Carta à Raposinha (outra resposta)
Minha querida Raposinha,
Já faz muito tempo que eu escrevi aquela carta abrindo o meu coração para você. Eu aguardei a sua resposta com um misto de ansiedade e apreensão por dias, semanas, meses, ano. Até que eu percebi que você não ia me responder. E mesmo doendo decidi seguir em frente.
Então imagine quão surpreso eu estou ao receber sua resposta tantos anos depois.
Por quê agora?
Eu não sei dizer exatamente como me sinto. É um carrossel de emoções. Ainda mais porque tudo voltou quando eu a vi, há duas semanas, no velho sebo em que nos conhecemos. Eu costumo ir lá uma vez por mês para reviver as nossas memórias. Eu estava andando por entre aquelas pilhas de livros, até que vi o cabelo avermelhado que tanto amo e travei. Fiquei sem acreditar. No instante em que você virou e me olhou o mundo parou e eu voltei a ser aquele jovem rapaz que se apaixonou por você. Eu sei que você sentiu o que eu senti, porque seus olhos não conseguiram mentir. Você também ficou abalada e, por isso, fugiu de mim. E eu estava perplexo demais para ir atrás de você.
Por isso, eu estou tão surpreso ao receber uma carta sua – mas confesso que eu aguardava um gesto seu após esse encontro tão furtivo que tivemos.
Queria estar com raiva de você, por ter demorado tanto para entrar em contato comigo. Mas eu entendo. A vida foi nos levando por caminhos diferentes e você recebeu minha carta anos após eu tê-la escrito. A culpa não é nossa. O destino nos pregou uma peça e perdemos a nossa conexão tão boa.
Não posso mentir. Saber que você pensou em mim todos esses anos reacendeu uma fagulha de esperança que eu não me permitia há muito tempo. Saber que você também sentiu o que eu senti, quando nossos olhares se cruzaram, me desestruturou.
Minha querida, você me encanta de uma forma que eu não consigo descrever em palavras. Revê-la só serviu para me lembrar de o quanto eu a amo. Ainda mais que da primeira vez que nos vimos. É impressionante o magnetismo que você exerce sobre mim, ainda hoje, após tantos anos.
Contudo, eu me sinto culpado. Porque a vida foi passando e eu me envolvi com outro alguém. Como eu vou olhar a pessoa com quem estou após ler as suas doces palavras? Como posso dizer para ela, que eu gosto do seu sorriso, da cor do seu cabelo, que a lembrança do seu toque ainda me arrepia? Como eu vou dizer para ela que eu a vi e o meu coração se lembrou como é bater no compasso certo? Como eu explico que o seu cheiro me remete a lar? Porque foi assim que me senti, como se após tanto tempo, eu finalmente tivesse voltado para casa naqueles poucos segundos em que olhei os seus olhos e toquei as suas mãos.
Como eu vou dizer para ela que eu vi o amor da minha vida, que eu julgava perdido há tanto tempo? Eu venho guardando esse segredo por tempo demais e não aguento mais. Eu amo o seu jeito, como você tem essa aura que fascina quem te conhece. Eu adoro tudo em você. Que é tão vibrante, intensa, corajosa em ser quem é e não tem medo disso. Eu amo como você ainda parece a garota que conheci, em como seu rosto se ilumina quando fala dos seus livros favoritos. Mas a maturidade te fez ainda mais interessante do que já era. Eu ainda me perco nas suas sardas e nos sinais do seu pescoço. Eu sou fascinado em como os seus olhos castanhos me hipnotizam. Ainda me assusto como você pode ser tão presente se eu te conheci no meu passado. Estou cansado de guardar sua lembrança dentro de mim. Eu preciso contar tudo para ela. Como me sinto. Não se assuste, eu já não estava feliz há muito tempo e ela é incrível demais para ficar com alguém que sempre esteve incompleto para ela. A sua volta apenas me fez ver óbvio: que eu amo apenas você, Raposinha.
Eu tentei te arrancar de mim, durante todos esses anos, mas não consegui. Viver com tantas lembranças foi difícil. Sabe, depois que te conheci, ficou difícil de viver. Porque eu ficava imaginando uma vida inteira, um futuro com você, mesmo após a sua partida. Você veio e bagunçou toda a minha vida e me deixou aqui, tentando colocar as coisas no lugar. O problema é que nada se encaixa mais depois que te reencontrei.
Como eu vou contar para ela que todas as cartas que escrevi até hoje foram apenas para você – que eu tenho uma caixa cheia delas?
Eu sei que está assustada, sem saber o que pensar, como agir, o que sentir. Eu te conheço bem, melhor do que qualquer um vai te conhecer algum dia, e só queria te convencer que a gente combina. O que a gente tem é coisa rara de se achar, essa conexão, essa química, esse magnetismo. Você é minha e eu sou seu, para sempre e mais um dia. A nossa história não acabou. Talvez essa seja a segunda chance que eu tanto pedi para o universo. Aceita partir nessa jornada comigo novamente? Eu sei o que sinto. Eu te quero para a vida toda. Se você me der a mais ínfima esperança de que ainda me ama, eu mudo a minha vida por você. Eu juro! Eu deixo tudo e vou te encontrar. Só me dê a certeza que estará me esperando do outro lado da cidade.
Ainda seu como da primeira vez,
E. (o seu Ursinho).
P. S.: Você, em meio aos livros, com o seu cabelo ruivo e sorrindo folheando aquelas páginas, concentrada, no seu lugar favorito, será a minha memória favorita, daqui em diante.