivo ao meu amadurecimento.
Queria estar abraçando um reflexo do sol, sentindo a vida em meu corpo, com o sangue correndo quente, plácido e feliz como os primeiros passos de uma criança, e outrora pulsante e alegre, como meu primeiro pedalar numa bicicleta.
Se essa sede de viver é plebe, como dito noutro tempo, eu não sei, mas que essa falta de sede danifica meu estado futuro, issso sim eu sei. Essa falta de sentimento da percepção realista do momento em que me encontro é de roer até os ossos. Veja, as cincunstâncias não são ruins, não há sequer uma asa levemente danificada, mas o passarinho não sente vontade de voar.
Vou amanhã reclamar da euforia? Talvez. Mas hoje reclamo desse amarelo opaco, do leve e estoenteante pesar de minha cabeça num travesseiro estático, cansado, mas sobretudo confortável.